Presidenta do Banco dos BRICS participa da reunião de cúpula África-Rússia em São Petersburgo e tem encontros com os presidentes da África do Sul e Rússia. Ela foi tratar da ampliação de nações que querem integrar o Novo Banco de Desenvolvimento

Dilma Rousseff vai à Rússia

A mídia brasileira tentou transformar um encontro de trabalho entre a presidenta do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), Dilma Rousseff, e o presidente da Rússia, Vladimir Putin, num jogo de intriga em que a ex-presidenta do Brasil estaria jogando para beneficiar indevidamente o Kremlin, em rota de colisão com algumas nações do Ocidente desde a eclosão da guerra na Ucrânia.

Na quarta-feira, 26, Dilma participou das atividades da 2ª Cúpula Fórum Econômico e Humanitário Rússia-África, realizada em São Petersburgo, na Rússia. Ela esteve reunida com Putin e manteve encontros bilaterais com o presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa. Em nota divulgada à imprensa nacional, Dilma anunciou que iria tratar da expansão de membros do NDB, entre outros assuntos.

No encontro, divulgado amplamente pela mídia russa, Dilma foi saudada por Putin de maneira respeitosa, mas ainda assim num tom acima da média para os contatos que líder do Kremlin promove. “Não tenho dúvida de que, usando sua rica experiência de trabalho público, conhecimento neste campo, você fará de tudo para desenvolver esta instituição — na minha opinião, muito importante hoje”, disse Putin.

Segundo o presidente russo, a criação de instituições financeiras alternativas é um esforço difícil, mas necessário, em um momento em que Washington armou o dólar americano. “Os membros da nossa organização, BRICS, não são ‘amigos’ contra ninguém, eles trabalham no interesse um do outro. Isso também se aplica à esfera financeira”, comentou.

Em outubro, Putin argumentou que os EUA “desacreditaram a instituição das reservas financeiras internacionais” armando o dólar, primeiro por emissões monetárias e depois para “roubar” fundos russos. Desde então, a secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, concordou que as sanções podem levar países a abandonar o dólar.

Diante do líder russo, Dilma concordou que o uso de moedas próprias e não o dólar deveria ser implementada pelos países em desenvolvimento em geral. Ela também disse que o maior desafio para as nações em desenvolvimento é a capacidade de arrecadar fundos para projetos de interesse nacional, desde serviços sociais até questões ambientais. Esta questão é negligenciada à medida que todos se concentram no problema da dívida.

No encontro com Putin, Dilma apontou que o NDB tem um papel importante a desempenhar na formação de um mundo multipolar e policêntrico. “Devemos estar determinados a arrecadar fundos nos mercados dos países parceiros. Também acredito que não há obstáculos para os países do mundo em desenvolvimento realizarem suas operações de comércio exterior em moedas nacionais entre si”, disse.

“Nossa estratégia de desenvolvimento para o período de 2022 a 2026 pressupõe que cerca de 30% dos fundos devem ser atraídos para os mercados domésticos”, ressaltou. “Também é muito importante arrecadar fundos em diferentes moedas, não apenas em dólares ou euros”.

Os EUA são responsáveis atualmente por cerca de 20% da produção econômica global, e mantém mais de 50% das reservas cambiais mundiais em dólares. Tal porcentagem encolheu no ano passado, já que as sanções financeiras contra a Rússia por causa da guerra na Ucrânia — incluindo o congelamento de reservas soberanas e o bloqueio ao SWIFT — levantaram preocupações em outros países de que tais medidas possam direcioná-las no futuro.

O SWIFT é o sistema financeiro ocidental cuja função é  permitir a troca de informações bancárias e transferências financeiras entre as instituições financeiras. “A era histórica do domínio do dólar americano está chegando ao fim”, disse Andrey Kostin, chefe do banco VTB da Rússia.

Embora a maioria dos economistas ocidentais não veja nenhuma outra moeda capaz de substituir o dólar, Putin deu a entender em junho que os BRICS estavam trabalhando em uma moeda de reserva própria, talvez com base em uma cesta de commodities. O tema deve constar da reunião de cúpula, em agosto, a ser realizada na África do Sul.

Segundo Putin, as relações em moedas nacionais estão se desenvolvendo entre os países dos BRICS. “Nossos números estão aumentando”, constatou. “A este respeito, parece-me que o banco também pode desempenhar um papel significativo no desenvolvimento das direções de nossas atividades conjuntas”.

Na nota distribuída à imprensa brasileira, Dilma fez questão de lembrar que o banco dos BRICS hoje é mais amplo que os número dos países que fundaram a instituição financeira. Além dos cinco países que lideram o grupo — Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul — o NDB já tem entre seus membros Bangladesh, Egito e Emirados Árabes Unidos.

A presidenta do NDB destacou que o banco não está considerando novos projetos na Rússia e opera em conformidade com as restrições aplicáveis nos mercados financeiros e de capitais internacionais. “Quaisquer especulações sobre tal assunto são infundadas”, destacou.

À margem da Cúpula Rússia-África em São Petersburgo, Dilma ainda se encontrou com líderes de outros países africanos e aproveitou o evento para tratar da sua participação na próxima reunião de Cúpula dos BRICS na África do Sul, entre 22 e 24 de agosto. •