8M: Reduzir a desigualdade
Em cerimônia realizada no Dia Internacional da Mulher, Lula anuncia pacote de medidas para fazer avançar a igualdade de gênero e o combate à violência. Lei vai multar empresas que pagam menos a mulheres com cargos iguais aos dos homens
O governo Lula anunciou uma série de medidas em 8 de março, Dia Internacional de luta das Mulheres, durante cerimônia realizada no Palácio do Planalto. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou um projeto que estabelece multas pesadas às empresas que pagam menos às mulheres que ocupem funções ou cargos iguais aos dos homens. O projeto foi enviado para análise e aprovação do Congresso.
“O Brasil voltou. Voltou para combater a discriminação, o assédio, o estupro, o feminicídio e todas as formas de violência contras as mulheres”, disse o presidente. “Mas é preciso ir além do combate à intolerável violência física. Quando aceitamos que a mulher ganhe menos que o homem no exercício da mesma função, estamos perpetuando uma violência histórica”.
Ao anunciar as medidas, Lula confirmou o retorno popular ao Salão Nobre da sede do governo federal. Militantes, bandeiras e cartazes de movimentos sociais e feministas ocuparam o lugar. A ex-presidenta Dilma Rousseff foi ovacionada e saudada pela audiência que lotou o Palácio do Planalto.
O anúncio das medidas marca retomada de iniciativas, sempre adiadas ou interrompidas, para enfrentar problemas seculares que sustentam e legitimam o machismo. Trinta medidas foram anunciadas. Entre os destaques, a construção de 40 novas unidades do programa Casa da Mulher Brasileira para atender e abrigar mulheres em situação de violência e a criação do Dia Nacional Marielle Franco para celebrar o combate à violência política e de gênero.
O governo anunciou ainda o envio para ratificação pelo Congresso das Convenções 190 e 156 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). A primeira cria instrumentos contra a violência e assédio sobre as mulheres nos locais de trabalho, e a segunda promove a igualdade de oportunidades no mercado.
As medidas envolvem um conjunto de ministérios, sinalizando que as ações de proteção e valorização das mulheres são transversais a todo o governo, mas articuladas pelo Ministério das Mulheres. O caráter multiministerial também serve como forma de superação de limites orçamentários.
O Ministério das Mulheres tem dotação de R$ 122 milhões em 2023, em grande parte obtido pela chamada PEC do Bolsa Família. O valor é inferior ao orçamento de R$ 233 milhões previstos em 2015, segundo dados do grupo de transição. Se dependesse do governo anterior, a previsão para 2023 seria de apenas R$ 23 milhões, após contínuas reduções ao longo do mandato do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Em seu discurso, a ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, destacou que está confiante nas mudanças. “O 8 de Março volta a ser comemorado com políticas públicas”, afirmou. “Jamais tive tanta esperança”, disse.
Ela celebrou o retorno dos movimentos sociais na elaboração, fiscalização e cobrança das políticas públicas. E apontou o crescimento do número de mulheres à frente dos ministérios e a chegada de mulheres ao comando dos dois maiores bancos públicos do país. Cida prometeu que seu ministério lutará contra a violência e a misoginia e contra sua expressão mais brutal, o feminicídio.
Segundo a ONU, uma mulher é assassinada a cada seis horas no Brasil. “Lutaremos por todas as mulheres que foram caçadas. Lutaremos por Marielle Franco”, disse. A irmã da vereadora carioca, assassinada há quatro anos, Anielle Franco, ministra da Igualdade Racial, ficou comovida. Ela chorou em diferentes momentos durante a cerimônia.
Em sua fala, após assinar decretos, portarias e mensagens ao Congresso, o presidente Lula demonstrou especial apreço ao projeto que institui igualdade salarial entre homens e mulheres. Lula destacou que a premissa existe na CLT desde a década de 1940, mas nunca foi colocada em prática. “Mas agora há uma palavra que faz toda a diferença: a obrigatoriedade”, disse. “Vai ter muita gente que não vai querer pagar, mas a Justiça terá os instrumentos para exigir”.
O projeto prevê que empresas que não cumprirem a igualdade salarial para cargos com formação técnica e responsabilidade iguais paguem multa de até dez vezes a maior remuneração vigente na companhia. Lula ainda afirmou que nada justifica a diferença entre gêneros no mercado de trabalho.
“Nem a ciência, a genética, a anatomia. Talvez o medo dos homens de serem superados pelas mulheres”, disse o presidente . Lula lembrou que, segundo prognóstico elaborado pela ONU, as diferenças salariais entre homens e mulheres só serão superadas em 300 anos, caso o ritmo das mudanças permaneça como está. “Por isso não podemos aceitar essas condições. É preciso mudar políticas e mentalidades. Será preciso muita luta”.
Secretária da Mulher Trabalhadora da CUT e dirigente da Internacional de Serviços Públicos (ISP), Junéia Batista, disse que a igualdade salarial entre gêneros no Brasil já tinha sido objeto de duas convenções internacionais da OIT. A de número 100, ratificada pelo país em 1957 e que trata de salário igual para trabalho de igual valor, e a 111, enviada ao Congresso pouco antes do golpe de 1964 e ratificada em 1968, que combate a discriminação de qualquer tipo no ambiente de trabalho.
Diz a sindicalista: “Por isso é necessário que haja pressão sobre os poderes para que vigore de fato a igualdade salarial entre homens e mulheres. A definição do que é trabalho de igual valor, objeto de debates ao longo dos anos, pode partir de consensos técnicos e políticos já formulados pela OIT”. •