Sob Bolsonaro, o Brasil perdeu prestígio na comunidade internacional. De interlocutor influente e respeitado, como nos tempos do PT, passou a ser visto como um vilão ambiental

 

O Brasil participa da Cop26 na condição de um dos cinco países que mais agravaram o aquecimento global desde o Acordo de Paris. Em 2020, durante a pandemia, enquanto o planeta registrou queda de 6,7% nas emissões, nosso país aumentou em 9,5% a emissões, o maior incremento desde 2006, segundo o Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima. A maior parte das emissões brasileiras está ligada ao desmatamento para pastagens e culturas agrícolas.

Além disso, o Brasil perdeu a condição de referência na proteção ambiental global, construída ao longo dos últimos 40 anos. Com Bolsonaro, o mundo viu um país que liderou a Rio-92 e que vinha reduzindo de forma consistente o desmatamento — só na Amazônia essa redução foi de 83% entre 2004 e 2012, nos governos Lula e Dilma — se transformar em um pária mundial do meio ambiente.

Bolsonaro promoveu um verdadeiro desmonte nas estruturas de proteção ao meio ambiente no Brasil. Nos três primeiros anos de seu governo, o Palácio do Planalto cortou em 93% os gastos para estudos e projetos de mitigação e adaptação às mudanças climáticas, quando comparado com os três anos anteriores.

Para ficar em alguns exemplos, Bolsonaro transferiu a demarcação de terras indígenas e quilombolas para o Ministério da Agricultura, acabou com o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal e extinguiu o Fundo Amazônia. O resultado é que, em 2020, o desmatamento na Amazônia atingiu 10.851 km2, a maior taxa em 12 anos.

No Acordo de Paris, o país se comprometeu a reduzir em 43% as emissões de gases estufa até 2030. Mas, em dezembro do ano passado, o governo Bolsonaro mudou a base de cálculo das metas brasileiras, o que, na prática, significou permissão para poluir mais. A descrença quanto à atuação do governo brasileiro está presente em toda a cobertura do evento na mídia internacional. Do New York Times ao Le Monde, passando por outros órgãos da imprensa internacional influentes, ninguém acredita no governo Bolsonaro.

“Não confie nas promessas do Brasil”, estampou o britânico The Guardian. “O Brasil, que já foi campeão do ambientalismo, encara um novo papel como antagonista do clima”, resumiu o Washington Post. “O país se comprometeu a acabar com o desmatamento na próxima década, mas os cientistas temem que as metas serão difíceis de cumprir, a menos que sua política mude”, observa.

Nesse ambiente de falta de credibilidade, o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, anunciou durante a Cop26, uma nova meta climática brasileira de redução de 50% da emissão de gases poluentes até 2030 e a neutralização da emissão de carbono até 2050. Apesar disso, o ministro não apontou qual a base para o corte, o que na prática significa uma estagnação.

Se a redução das emissões prometidas pelo ministro do Meio Ambiente seguir a base da atualização anterior, aquela alterada pelo próprio Planalto em dezembro de 2020, o país emitirá mais gases do que o acordado em Paris. Se o Brasil seguir a base mais atualizada disponível, a redução de emissões ficaria igual à prometida em 2015. Nos dois casos, o Brasil não aumenta sua ambição climática na nova meta, a chamada NDC.

Em nota, o Instituto Talanoa mostrou descontentamento com a meta brasileira. “A proposta submetida à ONU pelo Brasil ainda pode aumentar o espaço de emissões até o fim desta década, em relação à meta proposta pelo governo em 2015, por ocasião do Acordo de Paris. Mais do que isso, a proposta anunciada provavelmente não aumenta a ambição climática do Brasil, conforme esperado”.

O senador Jaques Wagner (PT-BA), presidente da Comissão de Meio Ambiente do Senado, presente à reunião da Cop26, afirmou que prefere ter cautela com a meta anunciada. “Não podemos negar que os compromissos são um passo”, afirma Wagner. “Mas prefiro ter cautela, até que esta mudança se converta em ações concretas, para além de promessas. Com mais dinheiro, com mais investimentos para avançarmos no enfrentamento da crise climática”.

Para o parlamentar petista, governo brasileiro precisa sinalizar com algo mais do que promessas. “O tempo de promessas já passou. E passou não só para o Brasil, mas para todo o mundo. O tempo agora é de ação. Precisamos urgentemente de respostas efetivas à crise climática e de esperança para as atuais e futuras gerações”, avalia.

Mas, o constrangimento brasileiro não parou por aí. O coordenador-executivo do Fórum Brasileiro de Mudança do Clima, Oswaldo dos Santos Lucon, pediu demissão do cargo durante a Conferência da ONU.  Ele disse que estava saindo por causa da falta de interlocução do governo com os representantes da sociedade civil.

A função do fórum é subsidiar ações do presidente da República e fazer a ponte entre o governo e a sociedade civil. O colegiado é um dos “instrumentos institucionais” para a Política Nacional de Mudança do Clima. A 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas segue até 12 de novembro. Infelizmente, ainda há muito tempo para novos vexames do Brasil.

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