Na CPI dos Ataques à Democracia, coronel mentiu diante de parlamentares para tentar encobrir envolvimento com terrorismo em 8 de janeiro, apontadas em mensagens de celular do ajudante de ordens de Bolsonaro. “Vocês são o lixo das Forças Armadas”, resumiu Rogério Carvalho (PT-SE)

O Brasil acompanha as revelações sobre os bastidores da tentativa de golpe de Estado ocorrida em 8 de janeiro. Na última terça-feira, 27, a CPI dos Ataques à Democracia assistiu a mais um golpista ser emparedado pela verdade dos fatos na sessão ocorrida no Congresso Nacional. Na audiência, o coronel Jean Lawand Júnior recorreu à criatividade para explicar sua participação no planejamento do golpe de Estado, quando as sedes dos Três Poderes da República foram atacadas por vândalos e terroristas em uma tentativa frustrada de ruptura institucional no país. 

Identificado como um dos conspiradores contra a democracia, a partir de conversas interceptadas pela Polícia Federal no celular de Mauro Cid — ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro —, Lawand mentiu. Resolveu investir no universo lúdico para convencer os parlamentares de que, em vez de incentivar um golpe, articulou para que o presidente “apaziguasse” o país. A peça de ficção do coronel, que estava amparado por um habeas corpus para não se incriminar, baseou-se em “pedidos” para que Mauro Cid orientasse Bolsonaro a dispersar golpistas que estavam acampados em frente ao quartel-general do Exército desde 2 de novembro. Não convenceu nem apoiadores de Bolsonaro. O ex-ajudante de ordens de Bolsonaro deve ser ouvido pela comissão nesta terça-feira, 4.

O que a troca de mensagens com Cid de dezembro de 2022 mostrou foi o contrário. Lawand suplicou a Cid para que convencesse o então presidente a ordenar uma intervenção militar no país e impedir a posse de Lula. “Cid, pelo amor de Deus, o homem tem que dar a ordem! Se a cúpula do Exército não está com ele, de divisão pra baixo está. Assessore e dê-lhe coragem. Pelo amor de Deus”. A frase foi extraída das mensagens trocadas com o então ajudante de ordens de Bolsonaro, preso por, entre outros crimes, fraudar o cartão de vacinação do ex-presidente.

O deputado Rogério Correia (PT-MG) afirmou que o coronel, ao mentir sobre uma suposta tentativa de apaziguar o ambiente político, denunciou Bolsonaro. “O senhor está querendo realmente culpar o presidente pelo que aconteceu depois – veio o dia 12 [ de dezembro], o dia 8 [de janeiro], veio o atentado no dia 24, no qual queriam estourar um caminhão com querosene para botar fogo em Brasília, no aeroporto. Nós já ouvimos aqui o terrorista”, lembrou o parlamentar mineiro.

“Essa é a denúncia que o senhor está fazendo a respeito do ex-presidente Jair Bolsonaro, é o que vamos tirar do seu depoimento”, disse. “O senhor está mentindo e vou provar que está mentindo”. Correia citou os pedidos de Lawand para que Mauro Cid adquirisse outro aparelho para que os dois pudessem conversar. O temor era de que o celular estivesse grampeado. “Por que precisa de cuidado com isso se o senhor vai dizer que [a conversa] é para apaziguar o país?”, indagou o deputado. “Não tem lógica, não é verdade o que o senhor está dizendo”.

O deputado acusou tanto Lawand quanto Cid, além do coronel Elcio Franco, de tramarem um golpe de Estado e a prisão do ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Morais. E frisou que Bolsonaro não deu a ordem para as Forças Armadas quebrassem a ordem institucional porque não confiava no Alto Comando, e não porque é um democrata. “O senhor mente, e mente escandalosamente”, reforçou Correia. “Eu não sou presidente, não posso dar ordem de prisão, mas, se coubesse a mim, o senhor não sairia daqui solto depois dessas mentiras. O povo brasileiro não é trouxa para o senhor ficar aqui, insinuando uma mentira dessas”.

Na mesma audiência, o senador Rogério Carvalho (PT-SE) traçou um panorama de riscos institucionais e ameaças de ruptura que marcaram o mandato de Bolsonaro para contextualizar o papel de Lawand na trama golpista. “Várias crises e ameaças à democracia e ao Estado Democrático de Direito foram perpetradas pelo governo”, apontou o senador, ao esclarecer a atuação de Lawand. “As manifestações de Vossa Senhoria comprovam a organização de um golpe”. E destacou: “O senhor era o mais ativo, o mais desesperado, para convencer o presidente a dar o golpe”.

“Vocês são o lixo das Forças Armadas brasileiras, porque deveriam estar subordinados aos interesses da democracia e do Estado Democrático de Direito. Quando o presidente não deu a ordem, vocês orquestraram o 8 de janeiro”. O deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA) registrou que Lawand deveria prestar depoimento como investigado e não como testemunha por sua atuação golpista. Em seguida, o deputado explicou como foi a chamada “engenharia do golpe”, dividida em três tentativas. “A primeira, através de uma GLO [Garantia da Lei e da Ordem], pelo Exército, a que o senhor mais forçou”, observou. “A segunda, através de uma bomba no aeroporto de Brasília”.

E continuou: “A terceira tentativa: invasão da sede dos Três Poderes”. Rubens Júnior descreveu as principais mensagens no celular do coronel para amparar sua linha de argumentação. “Cidão, pelo amor de Deus, cara, ele [Bolsonaro] dê a ordem, que o povo está com ele. Acaba o Exército brasileiro se esses caras não cumprirem a ordem do Comandante Supremo”, disse Lawand ao então ajudante de ordens de Bolsonaro.

“A sua atuação está tipificada no Código Penal, o senhor foi descoberto há pouco tempo, a partir da interceptação do celular do Mauro Cid”, insistiu Júnior. “Vão lhe tipificar, estou lhe informando agora, coronel”, destacou, citando o artigo 359L do Código Penal, que trata do crime de tentativa de abolição do Estado Democrático, “com emprego de violência ou grave ameaça”.  “A condenação é de 4 a 12 anos”, alertou. •  Agência PT

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