Pré-candidato à prefeitura de Guarulhos, o deputado federal falou sobre as atividades na CCJ, os projetos do governo Lula e quais serão os desafios e as propostas para governar a segunda maior cidade do estado de São Paulo

Fernanda Otero

Nascido e criado em Guarulhos, o deputado federal Alencar Santana começou sua militância no movimento estudantil, aos 16 anos, e ingressou no Partido dos Trabalhadores aos 22, em 1998. Atualmente, em seu segundo mandato consecutivo na Câmara dos Deputados, o advogado constitucionalista teve uma atuação de destaque como deputado estadual na ALESP, apontando desvios de verba durante a CPI da Merenda. 

Sobre os trabalhos em Brasília, ele comenta que há um novo cenário no qual o controle da pauta da Comissão de Constituição e Justiça não é do campo progressista, mas sim de radicais extremistas, mas que existe um regimento que ele espera que seja respeitado. Para a população guarulhense, Santana tem expectativa de que, com a vitória, seja possível uma maior integração junto aos programas do governo federal, já que o governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) segue dificultando a interlocução. 

O pré-candidato fala sobre as complexidades de governar uma cidade em uma região metropolitana, em especial no tema da mobilidade urbana, já que o fluxo de deslocamento para a capital é alto, além de destacar temas como habitação e a questão hídrica do município a partir da privatização da Sabesp.

Leia a seguir trechos da entrevista realizada no dia seguinte aos trabalhos da votação sobre o destino de Chiquinho Brazão, na última quarta-feira (10): 

As últimas 24 horas na Câmara Federal devem ter sido intensas. Como foi o processo que definiu a manutenção da prisão de Chiquinho Brazão na CCJ e depois no plenário? 

Olha, foi muito duro. A tropa bolsonarista, o PL e companhia, alguns resistiram bastante na CCJ, tiveram muita coragem tentando impedir a aprovação do parecer, ou seja, a autorização para manter a prisão, jogaram pesado. Alguns discursando com argumentos falsos, alegando defender a Constituição, que a prisão era ilegal, que votariam pela liberdade dele, mas depois pela cassação. Em primeiro lugar, eles não defendem a Constituição, em segundo, a prisão não é ilegal. Além do homicídio de Marielle e Anderson, houve vários atos de obstrução da justiça, um tipo de crime que se perpetuou. Outras seis pessoas foram mortas, que eram suspeitas, investigadas ou que tinham informações sobre o caso. Então, o grupo, a organização criminosa, continuava cometendo crimes. Isto justifica a prisão imediata. Quem será a próxima vítima se continuarem livres? Portanto, não há nada de ilegal. Há também elementos que justificam a prisão do ponto de vista da materialidade. E esse argumento de que votariam pela soltura e depois pela cassação foi mais uma tentativa de obstrução, de que realmente o que eles queriam era cassá-lo no Conselho, fazer com que ele perdesse o foro privilegiado, e levar o processo de volta para o Rio de Janeiro. É mais um esforço para obstruir, para atrasar a conclusão do inquérito, buscando a impunidade. Portanto, foi uma luta intensa na CCJ. Nos últimos minutos, conseguimos a vitória, mas a tensão sobre o resultado manteve-se durante toda a sessão, o placar estava muito apertado. 

Ainda sobre a CCJ, agora temos um outro cenário onde, tanto a presidente quanto a vice-presidente são grandes opositoras ao governo. Como você vê essa nova configuração da comissão?

De fato, enfrentamos um novo cenário no qual o controle da pauta não é nosso, mas sim da oposição, da presidência do PL, e de radicais extremistas. Mas, logicamente, que também tem ritos a serem seguidos. Há um regimento que esperamos que seja respeitado no que diz respeito à pauta, especialmente em assuntos de interesse do governo, que esteja tramitando na comissão, que ela coloque em pauta e vamos para o debate. O governo vai articular para ter a maioria e eles, logicamente, vão articular para ter a maioria deles, nós estamos conversando, dialogando, para que não haja sabotagem nesse processo. Portanto, se algo está na pauta, deve ser discutido, vamos debater. Contudo, a inclusão de outros projetos na pauta pode ser prejudicial, pois prevalece uma lógica de criminalização excessiva. Veja a contradição: eles frequentemente propõem muitos projetos que aumentam as penas, sob o pretexto de combater a criminalidade. Porém, quando surge uma oportunidade concreta de combater a criminalidade e a impunidade, como a prisão de um deputado, por exemplo, eles fazem o inverso. O discurso é vazio, contraditório e hipócrita, defendendo um aliado direto. Portanto, essa será a tônica constante da comissão, mas acreditamos que temos condições de superar e progredir.

O Desenrola Brasil, projeto no qual foi relator, transformou-se em um dos projetos mais bem-sucedidos do governo no primeiro ano, além da nova Lei dos juros do cartão de crédito. Esses projetos são uma demonstração do poder de articulação do governo Lula. Como você vê os avanços na economia e em outras áreas?

O governo Lula é um governo de realização, um governo de projetos novos, mesmo os antigos, são novos. Por que teve que recriar o Minha Casa Minha Vida, Faixa 1? Porque haviam encerrado o programa. Se o programa não tivesse sido abandonado, não seria necessário recriá-lo. O Mais Médicos é um programa novo. Eles acabaram com o Mais Médicos, tivemos que reiniciá-lo, reconstruí-lo. Logo, nada é velho, é novo. Se eles tivessem continuado o projeto de investimentos com mais obras, não precisaríamos do PAC outra vez. Se a política de valorização do salário mínimo tivesse sido mantida, não seria necessário aprová-la novamente para assegurar um ganho real acima da inflação. Se houvesse igualdade salarial entre homens e mulheres, o presidente Lula não precisaria intervir. Do mesmo modo, se os juros excessivos não deixassem milhões de brasileiros endividados, o programa Desenrola não teria acontecido. Esse programa possibilitou que muitas pessoas recuperassem a dignidade, limpassem seus nomes e retomassem suas atividades econômicas plenamente. No Desenrola, do qual fui relator, não apenas oferecemos uma solução, mas também combatemos a causa principal: os juros abusivos de cartão de crédito e do rotativo, que levavam a dívidas enormes com juros anuais de até 450%. Limitamos os juros a 100% ao ano, o que, apesar de ainda ser alto, representa uma redução significativa. Esse limite é um patamar fixo, independente do tempo da dívida. Este limite foi estabelecido por quê? Afinal, quem mais se endivida com o cartão de crédito? São geralmente os mais pobres, aqueles que necessitam do crédito para emergências e não conseguem quitar no fim do mês. 

Você está confirmado como pré-candidato do PT na cidade de Guarulhos, a segunda maior cidade da região metropolitana de São Paulo. Como é que você começou a construir essa pré-candidatura? 

Primeiramente, é um orgulho, para mim, representar o PT na disputa de 2024 em Guarulhos, cidade onde nasci, cresci e vivo. Já fui vereador por duas vezes e eleito deputado estadual também duas vezes, eleito pela cidade de Guarulhos. Atualmente, estou no meu segundo mandato como deputado federal, sendo novamente o mais votado na cidade em 2022. Estamos dialogando com muitas pessoas, diversos partidos. Teremos ali uma aliança muito boa, forte, enfrentaremos os candidatos bolsonaristas, um com aval direto de Tarcísio, apoiado pelo prefeito, e outro pelo PL. Guarulhos é uma cidade de grande importância, a segunda maior do estado de São Paulo. Pretendo discutir o cotidiano da cidade e o futuro de Guarulhos, visando a mudança e transformação que a cidade necessita. Consciente de que, no debate nacional, a representação política tem seu espaço, assumirei a representação do projeto do presidente Lula. Atuo como vice-líder do governo na Câmara e assim o farei na cidade, como pré-candidato a prefeito, confiante na possibilidade de vitória. Acredito que o PT voltará a governar Guarulhos após oito anos fora do poder. 

A questão da mobilidade é um problema muito sensível para a população de Guarulhos, mas é uma questão que não dá para tratar isoladamente, e a região metropolitana de São Paulo não tem sido pautada pelo governo do Estado. A privatização recente da Sabesp deve ter reflexos na vida dos guarulhenses, sem contar a habitação, que continua sendo um grande desafio. Você tem propostas para estes temas? 

Primeiro que Guarulhos é a grande São Paulo. Lógico que cada cidade tem sua particularidade. Guarulhos tem diferença de São Bernardo, de Osasco, de Santo André, da capital, sem dúvida alguma. Existem problemas locais, mas existem problemas, nesse caso, que são metropolitanos porque são realidades semelhantes. O deslocamento diário mais significativo entre cidades no país ocorre de Guarulhos para São Paulo, uma dinâmica também vista de São Bernardo e Santo André para a capital. Portanto, pensar em soluções e ações conjuntas para a região metropolitana significa planejar de forma mais eficaz, otimizar recursos públicos e encontrar soluções que beneficiem a todos de maneira adequada. Não faz sentido resolver um problema em uma cidade sem considerar impactos nas vizinhas. Nesse aspecto, o diálogo com a capital é essencial, e o governo estadual deve atuar como um promotor e facilitador desse processo. Hoje nós temos um governo que não tem política pública. Que não faz um debate de política pública, que não chama os prefeitos para conversar. O presidente Lula já fez investimentos muito importantes na cidade de Guarulhos. O governador, até agora, nada. Não levou uma creche, uma escola. Nada, nada, nada. Uma casa. Lula já assegurou moradias através do programa Minha Casa, Minha Vida e destinou 10 bilhões para a construção do metrô no estado, demonstrando um comprometimento com o uso eficiente dos recursos públicos. Essa parceria com o governo federal é crucial para nós, especialmente na gestão da cidade, pois almejamos promover mais projetos em colaboração. 

Quando iniciamos a campanha “Guarulhos Quer Metrô” em 2013, eu sabia que a implementação do metrô em Guarulhos não seria imediata. Esse tipo de projeto exige uma série de etapas: estudos preliminares, análise de viabilidade, captação de recursos, elaboração do projeto executivo, licitação e, finalmente, o início das obras. No entanto, as audiências públicas, mobilizações, assembleias e reuniões com a Secretaria Estadual de Transporte e a presidência do metrô foram cruciais. Graças a essas ações, hoje temos estudos que comprovam a viabilidade e necessidade do metrô, o que, sem nossa intervenção, poderia ter sofrido ainda mais atrasos. Da mesma forma, a questão do trem. Guarulhos já teve trem, pra quem não sabe, durante 50 anos. Era o trem das 11, do Adoniran Barbosa. Quando ele está querendo retornar para o Jaçanã, ele está em Guarulhos querendo retornar pro Jaçanã. Ora, já que o trem ia chegar, que a gente não o perca. É essencial que não deixemos essa oportunidade de melhorar o transporte público passar. Atualmente, o serviço de trem existente opera abaixo de sua capacidade, exceto nas viagens expressas, pois não se conecta efetivamente com as áreas de Guarulhos que mais necessitam de acesso ao transporte público rápido para a capital. Hoje, é praticamente um trem fantasma. 

A privatização da Sabesp foi um golpe duro para o povo de São Paulo, e os efeitos prejudiciais serão sentidos no futuro. Em Guarulhos, o serviço foi transferido da Sabesp municipal e o contrato é claro, estipula que, se a Sabesp for privatizada, a concessão feita pelo município a ela será cancelada, a menos que haja uma nova autorização legislativa. Portanto, se esse modelo avançar, nós trabalharemos para trazer o serviço de volta ao município, fornecendo um serviço mais competente e com tarifas mais acessíveis do que as praticadas pela Sabesp. Sobre o Minha Casa Minha Vida é importante destacar que já conquistamos cerca de mil unidades para Guarulhos durante o governo Lula, que foram anunciadas em 2023 e ainda serão construídas. Esperamos que o atual prefeito inicie essas construções o mais rápido possível, mas se isso não acontecer, nós começaremos as obras em 2025 para beneficiar os cidadãos que merecem uma casa própria nesta cidade.

Um projeto recente sobre a educação em Guarulhos, que estabelece novas regras para a escolha dos gestores da educação, foi aprovado na Câmara Municipal, ainda que tivesse 98% de rejeição em uma votação no site da Câmara. Qual sua visão do tema e deste comportamento que ignora o desejo da maioria?

O prefeito criou a escola com partido de uma maneira descarada, aberta, onde ele quer indicar, interferir na escolha do diretor de escola, vai indicar diretamente o vice-diretor, coordenador pedagógico, quer dizer, é uma interferência brutal na educação pública. Ora, não pode uma escola ficar suscetível ao seu conteúdo pedagógico, à vontade política de plantão. Por isso que nós temos o Plano Nacional, debates, conferências, para traçar uma política geral. A educação de Guarulhos tem que ser semelhante a de outras cidades, tem que ter um plano e os professores, coordenadores pedagógicos, poderão progredir em suas carreiras, não dá para ter uma vontade política dominando esse processo. Então, o prefeito aprovou esse projeto na Câmara, mas se eu for eleito prefeito, vou revogar, mudar essa lei. Não vamos ter interferência política na educação pública, vamos construir conversando com os professores e educadores. 

Acompanha?mos os ataques de Elon Musk à soberania nacional, o movimento de saída de usuários brasileiros da plataforma X? Qual sua opinião sobre a retirada do PL sobre as fake news?

Eu, por coincidência, ainda antes de começar esta entrevista, tinha me cadastrado no Blue Sky. Não podemos depender exclusivamente de um único meio de comunicação, de uma única ferramenta tecnológica de informação, ainda mais nas mãos de um maluco, de um cara autoritário que se acha dono do mundo e que se acha dono de países, que não aceita lei. Ele acha que vive no espaço. Aqui tem lei, aqui tem país, aqui tem um povo, tem regra, tem instituição e tem que seguir. Se não quiser, lamento, vá pra onde ele achar que tem que ir. Mas ele não pode se achar o dono do mundo só porque é dono de uma plataforma que conversa com o mundo, que tem presença em quase todos os países. O que ele faz é um atentado, é um crime contra o Brasil, contra o quinto maior país do mundo em termos de população, uma das maiores economias do mundo, um país soberano que ele subestima, atacando o poder judiciário e um de seus ministros, recusando-se a obedecer às leis. Isso é inaceitável. Por essa razão, decidimos explorar outras redes sociais, claro, sem abandonar completamente o X por enquanto. Tomara que mais pessoas entrem em outras redes alternativas para que a gente também possa se comunicar de uma maneira livre, porém dentro de parâmetros. Não podemos confundir os conceitos de legalidade, civilidade, humanidade e respeito com qualquer forma de censura. Defender esses valores essenciais não significa restringir a liberdade. Pelo contrário, o verdadeiro cerceamento da liberdade ocorre quando se usa a mentira e poderosos meios de comunicação tecnológicos para interferir em processos políticos, manipulando pensamentos e ideias, disseminando falsidades, desinformando a população e incitando ódio de A contra B. Isso sim é censura através da manipulação. Esperamos que a Câmara dos Deputados tome uma posição ativa. O presidente mandou segurar o projeto sobre as fake news, que já tinha avançado com o relatório do deputado Orlando Silva, optando por criar um grupo de trabalho. Nossa bancada, assim como o governo, está determinada a acompanhar esse processo de perto. O que buscamos é garantir direitos aos usuários e estabelecer obrigações claras aos proprietários dessas plataformas, que ganham bilhões ao operá-las.

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