Esta é uma das cinco experiências premiadas como destaque no ciclo de 1996 do Programa de Gestão Pública e Cidadania (iniciativa conjunta da Fundação Getúlio Vargas – SP e Fundação Ford).Autor: Marco Antônio de Almeida, a partir do relatório de Clarice Melamed para o Programa Gestão Pública e Cidadania.

Esta é uma das cinco experiências premiadas como destaque no ciclo de 1996 do Programa de Gestão Pública e Cidadania (iniciativa conjunta da Fundação Getúlio Vargas – SP e Fundação Ford).Autor: Marco Antônio de Almeida, a partir do relatório de Clarice Melamed para o Programa Gestão Pública e Cidadania.

O Programa Médico de Família de Londrina-PR (405 mil hab.) foi elaborado para permitir o acesso da população rural aos serviços de saúde, dentro de um enfoque de atenção integral e de prevenção de doenças. As equipes __ médico, enfermeiras, auxiliares de enfermagem e agentes de saúde __ residem nos distritos rurais onde trabalham, com dedicação exclusiva. Realizam visitas domiciliares e atendem também em unidades básicas de saúde, que servem de referência. Contam com um veículo para as visitas, equipado com sistema de comunicação celular.

OBJETIVOS

Londrina é um dos 113 municípios brasileiros que se encontram em gestão semi-plena da saúde: possui o controle e a responsabilidade de todos os serviços, ações e recursos (provenientes de repasses estaduais e federais), dos quais presta contas ao Conselho Municipal de Saúde. Desde 1993 a prefeitura vem desenvolvendo ações para construir um modelo de acordo com os princípios do SUS, baseado na promoção, proteção, diagnóstico precoce, tratamento e recuperação da saúde.

O público-alvo do Programa Médico de Família de Londrina é uma população rural de aproximadamente 23 mil pessoas. No final de 1994 um convênio firmado entre Prefeitura, Ministério da Saúde/Fundação Nacional da Saúde (FUNASA) e Secretaria da Saúde do Estado do Paraná oficializou o programa, implantado em abril de 95.

IMPLANTAÇÃO

A zona rural foi dividida em cinco distritos de saúde, cada um com uma equipe responsável pelas visitas e internações domiciliares, e a participação em grupos comunitários.

As etapas de implantação do programa foram:

* divulgação nacional da implantação do programa em Londrina, através de comunicados às escolas de saúde pública do país, imprensa local e regional;
* processo de seleção de profissionais, com a cooperação do NESCO (Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva) da Universidade Estadual de Londrina;
* período de treinamento dos profissionais;
* acomodação das equipes nos distritos rurais; e
* início das atividades do programa, com priorização para o cadastramento das populações, respeitando-se, contudo, a autonomia das equipes em relação ao planejamento de suas ações.

O Programa Médico de Família é assessorado por um grupo de técnicos da Autarquia do Serviço Municipal de Saúde e da Universidade Estadual de Londrina. Este grupo colabora na elaboração e implementação de sistemas de informações técnicas e gerenciais, programas de educação continuada, instrumentos de avaliação do programa. Além disso, o grupo realiza visitas aos locais de trabalho e eventuais reuniões em Londrina.

PARTICIPAÇÃO POPULAR

A participação popular tem sido uma das grandes conquistas da saúde no município de Londrina. Neste programa, em particular, é bastante significativa. A participação da comunidade, sua organização em Conselhos Locais de Saúde e a discussão conjunta das prioridades demonstram que ações de saúde não são atribuições exclusivas dos médicos.

O programa, dado o seu enfoque preventivo, incentiva, junto à população, o debate sobre suas condições de vida e a necessidade de outros investimentos de caráter público como saneamento básico, coleta de lixo e outros, para que se alcance de fato a melhoria da saúde.

Os Conselhos Locais de Saúde se organizam de forma diferente de um distrito para o outro. Assim, a população fortalece sua participação de acordo com a realidade e a conjuntura locais. Cada equipe desenvolve eventos que estimulem essa participação, envolvendo também a Pastoral da Criança, a Secretaria de Educação do Município, a Fundação Nacional de Saúde e outras instituições afins.

O Dia da Saúde e os Vigilantes de Saúde, Festa da Vacina, o Natal na Unidade, são exemplos de eventos que procuram fortalecer os vínculos entre equipe de saúde e a população local.

PARCERIAS

Este Programa conta com uma grande rede de parcerias, cada uma com diferentes atribuições, facilitando e reforçando sua implantação. O Ministério da Saúde, além de definir as diretrizes gerais do Programa e a destinação de recursos para a compra de equipamentos e veículos, atua em conjunto com a Universidade Estadual de Londrina e com a Secretaria de Saúde do Estado, para inserir o projeto no Programa de Vigilância de Efeitos Adversos à Saúde em Populações Expostas a Agrotóxico. Já a FUNASA (Fundação Nacional de Saúde) participa da realização de ações específicas em cada distrito rural do programa, através do distrito sanitário de Londrina. A Universidade Estadual de Londrina/NESCO contribui com recursos humanos — docentes que formam a equipe de acompanhamento técnico e educação continuada para os profissionais do Programa. Cada distrito estabelece ações concretas a serem desenvolvidas junto com a Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento e com a EMATER — Empresa Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural.

RECURSOS E DESPESAS

Londrina possui uma autarquia municipal de serviços de saúde, cujos recursos provém do Ministério da Saúde __ cerca de dois terços __ e o restante do orçamento municipal, correspondendo a aproximadamente 14% deste. Os custos com as atividades do Programa Médico de Família demandam 1,4% dos recursos da autarquia.

As principais despesas do programa são as que envolvem recursos humanos. A contratação dos profissionais é feita através do Conselho Comunitário de Guarareva (o maior distrito rural), permitindo maior agilidade administrativa e um pagamento diferenciado do restante da rede municipal, compatível com as exigências da função (dedicação exclusiva, residência na zona rural, envolvimento nas atividades comunitárias de controle social do programa). As outras despesas são com equipamentos, medicamentos, reforma e/ou construção de Unidades Básicas de Saúde nos distritos.

Atualmente, o programa cobre 15.000 habitantes, ao custo de US$ 50 dólares per capita/ano. Neste valor não estão incluídas despesas referentes a internações e exames. Mesmo que estes valores, num cálculo superestimado, dobrassem o gasto per capita/ano, ainda assim estaríamos aquém do gasto público total do setor, de US$ 130 dólares per capita/ano (estimativa de 1995) e, o que é mais importante, com resultados superiores. Como o serviço é ofertado a uma população até então desassistida, a demanda inicial é muito alta, o que pode levar a curto e médio prazo a uma ampliação dos custos do programa.

DIFICULDADES

Um dos maiores desafios a ser vencido pelo Programa Médico de Família é mudar a cultura da assistência tradicional com ações curativas e fazer a população valorizar as ações de promoção da saúde e de prevenção da doença fora do consultório médico. O contato com a população procura mostrar que ações sobre o meio, orientação sobre o cuidado pessoal com a saúde, imunização/vacinação, etc., podem ter tanto ou mais valor que a própria consulta médica.

Como o programa foi implantado em uma área de carência generalizada, muitas vezes a população reage às ações de prevenção e promoção, valorizando e exigindo mais ações curativas. Nos momentos iniciais de implantação ocorre, portanto, uma sobrecarga de trabalho para o médico, especialmente nos distritos onde a densidade populacional é maior. A adoção, nesse caso, de um esquema complementar com outro médico, que daria plantões no posto de saúde, liberaria o médico do programa para visitas domiciliares.

Além disso, o trabalho busca identificar fatores de risco aos quais a população está exposta e oferecer atenção integral, contínua e de boa qualidade nas especialidades básicas de saúde, nos níveis domiciliar, ambulatorial e hospitalar.

O programa procura proporcionar a satisfação ao usuário construindo um relacionamento participativo e humano entre a equipe e a comunidade. Para assegurar o cumprimento deste objetivo, é importante garantir aos profissionais do programa educação permanente, cursos de capacitação e treinamento para aperfeiçoamento. Este enfoque define um perfil específico para os trabalhadores de saúde envolvidos, o que dificulta muitas vezes o processo de seleção de pessoal.

Veja também a experiência de Niterói.


RESULTADOS

O objetivo do Programa é melhorar a saúde da população a partir de um novo modelo assistencial de tratamento e recuperação da saúde, e seguindo as diretrizes do SUS (Sistema Único de Saúde). A família é o núcleo de abordagem no atendimento à população, sob o ponto de vista comunitário. As atividades das equipes do Médico de Família previnem doenças, identificam fatores de risco aos quais a população está exposta, orientam internação domiciliar, incentivam a organização popular, humanizam o serviço, entre outras.

A partir desses princípios, a Prefeitura de Londrina-PR, articulando várias parcerias, conseguiu implantar o Programa Médico de Família em cinco distritos rurais, atendendo a 15 mil pessoas com dificuldade de acesso aos serviços de saúde e educação. Nessas áreas, o programa conseguiu reduzir, em um ano, o índice de mortalidade infantil da zona rural do município de 35,1 para 3,7 mortes por 1.000 nascidos vivos Outros resultados obtidos foram o aumento do número de consultas, aumento da cobertura vacinal, aumento do número de visitas.

Além disso, é importante destacar o aspecto social do programa. Ele tem cumprido um papel fundamental na integração das comunidades rurais. As equipes atuam na direção de estimular a organização popular.

A filosofia do Programa Médico de Família permite várias possibilidades de contato com a população, sendo permeável a diversas realidades. Embora o resultado mais imediato seja a melhoria nas condições de saúde da população, o que o programa busca alcançar a longo prazo é mais ambicioso: alterar a relação entre o cidadão e o Estado, promovendo o conceito de saúde como um direito de cidadania e possibilitando a inserção ativa dos indivíduos nos processos de melhoria de qualidade de vida através de sua participação na discussão das políticas públicas.
 

MORTALIDADE INFANTIL

Coeficiente de mortalidade infantil (CMI) – Município de Londrina, Zona Rural, Zona Rural sem Programa de Saúde da Família, Zona Rural com Programa de Saúde da Família,

1994 e 1995

Fonte: Departamento de Informações em Saúde/ASMS/Prefeitura de Londrina
 


* Publicado originalmente como DICAS nº 68 em 1996