O seminário: “Política de Defesa e Projeto Nacional de Desenvolvimento”, reuniu no dia 4/6, em Brasília, ministros de Estado, representantes de partidos políticos, parlamentares, oficiais da ativa da Aeronáutica, do Exército e da Marinha, e estudiosos do tema.  O evento foi realizado pelas fundações Perseu Abramo (PT), Maurício Grabois (PCdoB), João Mangabeira (PSB), e Leonel Brizola-Humberto Pasqualini (PDT).

Para tratar do tema dos projetos estratégicos de defesa, as fundações partidárias convidaram especialistas para falar sobre os projetos aeroespacial e nuclear e de defesa cibernética. Sobre os projetos aeroespaciais, falaram o ministro da Ciência e Tecnologia Antonio Raupp e o vice-presidente do PSB e ex-ministro da Ciência e Tecnologia Roberto Amaral; sobre o projeto nuclear, participaram da mesa de debates o presidente da Eletronuclear Othon Luiz Pinheiro da Silva e o físico e especialista em energia nuclear e diretor de Tecnologia da FAPERJ Rex Nazaré; e sobre defesa cibernética, falaram o general de Divisão e comandante do Centro de Defesa Cibernética/CDCiber José Carlos dos Santos, e o pesquisador do IPEA e especialista em Cibernética Samuel César da Cruz Junior.

Projeto nuclear brasileiro

O presidente da Eletronuclear Othon Luiz Pinheiro da Silva enfatizou que uma estratégia nacional de defesa transcende as Forças Armadas. Ele também enfatizou que no espírito da dissuasão, ou seja, na política adotada pelo governo brasileiro de inibir ameaças, é necessário desenvolver a capacidade de monitoramento e de inibição da concentração de forças no entorno do país. Ele citou o exemplo da última guerra do Iraque, que estava sendo atacado por três frentes diferentes. Nesse sentido, segundo ele, a construção do submarino nuclear e o fortalecimento da indústria de defesa brasileira passa a ter um grau de importância muito grande. “Ninguém vem nos ameaçar se tivermos um submarino”, afirmou Pinheiro da Silva.

Ele também enfatizou que só com a reestruturação da estratégia de defesa nacional pelo Brasil está sendo possível dinamizar a área, com investimento em projetos de longo prazo como o do submarino nuclear. “Se continuássemos como estávamos, nunca teríamos uma indústria de defesa. Ela é essencial sob o ponto de vista econômico e do desenvolvimento”, disse Pinheiro da Silva, que também falou sobre a necessidade de o país investir na capacidade de inovar, de desenvolver e de projetar seus próprios sistemas.

Para Pinheiro da Silva, para que um país tenha defesa, é preciso que ele tenha melhorado as condições de vida de seus habitantes e esses habitantes gostem do seu país. Segundo ele, um dos passos mais importantes é incorporar a importância da defesa e que isso pressupõe não ter dúvida sobre a sua necessidade.

O físico e especialista em energia nuclear e diretor de Tecnologia da FAPERJ Rex Nazaré alertou para o fato de serem inseparáveis a estratégia nacional de defesa e a política de desenvolvimento. Para ele, num país que pouco lidou com guerras, torna-se difícil tratar de se defender. Segundo ele, se o padrão de vida atual se mantiver e continuar crescendo no mundo, com consumo extensivo de recursos naturais, será preciso considerar todas as saídas. Um dos problemas citado por Nazaré é a perspectiva do aumento do consumo per capita na China e na Índia. Além de ter reservas de combustíveis, vai ser necessário também dominar a tecnologia e contar com investimentos duradouros para a área de defesa. E o Brasil, segundo Nazaré, tem todas as fontes de energia, mas o mundo vai ter problemas resolver todas as necessidades de 9,2 bilhões de habitantes (projetados para 2050): abastecimento de água, de energia, de alimentos, preservação do meio ambiente, o combate à pobreza, a vida nas metrópoles etc.

Pra fazer frente a tudo isso, segundo Nazaré, além de manter projetos estratégicos de defesa, o país deve continuar a prospecção de uranio e completar a primeira fase da planta de enriquecimento de urânio. E também precisará investir em recursos humanos.

Programa espacial brasileiro

Para o ministro da Ciência e Tecnologia Marco Antonio Raupp, defesa deixou de ser um tema somente da área militar e passou a ser assunto geral da sociedade, que também passa a ter responsabilidades nessa questão. Hoje os satélites tem finalidade estratégico e também cumprem finalidade social.

O programa espacial brasileiro, segundo Raupp, era para “inglês ver”, ou seja, existia somente para demonstrar para o mundo que era um programa civil, do qual não se deveriam tirar ilações. Hoje, a situação é outra segunndo o ministro: recursos destinados à área cresceram consideravelmente a partir de 2004, depois de anos de altos e baixos em matéria de investimento; convênios internacionais foram firmados; investimentos foram direcionados para o INPE etc.

Um dos maiores problemas apontados por Raupp na área da defesa é a falta de continuidade na área de recursos humanos. Não há formação de novos cientistas para dar continuidade aos projetos. Também foi apontada a necessidade de o país ter uma política clara e muito bem definida em relação ao seu projeto para a região. Os investimentos, segundo ele, precisam crescer. De 2012 a 2013, o governo brasileiro deve fazer os investimentos no programa espacial chegarem a 1 bilhão de reais.

Para impulsionar o setor, Raupp disse que é necessária articulação interna dentro do próprio governo porque um mesmo satélite possa atender a diversas áreas como a meteorologia, as Forças Armadas, a agricultura, a prevenção de desastres naturais, as mudanças climáticas etc.

Raupp finalizou enfatizando que o Brasil não pode abrir mão da capacitação tecnológica e que ele deve participar da gestão e ter capacidade de absorver tecnologia.

O vice-presidente do PSB e ex-ministro da Ciência e Tecnologia Roberto Amaral enfatizou a necessidade de elevar consideravelmente os investimentos na área espacial. Segundo ele, o Brasil precisa melhorar sua posição entre os países que foram os BRICS.

Outro problema do programa espacial apontado por Amaral é o de investimento na formação de técnicos. Segundo ele, as equipes do programa estariam se aposentando e não tem a quem repassar o conhecimento acumulado em 30, 40 anos.
 

Defesa Cibernética

O general de Divisão e comandante do Centro de Defesa Cibernética (CDCiber) José Carlos dos Santos falando sobre os ataques cibernéticos que estariam neutralizando os sistemas de defesa em alguns países. Segundo Santos, a Estratégia Nacional de Defesa foi um marco, porque coloca a defesa na pauta da sociedade. Num mundo cada vez mais dependente de redes e em que todas agencias se interligam. O essencial na defesa é a integração de todos os esforços, seja na área cibernética, seja na de defesa terrestre, na de troca de sistemas de comunicação, as ações de patrulhamento das riquezas etc. Se não houver um espaço de cooperação, não adianta o ministério da defesa fazer sua parte.

O comando afirmou que o Centro de Defesa Cibernética tem um orçamento de 84 milhões, e está trabalhando na área de segurança de grandes eventos como a Rio +20, a Copa do Mundo, em 2014 e as Olimpíadas, em 2016.

É imprescindível, segundo Santos, que o Brasil se credencie na área de ciência e tecnologia, induzindo a indústria nacional a produzir sistemas inovadores e a fomentar a indústria nacional de defesa.

O pesquisador do IPEA e especialista em Cibernética Samuel César da Cruz Junior alertou para a importância do incentivo à pesquisa e à continuidade dos investimentos. “Mais que recursos, é importante a continuidade desses recursos”, disse o pesquisador, para quem a interrupção de uma pesquisa por suspensão de recursos em um determinado momento pode ser fatal para sua finalização. O sistema de defesa na área cibernética não deve se restringir a evitar ataques por vírus, mas sim focar na conjuntura mundial, nos investimentos, na capacitação, e na cooperação que deve envolver o Estado, a sociedade civil, a academia, os militares. “O Brasil hoje é um foco, é um alvo mundial", finalizou o pesquisador.
 

O debate

No debate realizado logo após a apresentação dos palestrantes, o deputado federal Carlos Zaratini (PT/SP), que integra a Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados, falou sobre a Frente Parlamentar de Defesa que tem desempenhado papel importante na aprovação de projetos relativos à  Estratégia de Defesa Nacional. Para Zaratini, duas questões centrais no debate estão sendo incluídos nessa estratégia: a capacidade dissuasória do Brasil, se colocando na condição de resposta e de projetar o seu poder militar, e o desenvolvimento de tecnologias que extrapolem o uso militar.

Duas medidas já foram tomadas para impulsionar a área de defesa: a criação da Empresa Estratégica de Defesa, de capital nacional, para desenvolvimento de tecnologia, e a criação da  AMAZUL, empresa criada para garantir que os recursos humanos que  estão trabalhando e sendo treinados, não sejam perdidos.

Outra questão importante na visão de Zaratini é a necessidade de garantir que os recursos para a defesa estejam no Orçamento da União para garantir a continuidade dos projetos.  Duas fontes importantes de recursos foram citadas por ele: os royalties do petróleo, cujo Fundo Social do Petróleo não prevê a possibilidade de aplicação de recursos na área de defesa, e a inclusão dos projetos de defesa nos PAC 1 e 2.

O professor Manuel Domingos Neto, da Universidade Federal Fluminense, enfatizou que três ideias permearam os debates e que são as mais relevantes: a Defesa transcende a corporação e o escopo militar; a necessidade de integrar esforços; e a participação da Universidade. Para Domingos Neto, uma das maiores dificuldades é a superação do estigma para se estudar Defesa nas universidades. Além da grande resistência por parte da própria academia, não existe financiamento para pesquisar sobre as Forças Armadas e política de Defesa.

Ronaldo Carmona, da Comissão Internacional do PCdoB, enfatizou que o seminário que as quatro fundações partidárias de esquerda realizavam com a presença de comandantes das forças armadas, com oficiais da ativa e representantes da sociedade, era um dos momentos mais importantes na direção de uma tomada de consciência sobre as vulnerabilidades que cercam o país e a necessidade de defesa.  Para Carmona,  o Brasil só conseguiu se emancipar em seu processo civilizatório a partir do momento em que conseguiu ter um grau de unidade de uma maioria política, intelectual e social, que conseguisse fazer com que o país lograsse dar  conta de grandes objetivos nacionais. 

A crescente consciência de que o país tem um futuro, exige, segundo Carmona, que o Brasil consiga desenvolver seus próprios projetos na área de defesa e mobilizar recursos materiais e recursos humanos em torno dos grandes objetivos do Brasil. E o Congresso Nacional  tem papel importante para garantir que não haja  interrupção de fornecimento de recursos para a área da Defesa. Para Carmona, os atores sociais  passam a ter consciência e a agir para superar a baixa estatura estratégica e de capacidade de defender nossa soberania. “É possível coesionar  a sociedade brasileira, nossa intelectualidade, nossos cientistas em torno desse tema”, concluiu.

 

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Atualizado em 9/6/2012, às 15:22