FPA 15 anos: Uma pequena história com a palavra ruptura
Foi por designação direta de Perseu Abramo que me tornei editor da revista Teoria & Debate, isso quando ainda estávamos finalizando o projeto gráfico. Graças a ele, vivi uma das experiências profissionais mais marcantes da minha carreira. Mais que profissional, vivi uma aventura intelectual e política, com imenso aprendizado pessoal.
Foi por designação direta de Perseu Abramo que me tornei editor da revista Teoria & Debate, isso quando ainda estávamos finalizando o projeto gráfico. Graças a ele, vivi uma das experiências profissionais mais marcantes da minha carreira. Mais que profissional, vivi uma aventura intelectual e política, com imenso aprendizado pessoal.
Daquele primeiro núcleo, posso dizer que éramos sete: além de Perseu, lá estavam Rui Falcão, Éder Sader, Paulo de Tarso Venceslau, João Machado, Ricardo Azevedo e este que aqui escreve. Era um tempo de muita energia inconformista. A revista nasceu para pôr em discussão o que era incômodo. Logo no primeiro número, escolhi um poema de Ezra Pound para estampar a quarta capa. Naquela circunstância, o fato de Pound ter sido um fascista alucinado vinha a calhar.
Ajudava a dar o sinal que nos interessava: a nossa revista não seria ortodoxa, não seria oficialista, não seria chapa branca; iria combater a direita, mas também iria futucar as feridas da própria esquerda.
Aliás, o nome da revista não era para ser tão comportado. A proposta de nome que eu e alguns outros defendíamos era outra: Ruptura. Se o nosso projeto era um projeto de ruptura, o título deveria refletir essa vocação. E Ruptura nos dava ainda outra vantagem: ela nos permitiria fazer um logotipo “esperto”, realçando as letras “p” e “t” para formar a sigla do PT. Claro que a solução gráfica sairia um pouco deslumbrada, partidária em demasia, até mesmo brega, mas, ainda assim, o nome teria sido melhor. Teria sido…
Aí, alguém inventou de fazer uma votação para escolher o nome da nova revista. Que idéia infeliz. E que idéia invencível. Fazer o quê? Quem é que seria contra uma votação? Sem ter como contornar proposta tão “democrática”, fomos todos carregando uma urna para um encontro do partido. Claro: o nome Teoria & Debate derrotou o nome Ruptura.
Na minha interpretação, o nome pior saiu ganhando por motivos piores ainda. Em primeiro lugar, ele ganhou por familiaridade dos votantes com os padrões da tal imprensa burguesa. Teoria & Debate soava bem, aos ouvidos daquela maioria, porque lembrava o nome da seção de artigos da Folha de S. Paulo, “Tendências e Debates”. Depois, ganhou por simpatia: boa parte dos militantes daquele tempo lia a seção da Folha – e alguns até escreviam ali. Foi assim que Teoria & Debate virou Teoria & Debate. Foi assim que o nome Ruptura foi para a gaveta.
Eu já sabia: critérios editoriais nunca se deram muito bem com eleições diretas. Eu já sabia.
Apesar da derrota, não desisti daquele nome, Ruptura. Passei a abrigá-lo numa outra idéia, a de criar uma editora. Seria uma editora ligada à revista. Eu me lembro de uma noite, numa daquelas reuniões arrastadas, chatas, em que Patrícia Cornils inventou um slogan brincalhão: “Menos letra e mais figura: Editora Ruptura”. Maravilhoso. Evocava Lewis Carrol, que perguntava numa das aventuras de Alice: “De que serve um livro sem diálogos e nem figuras?” Realmente, de que serve? Eu me animava. Tínhamos que criar o quanto antes a Editora Ruptura.
Eu imaginava para ela três linhas de livros: as obras clássicas, que publicaríamos em edições feitas para durar; os de livros para escolas políticas, didáticos, que seriam usados em cursos de formação, e, por fim, os textos de intervenção, que seriam reportagens rápidas ou mesmo panfletos, tratando de temas de forte atualidade. Naquele início da vida da revista, porém, a gente não tinha bala para criar uma editora. Então, o projeto da editora também foi para a gaveta.
Poucos anos depois, nasceria a Fundação Perseu Abramo. Fernando Haddad estava trabalhando conosco na revista. Ele e eu recuperamos a idéia, que ganhou, graças e ele, não a mim, um formato viável, com racionalidade e sustentabilidade. Tanto que deu certo. Fundou-se, de verdade, uma editora. Outra vez, é claro, o nome Ruptura não vingou. Dessa vez, eu mesmo já tinha desistido dele. Ainda bem que não que não vingou. O nome tinha que ser outro. Era outro, era óbvio – e era muito, muito melhor: Editora da Fundação Perseu Abramo. Valia a pena torná-la realidade. Embora sempre soubéssemos: por melhor que fosse a nossa editora, ela nunca estaria à altura da homenagem que encerrava e ainda encerra.
Em nossos destinos, Perseu Abramo designou lances que ainda não sabemos contar.
Eugênio Bucci é jornalista e foi editor de Teoria e Debate.
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