Prévia da inflação desacelera e vai a 0,57% em abril, mas o Banco Central de Roberto Campos Neto continua na mesma ladainha: “integridade técnica do BC precisa ser respeitada”. Haddad e Tebet apontam que a trajetória dos juros precisa mudar agora, sob pena de o país não sair do atoleiro

O mundo real continua apontando para mudanças drásticas na condução da política econômica, sob pena de os esforços do governo Luiz Inácio Lula da Silva para melhorar a vida do povo sejam em vão. Na última semana, a equipe econômica esteve no Senado para discutir os rumos da economia nacional, mas o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, manteve a mesma cantilena sobre a necessidade de congelar o patamar atual dos juros básicos.

Diante de senadores, ele tentou convencer o que a inflação está na raiz da estratégia do Banco Central (BC) de submeter a economia à política de juros apocalípticos no patamar de 13,75%. Convidado a explicar a Selic estratosférica do BC à Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, arriscou o velho discurso de sempre: “a integridade técnica da autoridade monetária precisa ser respeitada”. E mais do mesmo: “a dívida pública do Brasil está acima dos países emergentes e é preciso ter credibilidade para cortar os juros”.

E, culminou com a seguinte pérola: “Se fizermos o trabalho de conter a inflação, poderemos voltar a cair a taxa de juros”. Pois bem. O IPCA-15 de abril, a prévia da inflação do mês, desacelerou novamente, estacionando em 0,57%. As projeções do mercado apontavam um índice de 0,61%. Em março, o percentual foi de 0,69% e, em fevereiro, de 0,76%. No acumulado de 12 meses, o IPCA-15 ficou em 4,16%, índice menor que os 5,36% dos 12 meses anteriores.

Trata-se, portanto, da mais baixa inflação em mais de dois anos, quando, em outubro de 2020, o percentual chegou a 3,52%. Daí a pergunta: O que falta então para Campos Neto reduzir os juros? Ele não explica, mas houve quem voltasse a apontar o equívoco central da política monetária tocada pelo Banco Central, ainda sob os auspícios do neoliberalismo velhaco celebrado e enaltecido por Paulo Guedes durante os últimos quatro anos no governo Bolsonaro.

Em sessão no plenário do Senado, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, lamentou decisões do governo anterior que aumentaram as despesas públicas e reduziram a arrecadação. Ele também defendeu a revisão da concessão de renúncias fiscais, que somam R$ 600 bilhões. Haddad sugeriu a alteração na rota do Banco Central ressaltando que a alta dos juros inviabiliza o crescimento do país.

Haddad disse que uma desaceleração da economia relacionada à condução da política monetária levaria a problemas fiscais, e voltou a pedir “harmonização” da ala monetária com a trajetória das contas públicas. Além de Haddad, Simone Tebet também defendeu a queda dos juros, atualmente no patamar de 13,75%.

A ministra do Planejamento, Simone Tebet, disse que o Banco Central não pode considerar que suas ações são apenas técnicas, pois as decisões da autoridade monetária interferem na política. “Juros, inflação e crescimento são três coisas que precisam andar juntas, não podem estar isoladas”, declarou. “O crescimento não pode ficar no meio do caminho”.

A presidenta do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), voltou a criticar Campos Neto e a manutenção da Selic. “A inflação do Brasil nunca ficou tão baixa no ranking internacional, estamos em 144º lugar em 190 países pesquisados”, afirmou. “E a taxa de juro real continua sendo a mais alta do mundo. O presidente do BC devia estar cumprindo determinação legal de atuar no crescimento da economia e geração de emprego”.

De acordo com o IBGE, todos os nove grupos de produtos e serviços tiveram alta, mas alguns com desaceleração. Itens de higiene pessoal tiveram um recuo expressivo, passando de 2,36% em março para 0,35% em abril, especialmente pela queda nos preços dos perfumes (1,99%).

O setor de alimentos também apresentou queda, como batata-inglesa (7,31%), cebola (5,64%), óleo de soja (4,75%) e carnes (1,34%). Por outro lado, os ovos subiram 4,36%. A gasolina também registrou alta de 3,47%.

No Senado, Campos Neto não conseguiu reagir à intervenção do senador Cid Gomes (PDT-CE), que comparou a situação da economia brasileira à dos Estados Unidos, apontando a disparidade na condução da política monetária. Ele comparou os juros e a inflação do Brasil com os números dos Estados Unidos e disse não haver razoabilidade na diferença entre eles.

“A inflação do Brasil em 2022 foi de 5,8%. A nossa taxa de juro terminou o ano com 13,75%”, disse. “[Nos Estados Unidos,]  a inflação foi de 6,5%. Taxa de juros ao final do ano […] 4,5% ao ano”, completou. E completou: o desemprego norte-americano foi de 3,5% em 2022, enquanto no Brasil foi de 9,3%.

“Sabe onde é que vai incidir esses 13,75%? Na nossa dívida. Na dívida do governo federal que, em março, [tinha] R$ 7,3 trilhões”, declarou Cid Gomes. Ele ressaltou que, em 2022, os juros aumentaram a dívida pública em R$ 802 bilhões. E destacou que o efeito é de uma “bola de neve”. Segundo senador, a dívida do Brasil subiria para R$ 292 bilhões se os juros fossem os mesmos ao dos EUA. “Isso seria uma economia […] de R$ 510 bilhões se praticasse a taxa de juros da meca do capitalismo, dos Estados Unidos”, declarou. “Quem passou a ser beneficiário no ano passado de R$ 510 bilhões? […] Vai cair na conta do tal rentista”, disse. Cid disse que o BC faz um papel de Robin Hood ao reverso, transferindo dinheiro dos mais pobres para os ricos. Esse dinheiro poderia ser usado para triplicar o Bolsa Família, fazer 3,6 milhões de habitações populares, 134 mil escolas por ano ou elevar o salário mínimo para R$ 4 mil. “Eu não sou radical, eu não sou comunista, eu não socialista, eu sou social democrata. Eu acredito na força e fundamental importância da iniciativa privada”, disse. “O melhor negócio no Brasil hoje é vender seu negócio e botar o seu dinheiro na aplicação financeira”.

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