Implicado, ex-chefe da Polícia Civil do Rio consolou família e prometeu solução
A posse de Rivaldo como chefe da Polícia Civil se deu um dia antes do assassinato de durante a intervenção federal chefiada pelo general Braga Netto, Marielle e Anderson. Em 479 páginas do relatório da PF, Rivaldo é citado 272 vezes
Rivaldo Barbosa, por enquanto, aparece no topo da cadeia criminosa que executou a vereadora Marielle Franco e o motorista Anderson Gomes. Junto com os irmãos Brazão, surge como um dos mentores intelectuais do assassinato e dos crimes que o sucederam – ocultação de provas, obstrução da Justiça e, o mais cruel, tratar a família e amigos de Marielle com deboche e fingimento.
Há, no entanto, um ponto que ainda pede esclarecimento: Rivaldo Barbosa tomou posse como chefe da Polícia Civil no dia 13 de março de 2018, apenas um dia antes da execução de Marielle e Anderson. A nomeação de Rivaldo fora publicada no Diário Oficial do Estado no dia 8 de março daquele ano, por ato do então interventor federal, o general Walter Souza Braga Netto.
Segundo as investigações da Polícia Federal, reveladas no último domingo, Rivaldo e os demais mentores do crime já haviam combinado o crime antes de sua posse. Andares acima, alguém mais teria tido conhecimento do que se tramava?
“É claro que podem surgir novos elementos que levarão eventualmente a um relatório complementar da Polícia Federal. Mas, neste momento, os trabalhos foram dados como encerrados”, afirmou à imprensa o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, em entrevista coletiva realizada na tarde de domingo.
Braga Netto afirmou que, embora tenha assinado a nomeação de Rivaldo, a escolha do ex-delegado coube a outro general, Richard Fernandez Nunes, então secretário estadual de Segurança Pública. Nunes, atualmente, é chefe do departamento de Educação e Cultura do Exército. À época da intervenção federal no Estado, Nunes foi promovido a secretário estadual pelo próprio Braga Netto.
Segundo a Polícia Federal, à época da nomeação de Rivaldo, já havia indícios de que o policial cometera crimes ao acobertar a atuação de milícias em disputas territoriais, e que a Polícia Civil do Rio havia sido informada a respeito.
As revelações em torno de Rivaldo chocaram a família de Marielle. A mãe, Marinete, afirmou que sua filha confiava no delegado. Marcelo Freixo, de quem Marielle foi assessora, afirmou que a partir de agora fica evidente que o policial tratou o caso com “deboche”, ao receber familiares e autoridades interessadas na elucidação do caso como se ele mesmo, Rivaldo, estivesse comovido com o crime.
“Rivaldo é uma pessoa que a Mari confiava, que falava para minha mãe: ‘eu vou resolver, é uma questão de honra resolver esse crime’“, afirmou a irmã de Marielle, a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco.
Envolvimento de delegado surpreende Mônica Benício
Mônica Benício, viúva da parlamentar, afirmou que os atos de Rivaldo configuram traição, não só à família, mas à democracia. “Se por um lado, o nome da família Brazão não surpreende tanto, o nome de Rivaldo Barbosa foi, para nós, uma grande surpresa”, contou Benício, que hoje também ocupa uma cadeira como vereadora na Câmara Municipal do Rio de Janeiro pelo PSOL.
“Saber que o homem que nos abraçou, prestou solidariedade e sorriu, dizendo que esse caso seria uma prioridade, tem envolvimento nesse mando, para nós, é entender que a Polícia Civil não foi só negligente. Não foi só por uma ‘falha’ que chegamos a seis anos de dor, mas em especial por ter sido conivente todo esse tempo”, disse Monica, na sede da Superintendência da Polícia Federal (PF) no Rio.
Comovida, a vereadora disse que o delegado foi a primeira autoridade a receber a família, no dia seguinte ao assassinato. Barbosa teria dito, na ocasião, que a solução do caso seria uma prioridade da Polícia Civil. “Chegamos a seis anos de dor, mas procurando força e seguir de pé procurando justiça”, completou A viúva do motoristas Anderson Gomes, Agatha Arnaus, também se pronunciou: “Foi um tapa na cara, dado por quem se dizia amigo da Marielle”.
Outra autoridade policial envolvida diretamente no crime é o ex-delegado da divisão de homicídios do Rio, Giniton Lages. Este chegou ao requinte de publicar um livro, supostamente sobre os bastidores da investigação, como quem estivesse interessado na resolução do crime. Ele foi afastado das investigações em 2022.
A PF também aponta que os militares encarregados da intervenção federal no Rio, decretada pelo então presidente Michel Temer, tiveram atuação “passiva”, com “falta de traquejo para manejar as vicissitudes do jogo de poder fluminense”. Ao citar especificamente a nomeação de Rivaldo, o relatório diz que a inépcia dos militares, especificamente de Nunes, não é sinônimo de falta de ingerência: “a manutenção da nomeação de RIVALDO mesmo após a contraindicação da Subsecretaria de Inteligência, são fatores indiciários do contrário”.
Quando o assassinato começou a ser planejado, com conhecimento e participação de Rivaldo Barbosa, ele era o diretor da Divisão de Homicídios da Polícia Civil do Rio. O relatório da PF o envolve ainda em lavagem de dinheiro e de ter sido o responsável pela nomeação de Giniton para sucedê-lo na Homicídios, em uma operação casada, já com vistas a barrar a investigação em torno do assassinato de Marielle. Em 479 páginas do relatório da PF, Rivaldo é citado 272 vezes.