Os índices de qualidade de vida são importantes no processo de avaliação da gestão municipal e também nas negociações com outros níveis de governo e órgãos de financiamento.Autor: José Carlos Vaz
Consultor: Núcleo de Gestão Municipal do Instituto Pólis

Os índices de qualidade de vida são importantes no processo de avaliação da gestão municipal e também nas negociações com outros níveis de governo e órgãos de financiamento.Autor: José Carlos Vaz
Consultor: Núcleo de Gestão Municipal do Instituto Pólis

Um dos principais critérios de avaliação do desempenho de uma gestão municipal é a sua capacidade de promover a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. É difícil, no entanto, detectar quanto a mudança na qualidade de vida é resultado das ações do governo municipal, das ações de outros atores sociais (governos estaduais e federal, ONGs, associações filantrópicas, etc.) ou até mesmo do desempenho da atividade econômica.

Mesmo assim, é possível identificar alguns campos nos quais o governo municipal tem condições e atribuição legal para intervir. É o caso do transporte coletivo, da alfabetização de adultos, do saneamento básico, das políticas de proteção à infância, da coleta e destinação de resíduos sólidos, dos serviços de pré-escola, entre outros.

Para ser possível uma avaliação dos resultados atingidos pela gestão, são necessárias informações quantitativas, que expressem em números os resultados das ações do governo municipal ou forneçam uma referência. Essas informações podem ser coletadas e apresentadas sob a forma de indicadores ou índices. São números que procuram descrever um aspecto determinado da realidade ou apresentam uma relação entre vários aspectos.

Além do acompanhamento de indicadores setoriais de desempenho – como os índices de cobertura de serviços públicos a cargo do município – ou indicadores de resultados de ações do governo municipal – como o índice de mortalidade infantil -, é possível construir índices agregados capazes de medir o impacto das políticas implantadas sobre a qualidade de vida dos cidadãos. Comparando-se esses índices com os de outros municípios e com sua posição em períodos passados, obtém-se um importante elemento de avaliação da gestão.

NA PRÁTICA

Na pesquisa "Evolução Comparada da Qualidade de Vida nos Municípios Brasileiros – O Melhor Desempenho de uma Prefeitura", realizada recentemente pelo Núcleo de GestãMunicipal do Instituto Pólis, desenvolveu-se uma aplicação do conceito de indicadores de desempenho de gestão municipal em relação à qualidade de vida dos cidadãos.

Para os 49 municípios mais populosos do Estado de S. Paulo, acrescidos de sete municípios de outros estados, foi construído um índice de qualidade de vida, o ISM (Índice Social Municipal). Este índice considera diversos elementos da qualidade de vida, não necessariamente a cargo dos governos municipais. Foram utilizadas informações do Censo do IBGE, de 1991, e da Fundação SEADE, do mesmo ano.

ÍNDICE DE GESTÃO MUNICIPAL – IGM
Para identificar e comparar o impacto das ações do governo municipal sobre a qualidade de vida, os pesquisadores desenvolveram um novo índice, levando em consideração apenas as atribuições claramente definidas como de responsabilidade do município: coleta de lixo (na área de saneamento ambiental) e, no setor de educação, a cobertura oferecida pela rede própria no ensino pré-escolar. Foi incluído, também, o índice de mortalidade infantil que, apesar de não ser determinado apenas por ações municipais, tem sua redução baseada em políticas realizadas ou articuladas pelos governos locais (saúde, abastecimento, saneamento, educação, combate à desnutrição). A ponderação dos três indicadores, constituiu o Índice de Gestão Municipal, que fornece um "retrato" da atuação do governo municipal na qualidade de vida. Se o Índice de Gestão Municipal é menor que o Índice Social Municipal daquele Município, isto significa que as ações da prefeitura estão contribuindo pouco para o nível de qualidade de vida, no que diz respeito aos três indicadores considerados.

Vários outros indicadores poderiam ser incluídos, mas isto esbarraria na dificuldade de obter informações para todos os municípios, principalmente porque nem todos assumem as mesmas tarefas. Não há obstáculos para este índice ter seu poder de descrição da realidade aumentado, acrescentando-se outros indicadores em sua composição (cobertura de coleta de esgotos ou oferta de vagas no ensino de 1º grau, por exemplo), desde que haja informações disponíveis. De qualquer forma, os três indicadores referem-se a responsabilidades claramente definidas como sendo de competência do município e nenhum índice semelhante desprezaria estas informações.

AVALIAÇÃO DA EFICÁCIA
O Índice de Gestão Municipal foi comparado, pelos pesquisadores do Instituto Pólis, com o Índice Social Municipal (um indicador geral da qualidade de vida). O resultado dessa comparação é o Índice de Eficácia Municipal, que reflete o quanto as ações sob responsabilidade municipal interferem no nível de qualidade de vida do município. Um índice de Eficácia Municipal elevado significa que as ações do governo municipal influem positivamente na qualidade de vida. Trata-se, portanto, de um indicador que mede a eficácia do governo: quanto ele consegue atingir seu objetivo de melhorar a qualidade de vida dos cidadãos.

AVALIAÇÃO DA EFICIÊNCIA
A pesquisa construiu, também, o Índice de Eficiência Municipal, para retratar a eficiência no uso dos recursos disponíveis, tendo como pano de fundo a promoção da melhoria da qualidade de vida.

Comparando-se o Índice de Gestão Municipal com o Índice de Receita Municipal (que mede a posição relativa no ranking de municípios em termos de receita municipal total per capita), obtém-se um indicador de quanto o município consegue fazer com os recursos que arrecada. Ou seja, pode-se saber, comparativamente, se o município usa os recursos mais ou menos eficientemente que a média dos governos estudados. Em outras palavras, o índice permite comparar o "custo" da melhoria de qualidade de vida entre vários municípios. Quanto maior for a relação entre o Índice de Gestão e o Índice de Receita Municipal, maior é a capacidade do governo municipal de promover a qualidade de vida, com um mesmo volume de recursos.

Este indicador permite conhecer o nível de alavancagem operacional do governo municipal. Ou seja, quanto um aumento dos recursos disponíveis pode significar em termos de evolução da qualidade de vida dos cidadãos.

Deve-se levar em conta, no entanto, que a elevação dos índices de qualidade de vida (Índice Social Municipal e Índice de Gestão Municipal) tende a ser mais custosa em municípios que os apresentem em um patamar elevado. Esses municípios, portanto, tendem a possuir uma menor alavancagem operacional, uma vez que grande parte dos problemas mais fáceis já foram resolvidos.

AVANÇANDO
O emprego da metodologia de indicadores não pode substituir as demais formas de avaliação do desempenho da gestão. Deve ser complementada por outros métodos (pesquisa de opinião, avaliações técnicas e políticas, discussões com a população) permitindo análises mais detalhadas de variáveis sociais e políticas. Deve-se levar em conta que o governo municipal pode melhorar a qualidade de vida dos cidadãos não só oferecendo serviços ou realizando obras. Através de negociações políticas com outros níveis de governo e de articulações com os vários setores da sociedade, é possível promover mudanças positivas no município.

O Instituto Pólis está ampliando os trabalhos de avaliação de gestão, acrescentando novos municípios à base de dados comparativos já existente e realizando estudos específicos para os municípios que manifestem interesse. Também é importante observar que a qualidade de vida tende a se expressar em caráter acumulativo, o que torna mais importantes avaliações que comparem a posição de um município em momentos distintos (ao longo de uma gestão, por exemplo).

EXEMPLO
Como exemplo das análises que esta metodologia permite, foram escolhidos municípios de São José do Rio Preto-SP (283 mil hab.) e Florianópolis-SC (255 mil hab.), com dados de 1991. São municípios de porte semelhante, ainda que cada um tenha suas especificidades.

São José do Rio Preto apresenta um Índice de Gestão Municipal (IGM) igual a 0,798 que, uma vez comparado ao Índice Social Municipal (ISM) de valor 0,755, indica que o município consegue intervir positivamente na qualidade de vida. Seu Índice de Eficácia Municipal atinge um valor da ordem de 2,5.

Quando analisado do ponto de vista da eficiência, o município de São José do Rio Preto, apresenta um resultado superior ao da maioria dos municípios estudados, com um Índice de Eficiência que alcança 44,9, explicado pela posição elevada em termos de IGM (0,798), apesar de sua posição inferior em termos de Índice de Receita Municipal (0,241), determinada por uma receita municipal per capita total de US$ 148/ano.

Florianópolis consegue se responsabilizar menos pela qualidade de vida. Seu IGM (0,629), é inferior ao ISM (0,708). Do ponto de vista da eficiência, entretanto, os resultados de Florianópolis são bastante positivos. Com uma receita per capita de US$ 198/ano, o município tem seu Índice de Receita Municipal igual a 0,378. Isto significa um Índice de Eficiência Municipal igual a 18,2. Apesar de dispor de uma posição menos privilegiada no ranking de municípios com base no critério receita municipal per capita, consegue produzir um IGM que, ainda que menor que o ISM, é expressivo.
Utilizando-se de informações como estas, tanto Florianópolis quanto São José do Rio Preto podem aumentar seu poder de barganha em negociações com outros níveis de governo, com órgãos de financiamento e também em processos de discussão de projetos com a sociedade e o legislativo local.

indicadores_municipais

 


* Publicado originalmente como DICAS nº 37 em 1995.Dicas é um boletim voltado para dirigentes municipais (prefeitos, secretários, vereadores) e lideranças sociais. Atualmente, seu acervo está publicado no site do Instituto Pólis.

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