Comportamento de parte da imprensa e comentaristas da extrema-direita mostram a necessidade urgente da aprovação do Projeto de Lei 2630/2020, que criminaliza a desinformação e obriga as Big Techs a se responsabilizarem por ataques e conteúdos ofensivos nas redes sociais. Proposta foi adiada

Com a eleição de Lula, as casas de jornalistas que fazem propaganda para a extrema-direita e serviam como linha auxiliar do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, hoje investigado pela Polícia Federal por fraude, começaram a limpar as redações. Ainda não é um mea culpa, mas estão afastando alguns destes nomes.

Em janeiro, a Jovem Pan demitiu até mesmo um dos mais emocionados comentaristas, Rodrigo Constantino. Ele também teve sua conta restringida no Twitter por responder judicialmente depois de ter postado informações comprovadamente falsas, com intenção de enganar seguidores e ouvintes. Tudo isso, mas sobretudo por ter incentivado golpistas que depredaram Brasília em 8 de janeiro.

Junto de Constantino, outros nomes se viram sem o trabalho na casa grande de outras empresas de mídia. É o caso de Ana Paula Henkel, Zoe Martinez, Lacombe, Augusto Nunes, Alexandre Garcia, Guilherme Fiuza, Felipe Moura Brasil — recentemente demitido do UOL — além de J.R. Guzzo, dentre outros.

As demissões anunciadas no final de 2022 pela Jovem Pan e posteriores “readequações” nas redações da emissora também foram adotadas pela CNN Brasil, mas por motivos diferentes. A emissora balizou o discurso durante as eleições, chegou a ser acusada de “comunista” por bolsonaristas, mas parece ter pagado a conta após a derrota de Jair Bolsonaro.

Logo após as eleições, 140 pessoas foram demitidas em tês redações. No mesmo dia do corte, Rubens Menin, empresário mineiro dono da CNN Brasil, elogiou Jair Bolsonaro, o que deixou os funcionários revoltados. A emissora hoje, e muitos de seus profissionais mais renomados — à exceção de Daniela Lima — parece ter se alinhado completamente ao bolsonarismo.

O episódio mais marcante foi a recente exibição de uma reportagem sobre a presença do general Gonçalves Dias, ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, nas imagens de segurança do Planalto no dia dos ataques de 8 de janeiro, deixando no ar a dúvida de que o governo Lula teve participação — até por omissão — na invasão e destruição nas dependências das sedes dos Três Poderes.

A repercussão foi tão negativa, que a CNN se valeu de Daniela Lima, a jornalista da emissora atualmente mais palatável para setores da esquerda, para ler uma nota de explicação sobre a reportagem. A CNN foi acusada de não elucidar o momento em que as imagens foram gravadas. Após a revelação da íntegra das imagens, confirmou-se que a emissora ocultou trechos e fatos cronológicos que provam também a chegada do próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva, dos ministros Flávio Dino (Justiça) e José Múcio (Defesa), discutindo e vistoriando os estragos no Palácio do Planalto.

Em nota, a CNN disse: “os vídeos divulgados com exclusividade pela emissora foram gravados por 22 câmeras diferentes. Nestas imagens não havia o registro do momento em que o presidente Lula chegou ao Palácio, às 21h46. A emissora alegou que desconhecia a sequência de fatos para eximir-se de ter ocultado fatos, como se a chegada de Lula e ministros não tivesse sido pública e noticiada.

Após ler a nota, a própria Daniela Lima disse, ao vivo: “Nota minha, que fiz 8 horas de cobertura ao vivo nesse dia: as imagens das câmeras internas não estavam lá, mas a CNN acompanhou ao vivo a primeira vistoria feita no dia 8 de janeiro”. A apresentadora desmentiu a própria emissora e elucidou que fez seu trabalho como jornalista. O vídeo viralizou e Daniela virou alvo de bolsonaristas nas redes sociais, que agora pedem sua demissão.

Após esse episódio, aliás, a mesma repórter desmentiu uma fake news no ar, lançada pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP). Ele disse que o fotógrafo da agência Reuters, Alexandre Machado, era um infiltrado do Partido dos Trabalhadores, parte de uma “encenação” do PT durante a quebradeira.

Daniela o desmentiu, defendeu o repórter fotográfico, chamando-o de herói. E lembrou que, na cobertura dos atos de 8 de janeiro, mais de 40 jornalistas foram agredidos por bolsonaristas. Seu colega de emissora, no entanto, Leandro Magalhães, é quem sempre divulga “exclusivas” que beneficiam Bolsonaro.

Quando o ex-presidente estava em Orlando, nos Estados Unidos, era somente com Leandro que Bolsonaro falava em exclusividade sobre seu retorno. Ele o acompanhou no voo de regresso ao Brasil. Leandro esconde de seu currículo, mas antes de ir para a CNN, trabalhou durante anos como assessor parlamentar do PP, na época partido de Bolsonaro, com quem já postou fotos em redes sociais.

Na cruzada contra o projeto de lei das Fake News, juntam-se os comentaristas que encontraram nova casa para seguir desinformando — e lucrando muito com isso, pois monetizam cada página ou vídeo que publicam. Um é o site O Antagonista”, um veículo lavajatista por excelência, que ainda hoje é mais morista que bolsonarista. Outros dois veículos que reforçam a pauta da extrema-direita são a Revista Oeste e o jornal Gazeta do Povo, ambos do Paraná. Todos são a mídia que lança mais desinformação e ataques dirigidos às instituições de Estado e seus representantes.

Beneficiários da manutenção do estágio atual de degradação que ganhou vida depois do Golpe de 2016, seguem desconectados de qualquer compromisso com o país ou a democracia. E não se guiam por nenhum tipo de regulação, na esteira da tática suja bolsonarista. E seguem na ladainha e na máxima de quem mais mente, desinforma e ataca o Estado Democrático de Direito não só faz campanha como ainda lança mentiras em série contra o projeto de lei que os puniria. Agora, fazem coro ao lobby das big tech.

Com um verniz de moderada, a CNN tem contratado, por exemplo, pessoas como Janaina Paschoal e Joel Pinheiro para comentar política, economia e governança. Nenhuma qualificação, a não ser o barraco que traz audiência e o show de intolerância, desconhecimento e desinformação nas falas que já estão confrontando, ou até mesmo passando, em audiência a Globonews e a JP News.

Lá também estiveram o comentarista Alexandre Borges, marqueteiro de Bolsonaro, Wilson Witzel e Celso Russomano. E o jornalista Felipe Moura Brasil, demitido após ter defendido ao vivo o ex-juiz e senador Sergio Moro, que caluniou Gilmar Mendes e agora responde por isso. Moura disse tratar-se apenas de uma piada. A piada era a acusação de que o ministro Gilmar Mendes vendia decisões. Foi demais até para a CNN.

Com canais bloqueados em diversas plataformas, este time de jornalistas de aluguel estão abrigados na Revista Oeste e na Gazeta do Povo, ambas em franca campanha de arrecadação de fundos para se manterem. Nos dois veículos só é possível acessar o conteúdo se você for assinante. A Gazeta do Povo está em campanha mais ostensiva. É impossível utilizar o Twitter sem esbarrar com um vídeo de Rodrigo Constantino pedindo dinheiro para que “a verdade possa ser dita”.

Em outro anúncio, um vídeo bem produzido, com apresentadora e locução, apela que a democracia brasileira está em risco e que vivemos em um regime que censura jornalistas. E daí porque buscam ajuda financeira – isso após terem até mesmo monetização de conteúdo barrado por publicação de notícias falsas e incitação a golpe de Estado no Brasil.

Não é de se admirar que estes nomes e estes veículos tenham encampado grande empreitada ao lado das big tech, como Google, Meta, Spotify e outras corporações de tecnologia. Eles militam em causa própria, não para o país.

Quase todas essas penas de aluguel foram condenadas por publicações que o projeto de lei mira com regulação e responsabilização pelo que é dito e publicado por usuários e corporações. É incabível que termos de uso prevaleçam sobre uma legislação que define regras e determina o razoável, distinguindo opinião de manipulação e crime. E é justamente com desinformação, manipulação e discurso de ódio que estes comentaristas e veículos extremistas ganham dinheiro. É o terraplanismo da mídia venal.

Empresas assim, comandada por empresários como Rubens Menin e Tutinha Amaral, confrontam a democracia diariamente, auxiliam na manipulação de eleitores, interferem em processos legislativos e eleitorais, destroem reputações e ainda lucram com isso.

Tutinha chegou a renunciar ao cargo de presidente da Jovem Pan após esta estar no centro do inquérito do Ministério Público Federal por incitação aos atos golpistas em janeiro. Mesmo agora, diante das novas evidências e denúncias envolvendo Jair Bolsonaro e seu ex-ajudante-de-ordens o tenente-coronel Mauro Cid, acusados de fraude e falsidade ideológica, a “Jovem Klan” não se faz de rogada e engrossa a estratégia de vitimização do ex-presidente.

Foi no programa Pânico, que Bolsonaro surgiu na quarta-feira, 3, chorando ao vivo, posando de coitadinho. Os comentaristas se revezavam, apiedados do líder da extrema-direita apontando que o inquérito que apura as fraudes dos cartões de vacinação seriam fruto da vingança de Lula.

Ninguém mostra compromisso com a verdade, ou se atém aos fatos e transformando, aos poucos o caso numa novela dramática dos anos 50. Mas é isso que ganha espaço e engajamento: o discurso extremista contra Lula. Mostram que é mais do que urgente a regulamentação para criminalizar a desinformação. •

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