Acordos assinados entre Lula e Xi Jinping somam mais de R$ 50 bilhões. Medidas vão facilitar o comércio entre os dois países, com ações para agricultura, passando pela cooperação industrial e a construção de satélite

Brasil e China estão reforçando seus laços comerciais, políticos e diplomáticas, numa reaproximação que tem tudo para elevar a relação entre as duas nações a um novo patamar. Na sexta-feira, 14, os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Xi Jinping selaram acordos que somam R$ 50 bilhões em investimentos. Foram subscritos 15 protocolos, memorandos e planos de ações para áreas que vão da indústria à agricultura, passando pela cooperação em tecnologia e ciência, além de intercâmbio em mídia.

A visita tem efeitos que prometem ser duradouros não somente para as relações bilaterais entre os dois países como também para o cenário internacional. A passagem de Lula por Xangai e Pequim foi coberta de simbolismos e repleta de gestos políticos importantes, reforçando um novo tempo para as duas nações, que construíram uma aliança política ainda no primeiro governo Lula quando selaram o bloco dos Brics — o grupo de nações formada por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.

Lula foi saudado pela imprensa chinesa como “um velho amigo do povo chinês”, na quinta visita do presidente ao gigante asiático. O próprio Xi Jinping disse que a reaproximação das duas nações é considerada importante pela China. “Um relacionamento China e Brasil em desenvolvimento constante, saudável e estável desempenhará papel positivo e importante par a paz, estabilidade e desenvolvimento próspero para as regiões e para o mundo”, disse.

O mandatário brasileiro também reiterou que dá muita importância ao encontro. “É com a China que a gente mantém o mais importante fluxo de comércio exterior. É com a China que nós tivemos a nossa maior balança comercial, e é junto com a China que nós temos tentado equilibrar a geopolítica mundial, discutindo os temas mais importantes”, disse Lula.

Antes de desembarcar em Pequim com a comitiva, que incluía ministros de Estado, parlamentares e 240 empresários, Lula foi a Xangai, onde participou da cerimônia de posse de Dilma Rousseff na presidência do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB, da sigla em inglês) — e visitou a sede da empresa de tecnologia Huawei.

Em Pequim, diante de Xi, Lula fez referência à ida à sede da companhia e reforçou os laços entre as duas nações. “Fizemos uma visita à Huawei numa demonstração de que nós queremos dizer ao mundo que não temos preconceito na nossa relação como os chineses e que ninguém vai proibir que o Brasil aprimore sua relação com a China”, disse.

A declaração de Lula acontece em meio ao recrudescimento das relações entre a China e os Estados Unidos e à pressão dos americanos sobre empresas chinesas de tecnologia. Em 2022, a Casa Branca proibiu a importação de equipamentos de telecomunicação produzidos por diversas empresas chinesas, entre elas a Huawei. Os EUA alegam que haveria riscos “inaceitáveis” à segurança nacional.

Entre 2019 e 2020, o governo de Donald Trump pressionou, nos bastidores, o governo Bolsonaro a não aceitar a participação da Huawei na licitação para a construção da rede no país que forneceria a tecnologia 5G, da qual a empresa chinesa é líder. A pressão acabou se diluindo e o próprio Planalto acabou desistindo da proibição diante dos prejuízos que o Brasil teria com a troca de equipamentos.

Com Lula, a pressão da Casa Branca não tem qualquer chance de surtir efeito. Até porque a opção da diplomacia brasileira, desde janeiro de 2023, é ampliar os laços com parceiros estratégicos, como a China — com quem o Brasil mantém a maior relação comercial — sem prejuízos dos laços que unem Brasília e Washington desde o século 20. Afinal, negócios são negócios.

Os acordos vão ajudar o Brasil a avançar em áreas como energias renováveis, indústria automotiva, agronegócio, linhas de crédito verde, tecnologia da informação, saúde e infraestrutura. Um dos destaques é o avanço na parceria entre os dois países na construção do satélite CBERS-6, munido de uma tecnologia que permite o monitoramento de florestas como a Amazônia mesmo com nuvens.

Foram acertadas ainda a criação de um grupo de trabalho para implementar medidas que facilitem o comércio bilateral e cooperações nas áreas de pesquisa e inovação, tecnologias da informação e comunicação, promoção industrial e investimentos na economia digital. Na área da agricultura, foram assinados um plano de trabalho de cooperação na certificação eletrônica para produtos de origem animal e um protocolo sobre requisitos sanitários e de quarentena para proteína processada de animais terrestres a ser exportada do Brasil para a China.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que estava na comitiva da visita à China, disse que é interesse do governo brasileiro  fortalecer a indústria no Brasil por meio de investimentos de empresas chinesas. “O presidente colocou, em todas as reuniões, o desafio de intensificarmos os estudos sobre a viabilidade de reindustrializar o Brasil em parceria com o capital chinês, que está disponível e vê na América do Sul uma oportunidade de criar ali uma plataforma para seus produtos tanto para venda local quanto para exportação”, disse.

Ele comentou a declaração de Lula sobre a decisão de China e Brasil começarem a fazer negócios não mais em dólar, mas com suas moedas, o yuan e o real. O próprio Haddad disse que a decisão é uma forma de “escapar da camisa de força de ter comércio fixado em moeda de um país que não faz parte da transação”. •

`