Grupo de Conjuntura Fundação Perseu Abramo
23 de março de 2015

A discussão sobre os rumos do PT está no centro da conjuntura.O Partido é o principal alvo dos ataques das oposições unificadas nos atos do dia 15, ao lado do ex-presidente Lula e da presidenta Dilma.

As esquerdas no Brasil encontram-se em uma conjuntura caracterizada em algumas análises como “defensiva”, com a conformação de um grande – o maior desde 2003 – bloco conservador/reacionário de oposição ao projeto progressista liderado pelo PT.

Há uma hegemonia profissional da mídia conservadora. Com exceção talvez da MP do futebol, todas as outras medidas tomadas pelo governo têm chegado à opinião pública como iniciativas ruins ou contraditórias. Toda notícia que atinge o PT ou o governo federal tem ampla repercussão negativa. Aquelas que mostram setores conservadores e opositores vinculados à corrupção são amenizadas (como nos escândalos do HSBC, Metrô de S.Paulo, Furnas, etc.).  Essas são algumas das contradições que a direita tem com sua pauta prioritária – porém, o PT e seus aliados têm tido pouca efetividade para esclarecer a opinião pública.

Como o PT deve tratar a corrupção continua a ser um dos principais desafios do Partido.

Em algumas análises se aponta que a tentativa de “dialogar” com as manifestações do dia 15 de março e assemelhadas, como se estas possuíssem uma pauta legítima (“contra a corrupção”), estão equivocadas. O governo e o Partido deveriam claramente assinalar que fazem parte de uma estratégia golpista (daí que conhecidos corruptos da oposição participem sem maior constrangimento dessas atividades).

A manifestação de setores democrático-populares do dia 13 de março foi importante para mostrar que as forças de sustentação do projeto progressista não estão abatidas. Ao contrário, estão dispostas à batalha (na metáfora utilizada, são como “soldados vietnamitas”). Porém, como o governo e o Partido podem alimentar seu entusiasmo se as medidas econômicas governamentais dividem sua base social?  É necessária uma reorientação das prioridades da política econômica.

Está entrando em pauta uma agenda de lutas sociais importante (1). No Congresso Nacional, os setores conservadores querem votar a lei que libera as terceirizações que, se aprovada, desestrututaria completamente o mercado de trabalho. É um momento em que interesses e direitos concretos dos trabalhadores se chocam de forma antagônica com as iniciativas dos setores conservadores e golpistas.

É o momento para mostrar o caráter anti-povo da proposta de golpe contra o governo Dilma. Mas à  agenda de unidade na resistência a este golpe é preciso agregar uma “agenda positiva” (por exemplo, em relação a temas do sistema nacional de emprego, jornada de trabalho, fim do fator previdenciário etc).

A manifestação do dia 13 e outras iniciativas permitira reagrupar os setores populares – que estiveram unificados no segundo turno. Mas continua como questão pendente como chegar até os setores não organizados do povo, que estão submetidos à forte pressão midiática conservadora.

No entanto, o cenário econômico nacional não está para otimismos. Análises trabalham com três cenários. O menos provável é que o ajuste ora em curso dê certo e que o crescimento volte ao final do ano ou 2016. O segundo cenário, mais provável, é que o ajuste não tenha os efeitos esperados e que as dificuldades continuem e não aconteça uma recuperação do crescimento, permanecendo os níveis de estagnação. O terceiro cenário, que não deve se descartar, é que os impactos negativos sobre a atividade econômica decorrentes dos problemas com a Petrobrás e a crise da gestão hídrica se somem aos problemas não resolvidos no segundo cenário, e o  país mergulhe em uma recessão severa.  Daí a importância da elaboração de propostas alternativas para a política econômica do governo federal.

Pesquisa FPA – Perfil dos Manifestantes de Março

Foram apresentados os dados principais da pesquisa de perfil político e social dos manifestantes do dia 13 de março e do dia 15 de março (2).

Razões das mobilizações. Dia 13: Defesa do governo, Democracia e Petrobrás (86%). Dia 15: Contra a corrupção e o governo, pelo impeachment (88%).

Forma como foi convocado para participar da manifestação. Dia 13: organizações sociais e políticas às quais pertence (29%) e redes sociais (23%). Dia 15: redes sociais (75%).

Percepção de mudança no país nos últimos dez anos. Dia 13: está melhor (76%). Dia 15: está pior (77%). Percepção de mudança na sua vida pessoal nos últimos dez anos. Dia 13: está melhor (80%). Dia 15: está pior (45%) e está melhor (29%).

Autoposicionamento no espectro esquerda-direita. Dia 13: esquerda ampliada (71%). Dia 15: direita ampliada (42%) e centro ( 36%).

Opinião sobre em qual governo houve mais corrupção. Dia 13:  FHC (40%). Dia 15: Lula (47%).

Em quem votou no segundo turno. Dia 13: Dilma (82%). Dia 15: Aécio (83%).

Preferência partidária. Dia 13: PT (56%) e PSOL (10%). Dia 15: nenhum (43%) e PSDB (32%).

Elementos da conjuntura internacional

O resultado eleitoral em Israel, onde saiu fortalecido o primeiro ministro direitista, vai aguçar as contradições e conflitos no Oriente Médio. E essa região vem sendo o principal foco de desestabilização da ordem mundial.

A aproximação de países europeus à iniciativa do Banco Asiático de Infraestrutura liderado pela China é uma rachadura importante na hegemonia norte-americana, da qual os europeus vinham sendo meros caudatários. Pode significar que os esforços do governo dos EUA por restringir os espaços para a emergência geo-econômica chinesa estejam sendo inúteis.

A análise da CEPAL sobre gasto público e desigualdade mostra que houve uma expansão do gasto em políticas sociais na América Latina desde os anos 1990 até 2012. Brasil é hoje o terceiro que mais gasta (depois da Argentina e Uruguai). Mas ao se fazer uma comparação com os países europeus da OCDE,  diferentemente desses,  na nossa região a distribuição do ingresso não melhora depois dos impostos e dos gastos públicos. Isso demonstra que os sistemas tributários são parte dos mecanismos de concentração de renda em nossos países (proporcionalmente pagam mais os que ganham menos). E que, portanto, existe muito espaço para aumentar a progressividade dos tributos e do gasto social.

(1) Na reunião foi informada a agenda de mobilizações  e iniciativas já definida: 30 de março, debate de uma plataforma alternativa para crescimento; 1º de abril, atos em todas as cidades, contra o golpismo; 7 de abril,  mobilização no país inteiro, contra a terceirização; 1º de maio, grandes mobilizações pelo Dia Internacional dos Trabalhadores.