Em sua primeira viagem internacional depois da posse, Lula vai à Argentina e Uruguai restabelecer laços diplomáticos, comerciais e culturais. E reafirma seu compromisso com o desenvolvimento social e econômico da América Latina

EMOÇÃO NA CASA ROSADA O presidente encontrou-se com as Madres de La Plaza de Mayo, organização que lutou contra a ditadura argentina e denunciou o desaparecimento de milhares de militantes políticos nos anos 70

A primeira viagem internacional de Lula como presidente foi, como ele mesmo afirmou, um retomar de laços — de todos os tipos. Os encontros na Argentina e no Uruguai, os dois destinos de Lula na América do Sul, ao longo da última semana, significaram a retomada oficial das relações internacionais e comerciais do Brasil, mas também um reencontro com as lutas democráticas e históricas dos três países.

Nessa primeira agenda internacional, Lula começa a fazer as pazes do Brasil com o mundo. Por onde passou, foi recebido por multidões e agradecimento. Ele fez questão de salientar, contudo, que é o Brasil quem abre as portas para o mundo. O caminho está aberto. Nesta semana, ele deve receber a visita do primeiro-ministro alemão, Olaf Scholz, para discutir reaproximação política com o país.

Em Buenos Aires, Lula e Janja foram recebidos na Casa Rosada pelo presidente Alberto Fernández e a primeira-dama Fabiola Yáñez. Ele pediu desculpas aos argentinos pelo que chamou de “grosserias de Bolsonaro” nos últimos quatro anos. “Estou aqui para dizer que hoje é a retomada de uma relação que nunca deveria ter sido truncada”, afirmou. Na segunda, 23, Lula defendeu a retomada das relações com o país vizinho e a necessidade de “construir parceiros, não inimigos”, indicando a importância das parcerias entre as duas nações.

Segundo Fernández, além das relações bilaterais, Brasil e Argentina compartilham a mesma posição em relação à importância de organismos de como o Mercosul, a União de Nações Sul-Americanas (Unasul) e a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac). A “integração deve ser implementada em todos os conceitos”, disse o argentino, inclusive os vínculos culturais.

A  7ª Cúpula da Celac na Argentina, que começou no dia 24, foi um dos pontos altos da agenda de Lula na semana. Em seu discurso, o líder brasileiro reafirmou o retorno do Brasil ao cenário internacional e disse que era natural que esse recomeço viesse pela retomada da cúpula. “É com muita alegria e satisfação muito especiais que o Brasil está de volta à região e pronto para trabalhar lado a lado com todos vocês, com um sentido muito forte de solidariedade e proximidade”, disse.

Lula também chamou atenção para que os países da América Latina liderem os projetos de preservação da Amazônia, sem dispensar a ajuda global. “A cooperação que vem de fora da nossa região é muito bem-vinda, mas são os países que fazem parte desses biomas que devem liderar, de maneira soberana, as iniciativas para cuidar da Amazônia”, defendeu. “Por isso, é crítico que valorizemos a nossa Organização do Tratado de Cooperação Amazônica – a OTCA”.

O documento final do encontro aborda uma visão compartilhada entre os países do grupo em diversas áreas, com destaque para recuperação econômica pós-pandemia, segurança alimentar e energética, estratégia em saúde, cooperação em meio ambiente, ciência e tecnologia, transformação digital, infraestrutura, entre outros pontos. As nações aprovaram uma Cúpula Celac-União Europeia em 2023 e outra do Foro Celac-China em 2024.

Após o encontro, Lula esteve com chefes de Estado e de governo, como a primeira-ministra de Barbados, Mia Mottley, o presidente de Cuba, Miguel Díaz-Canel, e o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel. Ele ainda se reuniu com o diretor-geral da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), Qu Dongyu. para falar sobre o combater à fome no mundo.

Ainda na Argentina, um dos encontros mais emocionantes foi com as mães e avós da Praça de Maio, que ainda buscam filhos e netos de parentes desaparecidos e mortos durante a ditadura argentina.  As cabeças sempre cobertas por lenços das mulheres e o cabelo branco de Lula se unindo num abraço simbolizam a luta pela democracia: “As Mães e Avós da Praça de Maio são uma inspiração na defesa da democracia na América Latina. Emocionado com o nosso encontro”, disse.

Em Montevidéu, a primeira agenda foi com o presidente Lacalle Pou, com quem também discutiu o fortalecimento do Mercosul e defendeu um acordo do bloco com a China. Segundo o presidente, é possível discutir um acordo de livre comércio China-Mercosul, mas antes é preciso destravar a ratificação entre o bloco e a União Europeia, aprovado em 2019 após mais de 20 anos de negociações.

Lula elogiou a iniciativa do uruguaio de “modernizar” o Mercosul. “Vamos criar uma equipe técnica entre Uruguai e Brasil e outros países interessados para avaliar o que queremos e precisamos no nosso relacionamento com a China”, comentou. Ainda em Montevidéu, participou de uma cerimônia na prefeitura, onde recebeu a medalha Mais Verde, em reconhecimento aos seus esforços em defesa do meio ambiente. O presidente recebeu o prêmio das mãos da prefeita Carolina Cosse.

Antes de retornar ao Brasil, Lula foi ao encontro do ex-presidente José Mujica e a ex-senadora Lucia Topolansky, em sua chácara nos arredores da capital uruguaia. Além de Janja, participou do encontro Fernando Haddad. •

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