Há um tratado assinado há vários anos pela Argentina e Uruguai definindo a administração compartilhada do Rio Uruguai na fronteira entre os dois países, inclusive os devidos cuidados com sua preservação ambiental.

Há um tratado assinado há vários anos pela Argentina e Uruguai definindo a administração compartilhada do Rio Uruguai na fronteira entre os dois países, inclusive os devidos cuidados com sua preservação ambiental. Em 2004 foi anunciado o investimento de cerca de US$ 1,8 bilhão de duas grandes empresas multinacionais de papel e celulose, respectivamente a finlandesa Botnia e a espanhola Ence, para construir suas fábricas à beira do lado uruguaio do rio, no município de Fray Bentos.

Aparentemente não havia controvérsias, mas quando estas empresas iniciaram a construção no final do ano passado, teve início também um movimento de protesto da população da cidade de Gualeguaychú na província argentina de Entre Rios. Esta mobilização era liderada por ambientalistas que argumentavam que o rio seria poluído pelas empresas, embora haja técnicos argentinos que afirmem o contrário (Leia mais no Diário La Republica de 31/3/2006).

Obtiveram o apoio do governador da província e rapidamente os ativistas tiveram força suficiente para bloquear a passagem de veículos na ponte que une os dois países. Esta atitude causou danos razoáveis às exportações uruguaias, e o clima entre os dois governos deteriorou-se substancialmente. No entanto, durante a posse da presidente Bachelet do Chile, em março último, os presidentes Nestor Kirchner da Argentina e Tabaré Vázquez do Uruguai anunciaram que as obras das empresas seriam suspensas por 90 dias e que o tráfego nas pontes seria liberado. A intenção era anunciar um acordo em poucas semanas, o que seria feito durante um encontro formal entre os dois governantes no final daquele mês.

Isto não ocorreu e o bloqueio na ponte foi retomado. A Argentina quer levar o assunto para discussão no Tribunal de Haia, organismo de solução de controvérsias previsto no Tratado do Rio Uruguai, enquanto o Uruguai solicita a interferência do Grupo Mercosul para dirimir o impasse.

Este assunto, aparentemente de fácil solução, foi “politizado” e se transformou em causas nacionais, gerando enorme impasse não somente entre os dois países, mas para o Mercosul como um todo. A percepção da sociedade uruguaia é que os países grandes da região, Argentina e Brasil, não se preocupam com o desenvolvimento dos países menores e dificultam o recebimento de investimentos. Além disso, têm reduzido as importações de bens uruguaios.

Setores da Frente Ampla, coalizão partidária que hoje governa o Uruguai, com o apoio do ministro da Economia e Finanças, Danilo Astori, chegaram a levantar a hipótese de retomar as negociações do acordo comercial com os EUA, hoje um dos principais destinos das exportações uruguaias. O presidente Tabaré Vázquez numa reunião ministerial desautorizou qualquer expectativa nesta direção, e posteriormente a intervenção do chanceler Reinaldo Gargano, numa reunião partidária, também descartou esta possibilidade. Portanto, por ora, o risco está afastado.

Para que o Mercosul avance é necessário que as assimetrias e desigualdades entre os países participantes sejam reduzidas. As ações concretas para cumprir este desafio dependem, principalmente, dos países maiores que terão que ceder mais nas negociações comerciais e aplicar mais recursos na integração, para que as economias menores se fortaleçam mais rapidamente. Isto deveria ser entendido como um investimento que os maiores fariam agora para colher resultados mais adiante em termos de acesso a mercados em crescimento.

É justa a preocupação argentina com a preservação ambiental do Rio Uruguai, mas é lamentável a forma com a qual foi manifestada, ainda mais em se tratando de dois governos progressistas. Tanto na Argentina, quanto no Brasil, existem muitas indústrias de papel e celulose e neste momento há propostas de novos investimentos, não apenas das duas plantas no Uruguai, como também da VCP e da Stora-Enso no sul do Brasil.

É verdade que há controvérsias quanto ao impacto ambiental destas indústrias pelo fato de normalmente adquirirem grandes áreas no seu entorno para plantar eucaliptos e/ou pinheiros, sua matéria prima, o que concentra terra e provoca alterações na biodiversidade local. No entanto o impacto na atmosfera e bacia hidrográfica, que é dramático nas indústrias mais antigas, foi muito melhorado com a utilização de novas tecnologias.

A suspensão da construção proposta anteriormente oferecia o prazo necessário para que novas análises fossem feitas para eliminar as preocupações argentinas. Porém, atrasar ainda mais a construção obrigará o governo uruguaio a pagar multas às empresas e, finalmente, o bloqueio à ponte prejudicará a todos, uma vez que produtos brasileiros destinados à Argentina também passam por ali.

Portanto, é uma questão política do Mercosul, e o Grupo Mercado Comum terá que se posicionar sobre a questão.

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