O Brasil estará de corpo presente na Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática de 2021, que começa neste domingo, 31 de outubro, representado pelo ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite. Nem o presidente Jair Bolsonaro nem o vice-presidente, General Hamilton Mourão, que preside o Conselho Nacional da Amazônia Legal e estava designado para chefiar a comitiva, participarão do mais importante encontro sobre meio ambiente do planeta.

A delegação, encabeçada por Leite, o ruralista que substituiu Ricardo Salles, vai para Glasgow passar o chapéu e fazer aquele esforço patético para reverter a péssima imagem do Brasil destruidor do meio ambiente no exterior. É que o país não tem dado bons exemplos. Desde o início deste governo, protagonizou escândalos: queimadas que alarmaram o mundo, onças de patas queimadas e, pior, o envolvimento direto de autoridades do governo em negócios escusos com traficantes de madeira.

Não à toa, o ministro das Comunicações, Fábio Faria, a face institucional e limpinha da máquina de propaganda de guerra cultural do governo Bolsonaro, especialista em edulcorar as mentiras e criar versões alternativas para os malfeitos de Jair Bolsonaro, estará na comitiva. É preciso gastar muita saliva para tentar convencer gente séria que o país que olha apalermado quando alguns dos biomas mais importantes da Terra estão virando deserto está, de verdade, empenhado na preservação e no desenvolvimento sustentável. É uma tarefa dura paraum governo de néscios.

Leite afirmou na última semana que levará “o Brasil real para a COP do Clima”. Parece querer enganhar a si mesmo. Fala sobre “um Brasil empreendedor, um Brasil, como o próprio ministro [da Economia] Paulo Guedes comentou, que realmente faz uma atividade verde.” Leite fazia referência ao  Programa Nacional de Crescimento Verde, lançado às pressas na segunda-feira, 25, por iniciativa dos ministérios do Meio Ambiente e da Economia. É uma tentativa de mostrar serviço na área da preservação ambiental. “O lançamento é para deixar claro como o Brasil tem R$ 400 bilhões na direção verde. Investimentos e financiamentos que são bastante robustos”, promete. Não soube especificar, entretanto, como o dinheiro será utilizados em projetos de energia renovável, agricultura de baixo carbono, ecoturismo e restauração florestal.

Esquiva às críticas da comunidade internacional, a inexistente política ambiental da gestão de Jair Bolsonaro é tão negacionista e criminosa quanto sua atitude em relação à pandemia. O ex-ministro Ricardo Salles desmantelou órgãos fiscalizadores — como Ibama e ICMBio —, afrouxou marcos regulatórios, deixou o desmatamento correr solto e, diante dos incêndios na Amazônia e no Pantanal, que causaram danos ambientais dramáticos, limitou-se a culpar índios, agricultores pobres ou as agruras próprias do clima.

Para Bolsonaro, Amazônia, Pantanal e Cerrado só servem para virar pasto ou área de mineração. Em mais de uma ocasião, o presidente brasileiro mostrou seu desprezo absoluto pelos povos originários. Daí que, nos planos do governo, os biomas brasileiros têm dois destinos possíveis: a exploração econômica ou a transformação em resorts para desfrute dos ricos, com caça e pesca predatórias fazendo parte do pacote.

O General Hamilton Mourão, que por vezes faz o papel do porta-voz da sensatez, justificou a ausência do presidente na COP 26. “Ele vai chegar num lugar e todo mundo vai jogar pedra nele. (…) Existe a questão política. O nosso governo é de direita, e a maioria das pessoas que têm realmente uma consciência ambiental maior é de esquerda”, disse. “Então, há crítica política embutida nisso aí. Tem a questão econômica. Sempre uma busca de uma barreira em relação à pujança do nosso agronegócio, querendo dizer que ele provém de área desmatada da Amazônia, o que não é uma realidade. E, óbvio, a questão ambiental embutida”. Resta saber o que está mais está “embutido” na questão ambiental para Mourão: seria a “indolência dos índios”? 

Além de levar pedras em lugar de Bolsonaro, o que a delegação brasileira realmente pretende na COP 26 é arrancar dinheiro dos países ricos. Essa posição foi defendida por Salles na COP 25,  com a justificativa de que seria necessário um fundo bilionário para preservar a floresta Amazônica. 

Na conferência de 2019, o Brasil foi um dos responsáveis por bloquear as negociações climáticas. Naquele ano, Salles tinha paralisado o Fundo Amazônia, que dava dinheiro para projetos de conservação da floresta sob a alegação de que haveria irregularidades em contratos do fundo, auditado anualmente por órgão internacionais. Um decreto de Bolsonaro extingiu os comitês gestores do fundo, que é abastecido pela Noruega e Alemanha.

A diferença agora é que, em 2019, apesar da catástrofe anunciada, o governo Bolsonaro ainda não tinha se dado a conhecer em toda a sua perversidade. Ainda que o Brasil seja objeto de preocupação mundial com relação a temas como a preservação do meio ambiente, a defesa da cultura e da sobrevivência, mesmo dos povos originários, e das possibilidades efetivas de promover  desenvolvimento sustentável antes mesmo da eleição de Jair Bolsonaro, a condução do presidente e seus ministros na pandemia jogou o governo brasileiro num outro patamar de pária internacional. 

No ranking dos países que mais agravaram o aquecimento global em 2020, o Brasil aparece em quinto lugar, atrás apenas de China, Estados Unidos, Rússia e Índia. A maior parte das emissões brasileiras vem do desmatamento ligado a pastagens e culturas agrícolas. Apenas no ano passado, em plena pandemia, enquanto o mundo registrava uma queda de 6,7% nas emissões, o Brasil seguia na contramão: um aumento de 9,5%, o maior desde 2006.

A credibilidade de ministros bem escanhoados, mas escalados para contar mentiras sobre um Brasil verde, pujante e pronto para voltar a ser o paraíso na Terra não vai colar depois de mais de 605 mil mortos na pandemia da Covid, as imagens dos famintos disputando lixo e os esgares de indiferença de Jair Bolsonaro ao sofrimento do povo brasileiro. Do Acordo de Paris para 2020, em vez de reduzir, o Brasil elevou as emissões de gases estufa em quase 5%.

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