NOTA DE CONJUNTURA

Grupo de Conjuntura Fundação Perseu Abramo
13 de julho de 2015

Conjuntura Internacional

A realização do Cúpula dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul) em Ufa, Rússia, foi um dos destaques internacionais no período considerado. Os Brics são já um ator relevante na reconfiguração do poder mundial. O encontro serviu para consolidar iniciativas em curso, como o lançamento do recém criado Banco de Desenvolvimento, e abrir novos temas, tais como a facilitação do comércio entre seus membros.

Por um lado a articulação dos Brics é uma iniciativa que questiona a atual ordem mundial. Expressa o desconforto de seus membros, por exemplo, com a atual estrutura e funcionamento do FMI, instituição que responde à anterior conjuntura mundial do pós Segunda Guerra Mundial, pelo qual esses cinco países têm menos peso nas suas instâncias do que sua importância atual na economia internacional indica deveria ser. Mas, pelo outro, os Brics não buscam uma ruptura total com essa ordem, assim, suas instituições mantém interfaces de cooperação com o mesmo FMI.

Entre as decisões políticas importantes adotadas esteve o respaldo aos três integrantes do IBAS (Índia, Brasil, África do Sul) em sua demanda por maior papel nos organismos internacionais, o que se subentende inclui o Conselho de Segurança da ONU, onde os outros dois membros dos Brics (Rússia e China) têm assento permanente. O tema, no entanto, é de difícil equacionamento porque junto com o Brasil busca ingressar a esse espaço o Japão, o que desperta resistências na China, por exemplo.

A identificação da necessidade da reestruturação das dívidas soberanas dos Estados foi outro dos temas em destaque. E o reconhecimento de diversos fóruns não governamentais – de parlamentários, de empresários, do movimento sindical, de organismos de pesquisa, etc – que compõem um conjunto de instâncias complementares fundamentais para dar profundidade e capilaridade às discussões e decisões que tomam os governos. O próximo encontro dos Brics será na Índia em 2016.

A Grécia esteve no período em destaque pelo rumo das negociações com a União Europeia (UE) para um novo acordo sobre a crise econômica que atravessa o país. No referendum convocado pelo governo 61% dos eleitores disseram “não” à proposta da UE. A partir desse resultado, no entanto, o governo do primeiro ministro A. Tsipras buscou melhorar as condições da negociação, contrariando expectativas de setores à esquerda e à direita de uma ruptura e saída da zona do Euro.

O acordo “possível” no entanto não significou a conquista do esperado – seja com a vitória do Syriza nas eleições passadas ou do “não” no referendum – mas tão somente melhores condições para enfrentar o duro ajuste que as “instituições” da UE impõem para o “resgate” grego. Isto é, mais recursos para intentar relançar a recuperação econômica, com novos apoios para investimentos de diversos fundos europeus, ao tempo que o governo se compromete com mais ajuste fiscal recessivo (aumento de impostos ao consumo, cortes de pensões, etc) e com um amplo programa de privatizações (de 50 bilhões de euros) de portos, sistema elétrico, etc. O acordo impõe severos mecanismos de monitoramento do cumprimento do acordado, o que significa perda de soberania do Estado grego, mas o controle dos recursos obtidos com as vendas de ativos públicos ficará com uma instituição grega (antes esses recursos seriam administrados por uma instituição no Luxemburgo). O acordo não reestrutura a dívida pública grega, mas se melhoram condições para seu pagamento (mas ao que tudo indica continua em níveis impagáveis).O texto agora está para sua aprovação pelos parlamentos da Grécia e dos países membro da zona do Euro

Ganhou destaque no noticiário a informação do “estouro de uma bolha” no mercado de ações na China que poderia ser o prenuncio de uma crise na sua economia. No entanto, analistas assinalam que a bolsa de valores reflete uma parte muito pequena da economia chinesa (entre 10% e 15%) e que os problemas verificados não têm o peso que teriam em um país capitalista ocidental. Expressariam sim as contradições entre o Estado – as grandes empresas públicas, que definem os rumos do investimento – e o mercado de capitais privados em expansão, que atualmente correspondem a 49% e 51% da economia chinesa, respectivamente.

Conjuntura Nacional

Pesquisa do Ibope publicada recentemente mostra um apoio ao governo da presidenta Dilma Rousseff de apenas 9% do eleitorado, em patamares similares a uma medição antecedente do instituto Datafolha (10%). Na comparação com séries históricas de anteriores governos, verificamos que a seis meses de iniciado o mandato, nenhum outro desde a redemocratização do país, esteve em situação negativa similar. Importante assinalar que setores tradicionalmente fieis ao PT e seus governos, os segmentos sociais de até dois salários mínimos e eleitores do Norte/Nordeste estariam entre os que se verificaram as maiores quedas nos níveis de apoio.

Nesse contexto de enfraquecimento do governo na opinião pública vem acontecendo dois movimentos opostos. Pelo lado conservador, articulações buscando visualizar e viabilizar caminhos para o impedimento da presidenta. Pelo lado progressista, uma série de iniciativas de recuperar as ruas e mobilizações em defesa de uma pauta de direitos sociais, soberania nacional e em defesa da democracia contra o golpismo. Ambos os polos no entanto não amadureceram totalmente suas respectivas estratégias.

A direita discute publicamente sua intenção de destituir a presidenta. Mas parece dividida entre o “impedimento” da presidenta ou a “agonia” de seu mandato, segundo a qual candidato à sucessão esteja vinculado o proponente. Na fila encontram-se: o vice-presidente Michel Temer (que nega em público a pretensão, mas o “PMDB oposicionista” trabalha nesse sentido), o candidato derrotado Aécio Neves (interessado na convocação já de novas eleições), o governador paulista Geraldo Alckmin e o senador José Serra (que só teriam chances de ser o candidato em 2018). Haveria ainda uma hipótese “parlamentarista” atribuída ao presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, nos moldes do golpe aplicado pela direita ao governo João Goulart, em 1961.

Agosto deve concentrar todas essas energias negativas, o que na tradição política brasileira tem fortes reminiscências. Nesse mês o TCU deve julgar as contas de 2014 do primeiro governo da presidenta Dilma, com grandes chances de rejeição e de seu tratamento ser encaminhado no Congresso com forte pressão para que sua rejeição parlamentar derive no processo de impeachment. Deve ter sequência o processo no TSE sobre as contas da campanha eleitoral do PT em 2014, com intenção de criminalizar as doações empresariais recebidas, tentativa do PSDB de cassar o mandato da presidenta e seu vice e provocar novas eleições. Estrategicamente agendada, em 16 de agosto está convocada uma nova manifestação de rua da direita para exigir o impedimento da presidenta e atacar o PT. Por último, o clima político deve ficar ainda mais pesado porque como último mês do atual mandato do procurador geral da República Rodrigo Janot, especulasse que ele vai apresentar denúncia, no marco da Operação Lava Jato, contra os presidentes do Senado e da Câmara, ambos do PMDB, que por sua vez consideram que isso deve-se à omissão do governo federal que não buscou parar as investigações e ameaçam com retaliações contra a presidenta. Mas de se confirmar, seriam dois investigados por corrupção os que comandariam o processo de julgamento político da presidenta.

Pelo lado dos movimentos sociais e os partidos de esquerda e progressistas têm acontecido mobilizações importantes e outras estão agendadas, tendo ao governo federal como aliado nas principais reivindicações. A juventude esteve presente na luta contra a redução da maioridade penal. Os petroleiros e uma ampla frente iniciam mobilizações para barrar o projeto de senador José Serra que retira prerrogativas da Petrobras na exploração do petróleo do pré-sal. Um conjunto de forças políticas e sociais estão conformando uma frente e convocando mobilizações em defesa da democracia – contra o golpismo. Cada uma dessas iniciativas tem feições próprias e comandos diferenciados. Algumas análises apontam para a necessidade de uma maior coordenação e que a ausência de um “comando geral” não permite potencializá-las. Outras análises discutem qual a linha de defesa do governo contra as tentativas de golpe, já que grande parte do descontentamento é pela recessão e esta se deve, em boa medida, ao ajuste impulsionado pelo Ministério da Fazenda; ou seja, seria difícil desativar o descontentamento registrado nas pesquisas de opinião e aproveitado pelos golpistas de forma oportunista, se não há novos sinais e de signo positivo nesse terreno.