O deputado federal denuncia o chefe do BC por insuficiência de desempenho e o acusa de impedir a retomada plena do crescimento. Daí a necessidade de tirá-lo imediatamente do comando da autoridade monetária. “Ele permanecerá como um problema para Lula até o final do ano que vem”, insiste o petista

Entrevista | Lindbergh Farias - “Campos Neto está sabotando o Brasil e o governo Lula”
Brasília – Senador Lindbergh Farias participa do programa Espaço Público (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

Alberto Cantalice

Na terceira semana de junho, o deputado federal Lindbergh Farias (PT-RJ), protocolou uma denúncia contra o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, no Conselho Monetário Nacional. Em entrevista à Focus Brasil, o deputado é enfático ao defender a queda de Campos Neto como um campo de batalha que congressistas da base governista devem encampar. Segundo Lindbergh, o presidente do BC deve ser afastado por insuficiência de desempenho, como determina a famigerada Lei da Autonomia do Banco Central.

Outro ponto importante levantado pelo petista é a violação da governabilidade do governo Lula. Para ele, a Lei da Autonomia, o projeto de lei complementar de 2021, impõe uma política econômica monetária de um presidente a outro, mesmo que tenham sido eleitos com programas diferentes.

“Lula assume a Presidência da República, mas em relação à política econômica, ele na verdade só tem a política fiscal e o orçamento. A política monetária e cambial está com o Banco Central. Poderia ter aprovado uma Lei de Autonomia que tivesse coincidência do mandato do Banco Central com o do presidente da República, seria menos grave”, aponta.

Segundo o deputado, não há margem para dúvidas quanto à instalação de uma política de sabotagem do governo Lula quando há um bolsonarista, flagrado em um grupo de WhatsApp, denominado “Ministros de Bolsonaro”, contrariando o próprio mercado ao não baixar a taxa de juros.

Lindbergh diz que o BC conseguiu a façanha de alinhar nomes como José Serra, Miriam Leitão e instituições como Fiesp em comunicados e críticas à política monetária do Banco Central. “Até a Miriam Leitão fez um artigo chamando o Campos Neto de negacionista”, destaca.

Para o parlamentar, o enfrentamento deve ser duro e o mérito deve ser levado ao plenário do Senado Federal, pois não há espaço para diálogo. “Se a gente acha que é possível conciliação com o Campos Neto, a gente vai continuar tendo problema até o final do próximo ano”, afirma.

Nesta entrevista, o deputado aborda ainda a CPI dos Ataques à Democracia, ocorridos em 8 de janeiro, apontando direcionamentos. E falou sobre a criação de um grupo com os senadores Renan Calheiros (MDB-AL) e André Janones (Avante-MG), uma espécie de Central da Democracia para colocar em debate o risco que o país correu com o golpismo, que tem como ponto central Jair Bolsonaro.

Lindbergh lembra que aliados do ex-presidente apontam que não há corrupção no processo de inelegibilidade, quando há uma sequência de crimes sendo investigados, sobretudo aqueles ligados ao tenente-coronel Mauro Cid, a quem chama de “o homem da mala” de Bolsonaro.

“Bolsonaro não vai ficar só inelegível. Acho que ele vai enfrentar problemas muito graves com a Justiça. Vai aparecer desvio de recursos, pagamento e conta de Michelle Bolsonaro… Aquele esquema de rachadinha que existia lá atrás, eles levaram para dentro do Palácio do Planalto”, denuncia. 

Tanto os entraves e a sabotagem na política econômica, com a conduta de Campos Neto como agente bolsonarista no governo Lula, quanto os atos golpistas devem ser encarados como ataques à democracia brasileira, analisa o deputado, que destaca e elenca os bons números do atual governo.

“Nós temos uma situação de percepção muito mais favorável do povo ao governo do presidente Lula. Então a gente está num momento bom na economia e eu acho que a gente tem que ter uma linha muito mais ofensiva contra o bolsonarismo”, opina. “Não estamos em situação de normalidade democrática. Estamos em processo de reconstrução da democracia brasileira”. A seguir, leia os principais trechos da entrevista.

Focus Brasil — Você está numa cruzada contra o garrote do Banco Central sobre a economia nacional. Qual a sua avaliação da administração do Campos Neto no Banco Central?

Lindbergh Farias — Entrei com a denúncia na última quinta-feira, 22, no Conselho Monetário Nacional. Depois, a senadora Ana Paula Lobato (PSB-MA), suplente do Flávio Dino, também entrou com outra denúncia ao CMN. Existe a possibilidade de afastamento do presidente na Lei da Autonomia do Banco Central. O Projeto de Lei Complementar 179, que alterou trechos da Lei  4.595 que ordena o sistema financeiro nacional, criou a autonomia do Banco Central. E diz o seguinte: pode haver o afastamento do presidente e de diretores por insuficiência de desempenho. É o caminho. Eles mostram o caminho de forma clara no artigo 5º da Lei Complementar que criou o nome do Banco Central. E você pode provocar o Conselho Monetário Nacional, que tem uma composição de três membros — do Ministério da Fazenda, do Ministério do Planejamento e o presidente do Banco Central e do Conselho Monetário Nacional — enviando ao Senado Federal. Se você tem uma maioria absoluta de 41 dos 81 votos, você afasta porque é desempenho insuficiente.

Estou convencido de que essa atual gestão do Banco Central errou no começo, quando colocou a taxa de juro lá embaixo, 2 pontos percentuais, muito baixa, que vários economistas de posições diferentes dizem que, naquele momento, foi um estímulo ao aumento da inflação. E, agora, também está errando pelo outro lado, mantendo o Brasil com a maior taxa de juros do mundo, 13,75, taxa real de mais de 8%. O segundo colocado no mundo é o México, com 4%. Estados Unidos e Europa… estamos falando de juros negativos.

— O caminho então está na lei de autonomia.

— Veja, neste momento, a diretoria está desconsiderando o que está escrito na Lei da Autonomia do Banco Central, porque o Banco Central tem como meta o controle da inflação, mas tem também crescimento econômico e geração de empregos. E, na verdade, nós temos uma taxa de juros completamente descompensada em relação à inflação. Vale dizer que a inflação chegou a 10% com o Bolsonaro. Então, tem uma taxa de juros dessa com a inflação a 10%, vá lá. Mas a inflação despencou. Hoje saíram números também sobre o IPCA de junho. Estava 3,94 no acumulado de 12 meses, a inflação. Muito baixa! Caiu sabe para quanto? Para 3,4%. Então, como justificar uma taxa de juros de 13,75% quando a gente tem uma inflação no acumulado nos 12 meses de 3,4%? As pessoas estão falando isso das ruas, o botijão de gás, que chegou R$ 120 aqui no Rio, agora esta R$ 80. A gasolina, que chegou a R$ 8, está entre R$ 5,20 e R$ 5,40. O diesel, que chegou a R$ 7, está R$ 5,16. Tudo está caindo. O óleo de cozinha, que era R$13, está R$4. Até carne, alimentação. Então é injustificável. Estou convencido que nós temos que enfrentar esse problema, porque se a gente acha que é possível conciliação com o Campos Neto, a gente vai continuar tendo problema até o final do próximo ano. Vai ser uma luta, em algum momento ele vai começar a baixar a taxa de juros, mas vai baixar 0,25%. Então, mesmo a previsão do mercado de chegar 12,25% no final do ano, mesmo assim, é uma taxa muito alta com uma inflação que, volto a dizer, está a 3,4%. Eu acho que a gente tem que enfrentar esse tema no Senado Federal.

— A linha monetária implementada pelo Banco Central confronta a linha que ganhou nas urnas em 2022. Tal teimosia do atual BC pode parecer um boicote à política econômica do governo Lula?

— Não tenho dúvida de dizer claramente que parece uma política de sabotagem, ao Brasil e ao governo do presidente Lula. Veja bem, Lula foi eleito presidente com a votação extraordinária e ele falava em quê? Crescimento, geração de empregos, distribuição de renda. Só que, com essa lei da autonomia, o que aconteceu? Ele assume a Presidência da República, mas em relação à política econômica, na verdade só tem a política fiscal sob controle dele e o orçamento. A política monetária e cambial está com o Banco Central. E o que é mais grave, essa lei de autonomia aprovada no Congresso poderia prever a coincidência do mandato do Banco Central com o do presidente da República. Isso seria menos grave. Então Lula eleito, nomearia o presidente do Banco Central e não poderia demiti-lo. Mas eles fizeram uma lei em que o presidente do BC indicado pelo Bolsonaro tem um mandato de dois anos no governo Bolsonaro e dois no governo Lula. Então você veja como isso é uma coisa absurda. Lula é eleito presidente com um programa e controla parte da política econômica, mas a outra parte dela é controlada por um bolsonarista, que até fevereiro foi flagrado numa conversa de WhatsApp num grupo intitulado “Ministros de Bolsonaro”.

— Um flagrante grave!

— Tinha que ter tem uma posição mais radical que a do mercado. O mercado já tinha precificado baixar a taxa de juros em agosto, depois da reunião do Copom. Foi um comunicado que praticamente sinalizava que não ia baixar a taxa de juros em agosto, que teve o efeito de influenciar expectativas do próprio mercado. Isso é um outro debate. A forma como o Banco Central decide e toma a decisão, eu acho, sinceramente, uma loucura. Porque, veja bem, o BC toma decisão em cima das expectativas do mercado, das instituições financeiras e, nesse caso, o comunicado do Copom, a posição do Banco Central, foi dizer “Olha, mercado, vocês estão dizendo que a busca, olha, talvez seja um pouco mais a frente”. Várias instituições financeiras corrigiram projeções falando que o início do ciclo de queda, em vez de ser agosto, seria setembro. Tanto é que saiu a ata do Copom e teve uma pressão muito grande da sociedade.

— Mas o PT vem denunciando isso desde o início.

— No começo, quem começou esse enfrentamento, nesse debate, foram o presidente Lula e a Gleisi [Hoffman, deputada pelo Paraná e presidenta nacional do PT]. Mas agora é a sociedade. A CNI [Confederação Nacional da Indústria] é uma instituição conservadora, mas fez uma nota. A Fiesp, dois dias antes, tinha feito também uma nota muito dura, que inclusive não saiu em nenhum órgão da imprensa tradicional, o que mostra como esse existe uma blindagem sobre esse tema. A [empresária] Luiza Trajano fez um desabafo na frente do Roberto Campos Neto, num encontro de varejistas. As empresas estão quebrando. Então houve uma reação muito grande a esse comunicado do Banco Central e agora saiu uma ata do Copom tentando dizer que existe uma ala majoritária no Banco Central indicando que pode haver queda da taxa de juro. Mas também volto a dizer, eles sinalizam a possibilidade de uma queda muito reduzida de 0,25 ponto percentual. E, por isso, reitero a minha denúncia: Campos Neto é um problema até o final do mandato dele.

— A tensão permanecerá.

— Vai ter sempre esse tensionamento. Eu acho, concretamente, que tem ali uma política de sabotagem. Quando eu converso com essa turma de bolsonaristas na Câmara dos Deputados, o caminho deles é Lula perder popularidade e travar a economia. Eles querem puxar o freio de mão da economia, porque os empresários que pegam empréstimo com 2%, a taxa Selic era 2%, estão quebrando agora. Então vai ser um problema muito concreto e a gente vai ter que enfrentar, porque para mim o Campos Neto faz uma política de sabotagem.

— Há alguns dias houve uma reunião entre você, o senador Renan Calheiros [MDB-AL] e o deputado Janones [Avante-MG]. Foi para tratar do 8 de janeiro?

— Olha, na verdade, para mim está muito claro que ali foi uma tentativa de golpe. O Bolsonaro sim, foi o defensor do golpe. Desde lá atrás, naquele período que antecedeu as eleições, ele tentou atacar o sistema eleitoral para achar alguma justificativa para não reconhecer o resultado das eleições. A gente viu tudo que eles fizeram, aquelas ocupações de avenidas, de pistas, de estradas. Foi um processo crescente. Depois, no dia da diplomação do Lula, aquele quebra-quebra em Brasília, na frente da Polícia Federal. Depois, o George Washington, aquela tentativa de bomba no aeroporto de Brasília.

— Uma sequência…

— Foi um processo e Bolsonaro esteve à frente. Eu estou convencido que aquele telefone do tenente-coronel Mauro Cid, que o ministro Alexandre de Moraes já quebrou o sigilo, vai trazer toda a corrupção do governo Bolsonaro. Cid se tornou uma espécie de homem da mala do Bolsonaro, então, Bolsonaro não vai ficar só inelegível. Acho que ele vai enfrentar problemas muito graves com a Justiça. Vai aparecer desvio de recursos, pagamento e conta de Michelle Bolsonaro… Aquele esquema de rachadinha que existia lá atrás, eles levaram para dentro do Palácio do Planalto. Vai aparecer Bolsonaro como autor intelectual daquela tentativa de golpe de 8 de janeiro. O [deputado] Rogério Correa [PT-MG], disse: “Lindbergh, para o Bolsonaro intelectual não é uma boa palavra. Ele é o mandante”. Talvez seja isso, mandante. Isso vai aparecer. Já há notícias de que na quebra de sigilo do o Cid vão aparecer esses fatos que vão ligar diretamente o Bolsonaro ao 8 de janeiro. É o que escutei em Brasília, notícias que estão circulando de que isso vai aparecer nos próximos 15 dias. Temos que esperar. Eu, o Renan e o Janones, a gente está tentando mudar o foco. O foco é falar sobre a central da democracia. Eu acho que na CPI talvez tenha havido alguns erros na condução da atuação política. Não tenho nada pessoalmente contra o deputado Arthur Maia, inclusive me dou muito bem com ele. Mas tínhamos uma maioria clara ali, de 18 a 20 votos do governo. Quando eles montaram a CPI do MST, a gente tinha maioria, mas nomearam presidente e relator. Não sei por qual motivo não nomeamos gente do nosso lado, que pudesse impor uma narrativa. A CPI está perdendo um pouco de importância e está secundarizada, porque não tem direção muito clara. O presidente fica o tempo inteiro tentando contemporizar. Claramente, faz manobras para ajudar a turma do Bolsonaro. Tem uma posição diferente da relatora, então acaba sendo uma CPI que não está com foco tão firme. Quando há um presidente que vai impondo uma direção, era uma oportunidade de colocar essa turma verdadeiramente na defensiva, porque eles fizeram o 8 de janeiro. A gente tem que ir atrás dos financiadores. A gente tem que impor uma linha mais ofensiva. Ao não fazer isso, a CPI está perdendo um pouco importância ali no Congresso, de forma que a gente decidiu mudar o foco. Eu, Renan e Janones, estamos fazendo uma espécie de Central da Democracia, onde a gente vai falar sobre tudo.

— Por exemplo?

— Tem uma discussão da inelegibilidade do Bolsonaro. Não é só a questão dos embaixadores, é muito mais. É o conjunto da obra dessa tentativa de golpe. Mas eu acho que a gente tem que politizar. Não é só isso. Os bolsonaristas dizem que não tem corrupção. Tem muita corrupção. Tem um tenente coronel Mauro Cid, tem que botar essa rachadinha, pagamento das contas da Michelle Bolsonaro, a questão das joias. Cid é uma dessas grandes figuras, é o fio desencapado do Bolsonaro, porque era um faz-tudo. A gente tem que ter uma linha muito ofensiva nesses próximos dias em cima do Bolsonaro. Na Câmara, no começo, eles estavam todos saltitantes. Hoje, claramente, no plenário da Câmara, há quase uma situação de depressão. Estão na defensiva. A gente tem que aproveitar, até porque estamos num momento bom. Você sabe que tem um índice que é chamado de índice de miséria, que os economistas trabalham, que soma desemprego e inflação. Em junho, teremos o menor índice de miséria nos últimos 16 anos, porque estamos com inflação de 3,4% e desemprego de 8,1%. Estamos voltando ao patamar de janeiro de 2007. Quando temos esses números — inflação caindo e desemprego baixo — há uma situação de percepção muito mais favorável do povo ao governo do presidente Lula. Então a gente está num momento bom na economia e eu acho que a gente tem que ter uma linha muito mais ofensiva contra o bolsonarismo.

— Na última semana, lançaram uma pesquisa [Genial/Quaest] que diz que 74% dos brasileiros são a favor do presidencialismo. Só 12% são a favor do parlamentarismo. Esse golpe tem espaço para crescer no Congresso Nacional?

— A história do Brasil é uma história de golpes. E é a história da América Latina. Toda vez que um governo popular assume, um governo progressista, eles tentam de alguma forma… Foi assim com o Getúlio [Vargas]. Quando cometeu suicídio em 1954, foi uma resposta a um golpe dado no momento que o Getúlio criou a Petrobrás, dobrou o salário-mínimo e criou a Eletrobrás. E depois tivemos a ditadura militar. Vivenciamos o golpe agora há pouco, com o afastamento da Dilma e a prisão do Lula. Então, eles vão sempre tentar amarrar. O Darcy [Ribeiro] sempre falou que o Brasil tem uma elite com cabeça escravocrata, antidemocrática e inculta. E eu concordo. Mas, na verdade, além disso, eles têm um roteiro, que é atrapalhar a economia, impedir que a economia cresça, porque isso tira popularidade. Por isso que o Roberto Campos Neto está fazendo o papel do último refúgio do bolsonarismo, como diz o jornalista Reinaldo Azevedo.

Por isso é que esse enfrentamento contra Roberto Campos Neto é tão importante. Primeiro, eles vão tentar de alguma forma atrapalhar economia, porque tira popularidade. Se eles tivessem chance de tentar dar um novo golpe, a versão não seria algo como o impeachment. Não tenho dúvida de afirmar que seria pelo semi-presidencialismo, que é dar poderes a uma parte do Congresso que tenta se colocar como fiadora dos interesses do mercado, também para os ruralistas. O roteiro é bem estabelecido, então a gente já sabe. Agora é fazer a economia crescer. Eu acho que está bom, os números melhoraram muito. Eu acho que [Fernando] Haddad tem feito um bom trabalho. Até discordei da calibragem ali nos cortes de investimentos no próximo ano, mas o fato é que a economia vai bem. E o Lula tem essa capacidade agregadora. Tem um outro aspecto importante, que são essas viagens do Lula pelo mundo para trazer investimentos ao Brasil. Isso também é importante. Dinheiro de fora, investimentos. Tudo isso é fundamental. Mas diria que o semi-presidencialismo é aquilo que a gente tem que ficar de olho em cima para combater, porque é um mecanismo extremamente antidemocrático. O povo por percebe que o que estão querendo tirar é a força do voto popular e a autonomia do Banco Central também é isso.

— Os juros altos atrapalham.

— Eu queria chamar a atenção para uma coisa. Nos últimos 12 meses, o custo fiscal da taxa de juros é de R$ 720 bilhões. Nos últimos 12 meses. O [Geraldo] Alckmin deu uma declaração muito feliz. Ele disse: “falam do ajuste fiscal e a gente fica apertando R$ 1 bilhão aqui, não sei quantos milhões ali e de uma hora pra outra, quando baixar a taxa de juros, isso terá impacto de R$200 bilhões”. E eu fico impressionado com a blindagem política. Na verdade, isso é uma transferência do dinheiro do orçamento da União para uma elite financeira — para bilionários, multimilionários — que aplicam em títulos da dívida pública. Não tenha dúvidas que se você pegar donos de grupos de comunicação, é onde está o dinheiro deles. Está ai, onde ganha mais de 8% ao ano sem ter que investir. O cara que abre uma padaria, um restaurante, aquele cara do setor médio, eles não conhecem esse mecanismo, porque quando se abre um restaurante, uma padaria, há risco de falir. Vivemos a transferência de renda para as elites deste país e eles disputam, têm coragem de disputar, o orçamento com os pobres. Quando Lula foi fazer a PEC da Transição, R$ 170 bilhões, apontaram que estavam gastando muito, para o risco fiscal, não pode aumentar o Bolsa Família… É uma cara de pau dessa elite brasileira, de investidores brasileiros no exterior, que na verdade estão pensando só em preservar o deles.

— Os outros governos Lula sempre enfrentaram campanha semelhantes de sabotagem, de popularidade, de governabilidade por parte da imprensa corporativa brasileira. Qual a sua avaliação, até aqui, como você acha que os esforços do governo Lula tem sido comunicados e  como vem enfrentando essa sabotagem? — Olha, veja bem, na parte da democracia, desse conflito democrático, parte dessa imprensa brasileira teve uma postura boa neste começo de governo, até pelo que aconteceu com a tentativa de golpe de 8 de janeiro…  Às vezes acompanho a GloboNews e a gente vê opiniões muito ponderadas na defesa da democracia. Claro que quando entra no debate econômico, a questão de juros, aí eles se alinham ao outro lado. Se bem que o Campos Neto, ultimamente, passou tanto dos limites que até Miriam Leitão fez um artigo chamando o Campos Neto de negacionista.

— Ele foi tão além que até quem se alinha aponta o absurdo…

— É isso. Ou seja, não é uma bandeira da esquerda, é uma bandeira que fala muito com o povo, com setores de classe média. E eu chamo a atenção a esse aspecto, porque tem questões muito sensíveis. Por exemplo, juros de cartão de crédito mais de 400%? Isso é um escândalo, é um assalto à mão armada. Então eu vejo um pouco o papel da imprensa, neste momento, até pelo risco que houve… Não estamos em situação de normalidade democrática. Estamos em processo de reconstrução da democracia. Deram um golpe contra a Dilma, prenderam o Lula. Aí Lula foi eleito, o bolsonarismo veio e tentou dar um golpe em 8 de janeiro. Ainda bem que a gente tem alguém com a capacidade do presidente Lula que não caiu naquela tese que de que tinha que decretar a GLO [Garantia da Lei e da Ordem]. Ele disse não. Chamou pra si a responsabilidade, acionou a Secretaria de Segurança Pública de Brasília e não chamou os militares. É um aspecto pouco destacado, mas ali teve uma decisão própria do presidente Lula, com a sua experiência, que não embarcou naquilo que eles queriam provocar, né? O papel estava ali, pronto pra ser assinado. Mas Lula disse não. •