Com o uso de geoprocessamento, dirigentes e técnicos da prefeitura passam a dispor de mais informações sobre o município, melhorando o tempo e a qualidade da tomada de decisões.Autor: José Carlos Vaz
Consultores: Victor Petrucci e Raquel Rolnik

Com o uso de geoprocessamento, dirigentes e técnicos da prefeitura passam a dispor de mais informações sobre o município, melhorando o tempo e a qualidade da tomada de decisões.Autor: José Carlos Vaz
Consultores: Victor Petrucci e Raquel Rolnik

O desenvolvimento da tecnologia da informação tornou disponíveis novos recursos para processamento de informações cartográficas, a um custo acessível para a grande parte dos municípios. Torna-se mais dispor de informações físico-territoriais, inclusive aquelas componentes do cadastro técnico municipal. Ao mesmo tempo, é possível desenvolver novos usos da informação até hoje muito pouco exploradas pelas prefeituras brasileiras.

O QUE É

O geoprocessamento é o processamento informatizado de dados georeferenciados. Utiliza programas de computador que permitem o uso de informações cartográficas (mapas e plantas) e informações a que se possa associar coordenadas desses mapas ou plantas. Por exemplo, permitem que o computador utilize uma planta da cidade identificando as características de cada imóvel, ou onde moram as crianças de uma determinada escola.

POSSIBILIDADES DE ATUAÇÃO
As possibilidades de utilização do geoprocessamento pelas prefeituras abrangem várias áreas. Qualquer setor que trabalhe com informações que possam ser relacionadas a pontos específicos do território pode, em princípio, valer-se de ferramentas de geoprocessamento. As principais aplicações são:

a) Ordenamento e gestão do território (este é o uso mais difundido): na verdade, é uma aplicação básica, porque permite a constituição de uma base cartográfica geoprocessada que servirá às demais aplicações setoriais. Trata-se de construir uma base de dados informatizada que reproduza a configuração do território do município, identificando logradouros, lotes e glebas, edificações, redes de infra-estrutura, propriedades rurais, estradas e acidentes geográficos. A base assim constituída é útil para as atividades de planejamento urbano e ordenação do uso do solo, inclusive para processos de revisão da legislação.

b) Otimização de arrecadação: a atualização da base cartográfica do município para a implantação da base geoprocessada fornece um volume significativo de informações para a revisão da planta genérica de valores. O recomendável é que as duas ações sejam realizadas de forma articulada. Com isso, inclusive, consegue-se gerar um aumento de receita capaz de compensar os investimentos na base geoprocessada e gerar recursos adicionais para o município. Logicamente, será necessário proceder à atualização periódica dessas informações, mas a existência de um bom ponto de partida facilita as ações posteriores.

c) Localização de equipamentos e serviços públicos: a partir de uma base cartográfica que inclua informações sócio-econômicas e sobre equipamentos públicos é possível identificar áreas com maior nível de carência e os melhores locais para instalação de equipamentos e serviços públicos. Estas decisões podem ser tomadas com base em critérios de necessidade e de acessibilidade aos locais.

d) Identificação de público-alvo de políticas públicas:
à medida que se possua uma base de dados que incorpore dados sócio-econômicos, é possível utilizá-la para desenhar políticas públicas. dispondo-se, por exemplo, de informações sobre crianças residentes no município e a incidência de doenças, é possível desenhar ações de saúde específicas para micro-regiões da cidade. Ou, cruzando-se os dados sobre renda das famílias e desempenho escolar, pode-se identificar o público-alvo para programas de renda mínima ou bolsa-escola. Ou, ainda, identificando-se as áreas da cidade com maior concentração de idosos pode-se definir áreas prioritárias para programas de atendimento domiciliar à saúde ou áreas com carências especiais de saúde que possam ser atendidas por programas de médico de família.

e) Gestão ambiental: o geoprocessamento é útil para monitorar áreas com maior necessidade de proteção ambiental, acompanhar a evolução da poluição da água e do ar, níveis de erosão do solo, disposição irregular de resíduos e para o gerenciamento dos serviços de limpeza pública (acompanhando por área da cidade o volume de resíduos coletado e para análise de roteiros de coleta).

f) Gerenciamento do sistema de transportes: a base cartográfica é indispensável para a gestão do sistema de transportes do município. Sua informatização através de recursos de geoprocessamento pode ampliar a qualidade e a velocidade das decisões tomadas. É possível, por exemplo, realizar estudos de demanda do transporte coletivo ou de carregamento de vias, identificar pontos críticos de acidentes e vias com mais necessidade de manutenção.

g) Comunicação com os cidadãos: ao se constituir uma base de dados mais elaborada, pode-se incorporar a ela informações que permitam identificar necessidades e oportunidades de contato com os cidadãos. Pode-se, por exemplo, identificar com precisão as áreas afetadas por determinada decisão do governo e planejar ações de comunicação específicas para aquele público. Outro uso possível é registrar as solicitações dos cidadãos e analisá-las sobre a base cartográfica, permitindo uma melhor gestão das relações do governo com os cidadãos. Esta mesma aplicação pode funcionar como instrumento de controle social do governo, permitindo que entidades da sociedade civil, a ouvidoria pública municipal ou mesmo cidadãos individualmente possam ter livre acesso às informaçòes sobre que regiões da cidade estão sendo mais beneficiadas pelas ações do governo municipal.

h) Gestão da frota municipal:
com recursos de geoprocessamento é possível obter informações sobre os tipos de usos da frota municipal, conhecendo os trajetos mais comuns e sua intensidade. Estas informações possibilitarão a definição de roteiros otimizados para a frota municipal, gerando economia de tempo, combustível e uso de veículos.

IMPLANTAÇÃO

O primeiro passo para a implantação do geoprocessamento na prefeitura é a obtenção de uma base cartográfica (mapa) a ser informatizada. Para isso, o ideal é utilizar serviços de aerofotogrametria. As imagens obtidas pela fotografia aérea passam pelo processo de restituição (transformação de fotos em informações cartográficas) e são digitalizadas (transformadas em arquivo de computador). Caso não se disponha de imagens aéreas, é possível utilizar mapas existentes. Com isso pode-se ter perdas de qualidade das informações em termos de precisão e atualização. Note-se que é fundamental implantar o geoprocessamento sobre uma base cartográfica atualizada. Implantá-lo sobre uma base de má qualidade gerará a tomada de decisões incorretas ou inadequadas, ou seja, ocorrerá uma otimização do erro – a prefeitura aumentará a sua capacidade de errar. Uma vez dispondo de uma base cartográfica digitalizada, é preciso fazer o tratamento das informações, alimentando-a com dados referentes aos lotes, glebas, edificações e propriedades rurais (proprietário, utilização, dados cadastrais), estradas e logradouros (utilização, tipo de pavimento, sinalização, linhas de ônibus, volume de tráfego) e redes de infra-estrutura (dimensões e capacidade das redes, equipamentos de apoio). Este tipo de levantamento exige um trabalho de obtenção de informações atualizadas (por isso o recurso à aerofotogrametria é valioso), inclusive contando com levantamentos complementares in loco (que pode ser feito, por exemplo, pela equipe de fiscais da prefeitura ou contratado especialmente). O resultado destas etapas é uma base cartográfica em computador que chega ao nível de lote. Caso não seja possível atingir esse nível de profundidade, pode-se construir, com recurso à base cartográfica pré-existente, pelo menos uma base com logradouros e acidentes geográficos.

Ao longo do tempo, a base deve receber ampliações, com a alimentação de outros tipos de dados georeferenciados que dêem conta do conjunto de aplicações descrito acima e de outras que podem surgir a partir da necessidade da prefeitura e da disponibilidade de informações. Assim, uma base ideal seria constituída de:

a) Base cartográfica: mapa da área urbana e rural do município;

b) Dados de caráter tributário:
planta genérica de valores, cadastro de contribuintes mobiliários e imobiliários, situação tributária dos contribuintes;

c) Dados sobre serviços públicos: equipamentos públicos, demanda por serviços públicos existentes, atendimento a solicitações de cidadãos, redes de infra-estrutura, mobiliário urbano (postes, sinalização, telefones públicos, lixeiras públicas, equipamentos de praças), endereços de usuários dos serviços públicos (chegando, no limite, mesmo ao endereço de todos os cidadãos), carregamento do sistema de transportes e das vias públicas, itinerários de linhas de transporte coletivo, itinerários de linhas de transporte escolar, rotas de coleta de lixo, arborização urbana; e

d) Dados sócio-econômicos e demográficos: dados sobre condições de vida dos cidadãos, dados epidemiológicos, ocorrência de acidentes, ocorrência de crimes.

RECURSOS

A implantação de geoprocessamento não é inacessível aos municípios. Deve ser vista não como uma despesa, mas como um investimento do município em produção de informação que gerará, por sua vez, um retorno bastante rápido em termos de receitas e de políticas públicas.

Os programas de computador para geoprocessamento podem funcionar em microcomputadores e, exceto em aplicações muito volumosas ou complexas, podem utilizar equipamentos comuns. O custo dos programas não é muito diferente do custo de outros softwares. É possível treinar pessoal da própria prefeitura para utilizá-los. Também há empresas no mercado que podem realizar projetos mais intensivos, de curta duração. O ponto mais custoso é o levantamento cadastral (aerofotogrametria e digitalização de imagens). Existem várias possibilidades de graus de resolução, escala e detalhe, com diferentes estimativas de custo. O ideal é dispor de um levantamento aerofotogramétrico para a zona urbana em escala 1:8.000 (custo de cerca de R$ 450/km2) e para a zona rural em escala 1:30.000 (R$ 100,00/km2).

A partir do vôo é possível comprar ampliações das áreas prioritárias (R$ 250 p/km2); restituir a área urbana em mapa desenhado (1:2000) e meio magnético a um custo entre R$ 4.500 e R$ 10.000/km2 (neste caso, incluindo construções, arborização, mobiliário, etc.); reconstituir a zona rural em mapa de traços 1:10.000 desenhado e meio magnético (R$ 1.100/km2); e reconstituir a zona rural em orto-foto carta (arquivo imagem) a 500 por km2. Também é possível comprar uma imagem satélite (R$ 2.500), que pode ser interpretada e ampliada até uma escala máxima de 1:50.000.

Recentemente, o BNDES lançou uma linha de financiamento destinada à ampliação da capacidade tributária de municípios que pode ser utilizada para a revisão da base cadastral.

RESULTADOS

O geoprocessamento é um investimento com alta taxa de retorno para a prefeitura. Do ponto de vista financeiro, em geral a implantação do geoprocessamento e a atualização da base cadastral a ele associada trazem aumento da arrecadação da prefeitura. Além dos benefícios financeiros, o geoprocessamento funciona como uma ferramenta de aumento da eficiência e da eficácia das ações da prefeitura. Aumenta a eficiência ao permitir decisões mais rápidas e facilitar o processamento de informaçòes. Ao elevar o acervo de informações disponíveis para o governo municipal tomar decisões, o uso do geoprocessamento aumenta a capacidade operativa da prefeitura, em termos de tempos de intervenção e em termos de qualidade das decisões. Os dirigentes e técnicos passam a dispor de mais conhecimentos sobre o município. Traz maior eficácia por permitir uma profundidade de análise que normalmente não é possível com as ferramentas tradicionais. Também permite o desenho mais adequado de políticas públicas, proporcionando melhor qualidade de gestão.

Levando o uso de informações a um patamar superior, o impacto não ocorre somente no seu uso direto. Passa a haver uma exigência maior de informações de qualidade, motivada pelas próprias aplicações que vão sendo implantadas e podem ser constantemente aperfeiçoadas.


* Publicado originalmente como DICAS nº 94 em 1997.Dicas é um boletim voltado para dirigentes municipais (prefeitos, secretários, vereadores) e lideranças sociais. Atualmente, seu acervo está publicado no site do Instituto Pólis.

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