A prefeitura pode favorecer a descentralização das atividades de esporte e lazer, melhorando a qualidade de vida e permitindo aos cidadãos a ocupação prazerosa de seu tempo livre.Autor: Marco Antônio de Almeida

A prefeitura pode favorecer a descentralização das atividades de esporte e lazer, melhorando a qualidade de vida e permitindo aos cidadãos a ocupação prazerosa de seu tempo livre.Autor: Marco Antônio de Almeida

As atividades de lazer esportivo, mais do que preencher o tempo ocioso, desempenham um papel importante na vida das pessoas: são fundamentais para o desenvolvimento da sociabilidade e das relações interpessoais. Cabe ao poder público potencializar estas atividades e ao mesmo tempo otimizar a interface existente entre a educação, a saúde, o esporte e o lazer como elementos básicos para a melhoria da qualidade de vida da sociedade como um todo.

Ao planejar uma política de esporte, principal diretriz que um dirigente municipal deve ter em mente é que ela contemple o princípio da livre escolha e da participação espontânea, com incentivo à criatividade e busca de ocupação prazerosa do tempo disponível. Estas atividades devem ser tratadas sob ótica interdisciplinar, atendendo todas as manifestações culturais do esporte: físico-esportivas, intelectuais, sociais e turísticas.

EVENTOS E ATIVIDADES

No campo do esporte, o poder público municipal oferece, de maneira geral, atividades de caráter:

* permanente, tais como: escolinhas de iniciação, e de aperfeiçoamento, que se configuram como base para o desenvolvimento de atividades de esporte e lazer;
* de apoio, que incentivam e sustentam as atividades permanentes, e se traduzem em oficinas e cursos de curta duração, pequenos torneios, campeonatos, jogos, mostras, festivais e concursos, etc.;
* de impacto e eventos especiais, que mobilizam grande parcela da sociedade e são experiências lúdicas, seja como clímax de um processo, seja como forma de comemoração e/ou festa.

Uma diretriz importante é planejar tendo em vista projetos integrados, que farão a interface com outras áreas, especialmente Ação Social e Educação, elegendo portanto como públicos prioritários as comunidades carentes e a comunidade escolar. Também é fundamental investir nas áreas da cidade que são mais carentes em matéria de equipamentos, descentralizando as atividades e os eventos, para democratizar o acesso aos equipamentos e serviços públicos.

Também é preciso planejar estas atividades, procurando consolidar positivamente as relações existentes entre o esporte, o lazer e o turismo. É o caso, por exemplo, dos municípios que possuem paisagens naturais propícias para a prática de "esportes radicais" (como surfe, asa delta, bicicross, etc.) que atraem um público jovem que os pratica e que pode se tornar uma atração turística a mais para o município. Outra medida possível é transformar as próprias práticas esportivas em eventos turísticos, promovendo campeonatos, torneios e jogos.

IMPLANTAÇÃO

Um ponto que merece ser considerado é a utilização de estratégias e metodologias de ação comunitária, como forma de viabilizar a descentralização das ações e a ampliação da oferta de atividades, proporcionando o acesso da população à prática desportiva, com vistas ao desenvolvimento pessoal e social do cidadão. Sob este ponto de vista, é possível um duplo entendimento das ações de lazer: como veículo e objeto de educação, propondo de um lado ações de educação para o lazer esportivo, e de outro, ações de educação pelo lazer esportivo.

Dessa forma, é importante propiciar a utilização mais democrática possível dos equipamentos e centros desportivos da prefeitura, que muitas vezes são controlados por agremiações e sociedades de bairro que praticamente privatizam o uso desses espaços públicos.

Outra distinção necessária é entre o esporte competitivo de alto nível e práticas desportivas com objetivos lúdicos. Estas últimas devem ter um caráter abrangente, atingindo todas as faixas etárias, mas especialmente as crianças e os adolescentes. A prefeitura pode oferecer cursos e atividades com monitoramento de professores e estagiários das áreas relacionadas ao esporte (Educação Física, Nutrição, Medicina, etc.). Os jovens que se destacarem nessas atividades podem ser encaminhados para treinamentos especializados, buscando-se apoio da iniciativa privada.

As atividades físicas e desportivas têm especial importância para os públicos pré-escolar e escolar, que podem ser contemplados em horários alternativos ao da escola regular, utilizando-se centros comunitários, centros esportivos e equipamentos públicos como as dependências das próprias escolas. As oficinas de esportes podem complementar outras atividades como oficinas de música, teatro, artesanato, acompanhamento dos deveres escolares por monitores, etc., oferecendo assim uma ampla gama de ações destinadas a preencher construtivamente o tempo livre de crianças e jovens, contribuindo para sua formação e afastando-os das ruas.

No que diz respeito às escolas, a promoção deste tipo de atividade, em conjunto com outras que também utilizem e absorvam as expressões culturais da juventude da periferia (como por exemplo o rap) modificam a visão que se tem da escola: ela passa a ser vista como um centro de eventos aberto à comunidade, diminuindo depredações e situações de violência juvenil.

RECURSOS HUMANOS

Considerando que as pessoas envolvidas com estas atividades devem estar muito bem preparadas, o governo municipal deve estabelecer um plano de capacitação e reciclagem de recursos humanos que leve em conta:

1-) a sensibilização e conscientização de todos os membros das equipes envolvidas;

2-) o treinamento e reciclagem dos profissionais que gerenciarão as ações; e

3-) a formação e capacitação de monitores e agentes socio-recreativos voluntários que poderão atuar como multiplicadores de ações junto às comunidades.

Também é importante levar em conta o envolvimento de possíveis parceiros, tendo em vista a otimização de recursos humanos. Podem ser buscados convênios junto às faculdades de Educação Física, Fisioterapia, Nutrição, etc., possibilitando estágios para os alunos em atividades de monitoria nos cursos promovidos pela prefeitura. Isto permite uma maior qualificação para as ações de lazer, através da atuação de equipes interdisciplinares compostas por profissionais de diversas áreas e experiências.

Pode ser que a oferta de cursos e atividades monitoradas não consiga atender uma demanda crescente por parte dos usuários. Nesse caso, quando não há disponibilidade de professor especializado, o grupo interessado, caso disponha de recursos financeiros, pode contratar um professor particular, e a prefeitura cede o espaço para a realização da atividade. Outra possibilidade é a comunidade indicar alguém que participe de atividades de capacitação nessa área, para ser um instrutor/monitor local.

INSTALAÇÕES E EQUIPAMENTOS

A implantação de novos equipamentos de esporte e lazer se dar após ampla pesquisa junto a cada comunidade, como forma de mapear suas expectativas. Nas instalações e equipamentos destinados ao esporte e ao lazer, devem ser observados todos os critérios para que não haja barreiras arquitetônicas para as pessoas portadoras de deficiências. Instalações mais antigas podem ser adaptadas.

A manutenção e recuperação das instalações e equipamentos de lazer existentes podem ser feitas mediante ação conjunta com a comunidade e com órgãos públicos e privados que atuam no local, visando otimizar os recursos físicos e materiais existentes em cada comunidade. Para tanto o governo municipal pode prever o estabelecimento de convênios e parcerias com instituições mantenedoras de equipamentos de esporte e lazer da comunidade, particularmente empresas, como forma de viabilizar sua utilização pelos moradores da região.

Além disso, o governo municipal também deve estudar o uso de espaços alternativos para atividades de esporte e lazer, ampliando a oferta de atividades que envolvam a população em geral.

EXPERIÊNCIA

Em Campinas-SP (879 mil hab.), na gestão 1993-1996, a área de esportes foi subdividida em três grandes áreas de atuação: competição, eventos e parceria. Os projetos e parcerias tinham por objetivo principal modificar o perfil da cidade de Campinas em relação ao esporte, amador e profissional. Procurou-se trazer grandes eventos para o município, estabelecer parcerias e patrocínios e dotar a cidade de espaços adequados para a prática do esporte e proporcionar o acesso da população carente à prática desportiva, através do projeto "Esporte nos Bairros".

Um dos objetivos pretendidos foi o de dotar a cidade de equipes competitivas para a disputa dos Jogos Abertos do Interior e de campeonatos regionais. Foram montadas equipes patrocinadas por empresas – a de vôlei, patrocinada pela Olimpikus, e a de basquete, patrocinada pela Microcamp – com o intuito de atrair grandes nomes do esporte e melhorar o nível técnico das categorias inferiores, proporcionando a revelação de valores locais. A meta era manter Campinas sempre entre as cinco cidades melhor colocadas nesses torneios.

Mas o projeto de maior alcance social na área esportiva é o "Esporte nos Bairros". Envolvendo as Secretarias de Administração Regionais e quarenta monitores contratados junto às Faculdades de Educação Física da Unicamp e da PUC-Campinas, desenvolveu-se em 55 diferentes locais, quase todos em áreas carentes do município, atingindo entre 3.000 e 4.000 crianças na faixa de 7 à 15 anos. São oferecidas seis modalidades diferentes: futebol, basquete, vôlei, natação, atletismo e ginástica olímpica.

Este projeto foi viabilizado graças a uma parceria com a empresa DPaschoal, que tornou possível à prefeitura comprar material esportivo e contratar os monitores.


* Publicado originalmente como DICAS nº 93 em 1997

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