A Petrobrás não cumpre mais o papel de uma empresa estatal. Essa é a opinião do geólogo Guilherme Estrella, que foi diretor de exploração da empresa estatal e coordenou os trabalhos para a descoberta das reservas de petróleo do pré-sal. “A empresa hoje está de costas para o país”, critica Estrella, de forma veemente. Estrella tem compromisso com a empresa, na qual ingressou ainda em 1965.

Ele condena o desmonte da Petrobrás, que considera um ataque à soberania nacional porque afeta diretamente o setor energético do país. E confirma: os altos preços dos combustíveis, que assustam os brasileiros, são o resultado da total desorganização do setor implementada desde o Golpe de 2016, que derrubou Dilma Rousseff da Presidência da República.

Na opinião do geólogo, a agenda privatizante já era praticada antes dos governos do Partido dos Trabalhadores, mas lembra que foi interrompida em 2003 com a chegada de Lula à Presidência da República. Agora, voltamos ao jogo do país como colônia.

Ele lamenta que a Petrobrás tenha voltado a ser uma empresa gerida por fundos de investimentos e que atende, exclusivamente, aos interesses de seus acionistas privados. Estrella argumenta que a agenda ultraliberal é uma afronta aos interesses nacionais, mais segue sendo implementada por meio da fraude eleitoral, desrespeitando a Constituição.

Apesar do diagnóstico preocupante, Estrella acha que é possível reverter o mal que está sendo feito pela gestão de Bolsonaro, embora não seja uma tarefa fácil. A seguir, leia os principais trechos da entrevista concedida à Focus Brasil:

Focus Brasil — Vivemos um momento em que o país está assustado com os preços da gasolina, do diesel e do gás de cozinha. A população não compreende o que gera essa situação. Qual é o motivo de o país estar nessa situação?

Guilherme Estrella — Nenhuma surpresa. O país está assustado, mas não é surpresa. Esse é o projeto de país deste governo. Mas não só dele. Este é o projeto de país que vinha sendo implantado com o [ex-presidente] Fernando Henrique [Cardoso]. E, aliás, vinha de antes, desde o Consenso de Washington. Então, começa com [Fernando] Collor, vem FHC… A Petrobrás só não foi privatizada porque houve um problema no Senado e o processo foi interrompido pelos governos do PT.

Por causa disso é que veio a descoberta do pré-sal e a autossuficiência com a Bacia de Campos. O Brasil conseguia ali, afinal — e é um dos países mais ricos do mundo em recursos naturais — garantir o seu abastecimento de energia. Até então, o país não tinha energia garantida para o século 21 para termos um projeto de nação desenvolvida e soberana. O poder mundial, concentrado nos EUA através do capitalismo neoliberal, mantinha o Brasil nessa situação sempre dependente de energia. A descoberta do pré-sal foi a base para termos um projeto de país soberano. E, logo depois, começam as pressões. Quatro, cinco meses depois, os Estados Unidos reativam a Quarta Frota no Atlântico Sul. E, depois, vimos com as denúncias feitas por jornalistas e tudo o mais que eles começaram a nos espionar. A CIA passou a espionar as atividades da Petrobrás e da presidente da República.

Veio o Golpe de 2016 e instalou-se um governo que representava esses interesses antibrasileiros. Até fraudaram as eleições de 2018, prendendo o Lula sem provas, completamente inocente. Na ditadura, os caras cassavam e tiravam os direitos políticos. Mas no lawfare, o Departamento de Estado dos EUA, junto com a Justiça brasileira, com os procuradores, disseram: “Não. Prende esse cara”. A eleição de 2018 foi fraudada por isso.

Aí implantam o projeto deles. E qual era? Desnacionalização da economia, abertura total do mercado brasileiro… Com relação ao petróleo, o primeiro ato do [Michel] Temer foi desonerar a importação. Quer dizer, mataram o projeto de conteúdo nacional.

 

— Um ataque à soberania.

— Nós somos a 10ª economia do mundo. Fomos a sexta. Mas, no que diz respeito ao consumo de energia per capita, estamos no 50º lugar, se não for mais atrás. O povo brasileiro não consome energia. Ora, o consumo de energia é referência de qualidade de vida. Temos uma país também absolutamente injusto na distribuição de renda. Resultado: o mercado brasileiro tem um potencial de crescimento de consumo energético imenso. Esse é o filé mignon dos interesses internacionais para investirem no Brasil. Aí, tratando da Petrobrás, como é que o camarada vai comprar uma refinaria? Ele diz o seguinte: “Preciso ter garantia de vender os meus produtos refinados em Mataripe no mercado brasileiro a preços internacionais, se tiver preços controlados pelo governo. eu não vou investir”. Isso é o que os fundos financeiros internacionais alegam.

Eles dizem também: “Eu também participo de produção em outros países e para competir no mercado brasileiro e usar o meu petróleo, tenho que pagar também o preço de importação, não é só o valor do petróleo internacional. E eu quero compensar o meu preço de importação. Quero produzir na refinaria aqui com o meu petróleo que vem lá de outro país”.

Porque eles também são donos da Petrobrás. Tudo isso está dentro do script desse projeto de país completamente submisso aos interesses antibrasileiros dos grandes fundos financeiros internacional. Quem manda no Brasil hoje, meu amigo, é o pessoal das Ilhas Cayman. Não precisa procurar muito. Então, o PPI, o preço do petróleo importado, é indispensável para eles venderem as nossas refinarias.

 

— Qual a diferença entre a estatal sob os governos Lula e Dilma e a Petrobrás agora?

— Já disseram que eu estou muito pessimista. Eu disse: “Meus amigos, a Petrobrás acabou”. Disse isso e repito: a Petrobrás como empresa estatal brasileira acabou. Empresa estatal é o que nós praticávamos nos governos Lula e Dilma. Era uma empresa presente em todo o país, que se preocupava primeiramente com o abastecimento nacional de combustíveis. Depois a gente ía fazer as contas. Mas o brasileiro lá de Benjamin Constant, que está no rio Solimões, na fronteira com a Colômbia, aquele cidadão brasileiro era proprietário da Petrobrás, uma empresa estatal. Ele pagava pelo combustível dele o mesmo que uma pessoa aqui no Rio de Janeiro, ao lado da refinaria. Então, esse era o compromisso da Petrobrás. Mas não é só isso. A Petrobrás estava integrada à sociedade, às comunidades onde trabalhava. Veja o caso da Refinaria de Urucu, no Amazonas. Está lá há 30 anos e não tem um problema ambiental. Tínhamos lá um projeto com a Universidade Federal do Amazonas. Com a nossa atividade, produzíamos a criação de pequenas empresas, dávamos emprego ao cidadão, pagavam-se impostos. Isso é que era uma empresa estatal. Mas ela não existe mais. A empresa hoje é de um fundo de investimento, a Black Rock, que quer ganhar dinheiro. Fundo de investimento é pior do que banco porque quer ganhar o máximo com menor risco, no menos prazo de tempo e com menor número de empregos gerados, com trabalho precarizado.

A Petrobrás hoje está de costas para o Brasil. Ela não tem mais nenhum compromisso com o cidadão brasileiro. Nenhum. Um monte de discussão sobre o aumento dos preços e a Petrobrás vai lá e aumenta tudo de novo e o presidente da República vem dizer “não, isso é coisa da Petrobrás. Eu não tenho nada a ver com isso”. É que ele não está lidando com uma empresa estatal, ele está tratando com um fundo de investimento gerindo uma riqueza brasileira, descoberta por brasileiros. É uma empresa contra o Brasil que pertence a grupos financeiros internacionais.

 

— Nos governos do PT, a Petrobrás teve um papel não só por ter aumentado a produção de petróleo. A conspiração que levou à derrubada da Dilma e à prisão do Lula, iniciada pela Lava Jato, não foi um vetor para a canibalização da empresa? 

— É isso mesmo. Eu colocaria um adendo que é fundamental: o BRICS [sigla do grupo de países formados por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul]. Quer dizer, um país desse que é um dos mais ricos do mundo, com indústria — soberano —, com energia… A grande sacada do governo Lula foi a política de conteúdo nacional. Quando nós entramos, fomos à Angra dos Reis porque tinha um estaleiro lá e para entrar tinha um matagal com portão de ferro. Tivemos que bater palma e vinha um cara com uns cachorros. Os estaleiros eram isso.

Durante os governos do PT eram 8 mil empregados, por causa do conteúdo nacional. Tinha gente que dizia: “Não, construir no Brasil sai mais caro”. Tem que sair mais caro mesmo, meu amigo. A indústria naval estava fechada há 20 anos. Eu visitava pessoalmente os estaleiros de Cingapura e Dubai e eles usam mão de obra escrava. Lá, a construção naval é 25% a 30% de custo de mão-de-obra. Então, construir navio e plataformas no Brasil é mais caro, sim.

E aí eu volto aos BRICS, um país como o Brasil, se desenvolvendo como estava, se junta com China, Rússia, Índia, isso pintou o sinal vermelho em Washington e no grande capital internacional. Decidiram passar o trator e mandaram prender o Lula. Essa interferência foi absolutamente ultrajante. Os juízes e procuradores saíram do Brasil e foram para o Departamento de Justiça dos EUA para receber ordens para fazer o que fizeram.

Quem rompeu a democracia brasileira e rasgou a Constituição foram eles. Essa é uma realidade que nós temos que enfrentar.

 

— O senhor falou que a Lava Jato destruiu o desenvolvimento da indústria e da engenharia nacional, mas o que vem depois disso, é muito tenebroso. A privatização da BR Distribuidora levou à desorganização completa do setor de óleo e gás. Como esse desmonte afeta o país diretamente?

— Está tudo dentro do script. Esses gasodutos que foram vendidos agora, fomos nós que construímos, companheiro. O GASENE [Gasoduto da Integração Sudeste-Nordeste], fomos nós que construímos. Os gasodutos troncos no Brasil inteiro, inclusive o Coari-Manaus, 650km em plena floresta amazônica, fomos nós que construímos. Foram os brasileiros da Petrobrás, a Petrobrás como ferramenta de governo, cumprindo política de Estado.

No governo FHC, a Petrobrás tinha sido transformada em um conjunto de unidades e negócios. Nossos gerentes de unidades eram negociantes, homens de negócios. Eles gerenciavam unidades de negócios de que tinham que dar lucro. A primeira coisa que fizemos foi o seguinte: “Acabou esse negócio. Nós somos um sistema”. E transformamos a Petrobrás numa empresa integrada de energia. Mas isso é porque era outra ótica, a antiliberal. Uma ótica em que se gerencia sistemicamente com a missão de servir a população.

O que está acontecendo hoje é ideológico. Manda esquartejar e todos os ativos vão ter que dar lucro. Perdeu o caráter estatal e transformou a empresa em algo que não é nem mais um conglomerado porque já são outros fundos financeiros que gerenciam os gasodutos, as refinarias que foram vendidas. E venderam os campos terrestres e vão vender os campos marítimos porque o pré-sal e o mercado do Sudeste brasileiros são o filé mignon.

O pré-sal está produzindo gigantescamente e a menos de US$ 20/barril e vende o petróleo a US$ 75/barril no mercado. E vende ao preço internacional mais o preço de importação porque se não tiver ninguém compra a Refinaria de Mataripe. E eles querem se livrar de Mataripe também. Cada poço do pré-sal produz 20 mil barris por dia e os custos operacionais são de US$ 6/dia. É o interesse dos fundos financeiros. É o melhor negócio do mundo. Agora, eles antecipam dividendos. E eles vendem a BR Distribuidora porque não querem compromisso com o cidadão brasileiro que mora em algum lugar longe.

 

— Paulo Guedes disse que seria necessário vender a Petrobrás porque daqui a 30 anos ela estará obsoleta e não valerá mais nada. E o João Doria diz a mesma coisa. Ou seja, a extrema-direita e a direita “limpinha” também defendem a privatização. Qual modelo devemos aplicar para recuperar a Petrobrás?

— Essa é uma pergunta central. Primeiro, quero fazer um prolegômeno aí. Quem disse que queria vender a Petrobrás foi o Guedes e onde que ele disse isso? Em Nova York. Ele estava lá junto dos donos dele. E, um dia depois, devem ter dito para o presidente da República dizer a mesma coisa, senão iria pegar mal. O que Guedes, Bolsonaro e Dória falaram é a “voz do dono”. O PSDB está na mesma. Mas aí vem a pergunta crucial: fomos vítimas de um golpe, de um rompimento político-institucional no Brasil. Então, temos que partir do princípio de que tudo isso foi feito de uma forma irregular, dentro dessa ruptura e num atentado contra a soberania brasileira.

Temos que ganhar o governo, temos que eleger também um Congresso que seja voltado a esse nosso alerta de que o Brasil se transformou numa colônia do grande capital financeiro internacional e daí começarmos a trabalhar como vamos recuperar isso. Porque tem o seguinte, não vimos ainda tudo o que vai acontecer até dezembro de 2022.

Temos que aceitar a defender a recuperação da Petrobrás como uma empresa estatal, em todo o Brasil. Para isso, precisamos — e não sou eu que estou dizendo, não — o Lula, no discurso em São Bernardo do Campo, quando saiu da prisão, disse: “Estejam atentos aos que compraram os ativos da Petrobrás porque nós vamos recuperar isso”. Aliás, uma coisa abjeta o que fizeram com o Lula. Quem que vai pagar por um homem preso por mais de 500 dias? Quem vai pagar por esse crime?

Então, esse é o nosso papel. Nossa proposta tem que ser clara para que o cidadão possa votar sabendo no que está votando. E a mensagem é essa: “Reverteremos tudo o que esse governo está fazendo porque é um governo ilegítimo, produto de uma fraude eleitoral e de um crime judicial”.

Aí tem gente que diz que isso seria ruptura. Não é ruptura. Eu tenho a Constituição [exibe um pequeno exemplar da Constituição Federal]. Não sou advogado, mas a Constituição tem que ser entendida por um cidadão comum, não é? E está lá. No item 1, do Artigo 1º: soberania nacional. Energia é matéria de soberania nacional. Eu estava no Iraque, era gerente de exploração em Bagdá, e descobrimos um campo enorme. O governo iraquiano nos chamou, disse que éramos amigos, mas que tínhamos descoberto um campo muito grande que eles tomariam de volta porque é estratégico para o Iraque. Disseram que não tinham chamado uma empresa estrangeira para fazer a descoberta que tínhamos feito. Eles falaram: “avisem ao pessoal no Rio de Janeiro que vamos conversar, mas não sobre a nossa decisão, e, sim, sobre como vamos cumprir essa decisão”. Então, petróleo é energia, é soberania nacional.

Em 2003, o EUA invade o Iraque por causa de Majnoon [maior campo de petróleo do iraquiano]. Ou seja, o capital financeiro internacional invadiu o Iraque em 2003 por causa da Petrobrás. E eles vieram dar o golpe no Brasil também por causa da Petrobrás.

Ainda de acordo com a Constituição, o povo tem o direito de reivindicar. O artigo 14 diz que a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal mediante plebiscito, referendo e por iniciativa popular. Na minha modesta opinião, nossa mensagem tem que ser a seguinte: olha, nosso projeto de Brasil, além de retomar os investimentos para o desenvolvimento, vai praticar uma democracia crescentemente participativa, ouvindo a população brasileira.

E ainda tem o artigo 219 da Constituição que aponta que tudo o que eles fizeram foi inconstitucional. O artigo diz que “o mercado interno integra o patrimônio nacional e será incentivado de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e socioeconômico, o bem-estar da população e a autonomia tecnológica do país”. Isso está na Constituição. Esse mercado interno pertence a nós. Não se pode privatizar um oleoduto. Eu acho que não há outro jeito, senão nós não elegeremos um presidente da República em 2022. Nós elegeremos um governador-geral, um sucessor do Mem de Sá [administrador colonial português]. Quer dizer, o presidente da República irá governar uma colônia.

 

— Como o senhor acha que o país estaria hoje se o modelo de partilha não tivesse sido desfeito?

— Essa é uma questão muito interessante, porque o cidadão comum desconhece. É o seguinte. Antes da descoberta do pré-sal, e com a Bacia de Campos já em estado adiantado de exploração e produção, você tinha as outras bacias brasileiras e campos pequenos de exploração. Então, havia o risco exploratório. Eram bacias grandes.— em terra ou na costa. Havia muito risco em toda a costa equatorial. Então, tinha que criar atratividade aos investidores. Veja, não estou defendendo essa política. Eu sou favorável ao monopólio estatal do petróleo.

Bom, para atrair o investidor você tem que dizer para ele que se descobrir algo ao correr o risco, o que ele encontrar será dele. Só que, com o pré-sal, quando a gente descobre um campo, não é sorte. Descobrimos o caminho das pedras e o risco exploratório é zerado. A partir daí, não tem mais sentido manter o modelo de concessão que dava, ao investidor que assumiu o risco, a propriedade do petróleo.

O modelo de partilha é diferente. Ele determina que o petróleo é de propriedade da União porque quase não há risco para encontrá-lo. É óbvio que o investidor tem que ser remunerado. Em termos bem gerais, essa remuneração vai vir da concorrência nas licitações. As empresas vão ganhar a atividade de produção de petróleo e vão receber remuneração da União que é a proprietária do petróleo.

Mas tinha outra coisa, e essa é uma informação crucial: a Petrobrás teria que ser operadora única, com no mínimo 30%. E aí que realmente transforma a partilha de produção no Brasil em algo diferente de todos os outros países do mundo. Não é assim na Líbia e em outros locais porque esses países não tinham geocientífica, técnica e tecnológica, para produzir o seu petróleo. Então, a operação não precisava ser com eles. O operador é quem resolve tudo na produção do campo que vai operar, sozinho ou consorciado. Então, era absolutamente indispensável que o governo colocasse a Petrobrás como operadora única porque essa era a ferramenta do governo para uma política de Estado de conteúdo nacional e, consequentemente, desenvolvimento industrial, científico e tecnológico. Por isso é que logo [o senador tucano] José Serra, junto com aquela moça da Chevron, disse que a primeira coisa que fariam seria acabar com esse negócio de operadora única. Aí é que reside uma parcela importantíssima do lucro da empresa que vai operar, porque ela vai se desenvolver tecnologicamente e ganhar muito em competitividade internacional no campo em que atua. Essa foi a vantagem da partilha de produção. E tem muito mais.

Colado a tudo isso, tinha o fundo social. A lucratividade do pré-sal é muito grande. E o objetivo era reservar, amarrar essa lucratividade, a um projeto de desenvolvimento social também. A solução brasileira foi muito apropriada. E, para completar, com a Petrobrás como operadora única do pré-sal, era necessário ter uma política de exploração e produção das bacias sedimentares brasileiras que atendesse a longo prazo as nossas necessidades energéticas.

Guedes fala que o petróleo vai acabar e se fala em transição energética. Pois bem, há um processo de aquecimento global que é geológico e vem de 1 milhão de anos. Existe uma correspondência entre a primeira revolução industrial e o aumento de CO² na atmosfera que produz o aquecimento global. Considerando que isso seja importante, o planeta precisa entrar num processo de transição energética porque a matriz energética mundial é 80% fóssil e 20% renovável. No Brasil, a nossa matriz energética é a mais bem equilibrada entre as grandes economias do mundo. Temos 55% fóssil e 45% renovável. É uma matriz energética civilizada, equilibrada, mesmo com a nossa previsão de virmos a consumir 5 mil ou 6 mil barris de petróleo por dia. Esse crescimento do consumo energético vai abrir lugar também para as fontes alternativas. Ou seja, temos 10 milhões de toneladas de petróleo com outras fontes energéticas. Por isso que é importante a visão de longo prazo. Com o desenvolvimento nacional, sempre podemos equilibrar essa matriz. Então, quem tem que fazer transição energética agora são os grandes consumidores: EUA, China e Europa. Porque eles é que produzem uma matriz energética de 80% de origem fóssil e só 20% de origem renovável. Então, sem essa de que temos que ter cuidado ao produzir o pré-sal porque vamos poluir a atmosfera. A atmosfera já está poluída e foi o consumo de petróleo que fez a riqueza, o protagonismo e o hegemonismo dessas nações no mundo inteiro. O Brasil tem lugar para produzir pré-sal e, mais do que isso, temos uma perspectiva de longo prazo.

 

— Uma Petrobrás que não é forte, que não se envolve com o desenvolvimento da indústria nacional, atrapalha até o avanço do país com relação a fontes renováveis?

— Essa pergunta também é central. A Petrobrás precisa ser integrada, como um sistema de produção de energia. Por causa da elevada lucratividade do petróleo do pré-sal e de outros campos — porque no geral produzimos a um custo muito barato —, podemos compensar a geração eólica, a geração fotovoltaica, a de biocombustíveis. O importante é que todo o sistema tivesse sustentabilidade econômica. Isoladamente, é difícil você compensar a baixa competitividade de uma energia eólica ou solar com a do pré-sal. Agora, se você gerir essa coisa sistemicamente, você pode manter os preços decentes para o desenvolvimento nacional e pode ter alguns elos que sejam deficitários, mas o conjunto é lucrativo. É aquela coisa, produzir é mais caro do que o petróleo importado, mas é mais negócio produzir no Brasil. Então, a gestão sistêmica com uma fonte muito lucrativa beneficia todo o sistema, todas as outras fontes e você investe para aumentar a competitividade das fontes alternativas.

 

— Continua otimista com o Brasil?

— Essa questão é crucial. Não vamos ter que fazer em 2022 uma escolha entre um país mais capitalista e de outro lado mais socialista. O que vamos ter que resolver em 2022 é entre um país soberano ou uma colônia. Então, não há possibilidade de dúvida. Essa convicção não é só minha. Mas o povo brasileiro precisa se convencer disso. Não existem duas opções de escolha. Existem duas situações que são mutuamente excludentes em relação à soberania nacional. Não há o que escolher. Ou você recupera o SUS, a Petrobrás, os direitos dos trabalhadores, ou vamos para o Brasil colônia. Essas pessoas que estão aí e outras que se anunciam como alternativa, caso do João Doria, destruíram a soberania nacional.

Este país é nosso. Não há o que escolher. Outro dia, fizeram um absurdo. Luciano Huck falou que seria difícil escolher entre o Lula e o Bolsonaro. Isso é de um absurdo total. Nem se essa pessoa que eu citei tivesse alguma importância. E não tem. Mas não há o que escolher: ou elegeremos um presidente da República ou um governador-geral. É isso. Não há nem o que pensar.

`