Nos Estados Unidos, o canal de TV Fox News, de Rupert Murdoch, vira alvo na Justiça por disseminar desinformação em benefício de Donald Trump

CONVENIÊNCIA Os empresários Rupert Murdoch e Donald Trump se aproximaram quando o último já estava na Casa Branca. Amizade saiu cara

A Fox News talvez tenha sido a primeira das grandes emissoras de TV a assumir a função de porta-voz das ideias dessa extrema-direita internacional presente nos EUA, Europa, América Latina e em algumas outras regiões. Até a eleição de Donald Trump, a emissora ainda tinha algumas diferenças com o empresário estadunidense, outsider na política, dono de um discurso desequilibrado, tratado por quase toda a imprensa como um aberração, mas eleito em 2016.

Trump chegou a criticar a Fox News naquele período. Porém, após sua inesperada eleição para a Presidência dos EUA, a emissora adotou uma postura pró-Trump e passou a endossar as atitudes do então presidente. O posicionamento tinha como alvo o eleitorado conservador do político republicano, ou seja, potenciais assinantes do canal de TV. Esse interesse meramente comercial só está se tornando evidente agora, quando a empresa Dominion Voting Systems, que produz urnas eletrônicas nos EUA, decidiu mover um processo contra a Fox News por difamação.

Após o anúncio da vitória de Joe Biden em 2020, Trump realizou uma série de tentativas para anular o processo eleitoral no qual saiu derrotado. Como nos EUA a eleição é descentralizada e cada estado tem seu próprio rito, o então presidente tentou criar teorias conspiratórias em cada localidade, movimento que sempre estava acompanhado de ações judiciais.

Grande parte dos eleitores do ex-presidente compraram imediatamente as alegações dele sobre as fraudes nas eleições presidenciais que deram vitória a Biden, e o questionamento ganhou o status de movimento. Entre as ações, está a falsa alegação de que a cúpula do Partido Democrata se aliou a empresa Dominion para fraudar as urnas eletrônicas utilizadas no estado do Arizona.

Os âncoras de programas da Fox News veiculados no horário nobre passaram a apoiar a narrativa criada por Trump. Levantamento feito pela imprensa estadunidense mostra que uma das advogadas do ex-presidente participou desses programas mais de uma dúzia de vezes, sempre defendendo os argumentos de Trump.

No entanto, o simples fato de a emissora dar espaço para essas ideias e de seus apresentadores darem credibilidade a tais acusações não configuraria qualquer crime, já que a legislação dos EUA oferece grande proteção aos jornalistas e à liberdade de expressão, de tal maneira que é aceitável que jornalistas cometam erros que causem prejuízos a pessoas citadas em reportagens.

Apesar da proteção legal, a Fox News passou a ter um enorme problema. A empresa que fabrica as urnas eletrônicas teve acesso a mensagens trocadas pelos âncoras dos programas do horário nobre com outros integrantes da equipe, além de mensagens do próprio dono do grande conglomerado de comunicação, Rupert Murdoch.

Essas conversas sugerem que os profissionais da imprensa discordavam completamente das alegações de Trump e seus advogados. E mais. Eles tinham certeza de que as alegações sobre as urnas eletrônicas eram falsas.

A Dominion Voting Systems alega que a emissora disseminou desinformação de forma consciente. A ação pede que a Fox News seja obrigada a pagar uma indenização no valor de US$ 1,6 bilhão — R$ 8,2 bilhões — à fabricante das urnas. A troca de mensagens evidencia ainda que o apoio às teorias de Trump teria ocorrido porque a emissora tinha receio de perder a audiência dos apoiadores do ex-presidente. O próprio Murdoch admitiu. •

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