Ex-militante da ALN e preso político nos tempos de chumbo, o jornalista faleceu aos 74 anos, em São Paylo. A CUT, a Fundação Perseu Abramo, o Partido dos Trabalhadores e sindicatos de todo o país se despedem do companheiro

Morreu na sexta-feira, 21 de abril, o jornalista e militante político Celso Horta. A informação de sua morte foi confirmada por meio de nota de pesar da Fundação Perseu Abramo. Celso tinha 74 anos e estava internado há uma semana para tratar uma pneumonia, quando se diagnosticou um quadro coronariano delicado. Ele teve uma parada cardíaca e se despediu de sua constante luta. Não seria justo com Celso dizer que ele não resistiu – resistência é palavra de ordem em sua biografia. Sua morte repentina deixa em amigos de luta, redações, sindicatos e do PT um grande pesar.

Nascido em Guaratinguetá (SP) em 8 de maio de 1948, Celso Horta mudou-se para a capital paulista para cursar Direito na PUC-SP, em 1968, quando também iniciou sua militância política na Ação Libertadora Nacional (ALN). Preso político entre 1969 a 1977, ao deixar a cadeia partiu para fazer cursou jornalismo na ECA-USP. Atuou profissionalmente na grande imprensa até meados de 1991. Ele trabalhou no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, no PT, unindo o exercício do jornalismo à militância política. 

Durante a resistência à ditadura militar no Brasil, após passar pelo movimento estudantil e lutar na “guerra da Maria Antônia”, como ficou conhecido o episódio em que estudantes enfrentaram forças anticomunistas sustentadas pela ditadura, Celso se aproximou da ALN. Ali, atuou sob o comando de Carlos Marighella, tendo sido  seu motorista por um dia, como lembrou em depoimento ao jornal português “I Digital”, em 2021. “Eu sabia dirigir automóvel, era um exímio motorista em 1969, e não era todo o mundo que sabia dirigir naquela época. Fiquei com essa função, que era importante. Cheguei a vê-lo uma única vez, dentro de um automóvel, um fusca de uma militante amiga nossa”, contou.

Aos 21 anos, foi preso pelos militares, em 1969, e passou por sessões brutais de tortura que o marcaram para a vida toda. Ali, não era mais Celso, era Alcides, seu nome de guerrilha em defesa do país frente ao horror da ditadura. Preso no Carandiru, compartilhou cela com pacientes psiquiátricos, assassinos e outros companheiros de luta. “As memórias não estão mais vivas. As pessoas morreram, desapareceram”, desabafou Celso. Na tortura, enfrentou espancamentos, pau de arara e cadeira do dragão — método de tortura via eletrocução, um dos preferidos dos militares. Passou oito anos na prisão, até 1977.

Sair da cadeia foi para Celso não só a liberdade, mas o começo de uma formação sólida como militante de esquerda. “Até é uma forma de entender a minha vida, certo? Porque depois que saí da cadeia não parei de militar, continuei militando a vida inteira”.

Ainda na década de 1980, Celso se muda para Havana, em Cuba. Passa a se dedicar completamente ao jornalismo. Ali, trabalhou no Granma, órgão de imprensa oficial do Partido Comunista Cubano. “E me marcou muito, porque contrariava tudo o que se dizia sobre Cuba, que se vivia sob ditadura. Eu nunca vi isso lá, vi um povo que participava, que discutia, debatia, brigava. Via o Granma na mão de todo o mundo, todo o mundo lia, o índice de alfabetização era muito grande, continua sendo hoje”, recorda. No Brasil, trabalhou na Folha de S.Paulo e ficou uma década na imprensa comercial.

TEMPOS DE CHUMBO No presídio de Barro Branco, em pé, da esquerda pra direita: os militantes Ariston Lucena, Gilberto Beloque, Paulo Vanucchi, Genoino, Mané Cirilo. Sentados: Oséas Duarte, Aton Fon, Reinaldo Mourano, Celso Horta e Hamilton Pereira. Celso ficou preso durante sete anos

“Quando você está na mídia no Brasil, a primeira coisa a pensar é que você está trabalhando para sobreviver. E você é obrigado a fechar os olhos a muita coisa porque senão, você não trabalha”, declarou. Em seguida, dedicou-se continuamente ao ofício militante da comunicação, trabalhando para sindicatos e para o PT, onde fez parte da consolidação do partido – Celso fez memorável passagem pelo Sindicato dos Metalúrgicos. Foi criador e diretor do extinto jornal ABCDMaior e um dos precursores no projeto da TVT.

A partir de 2012, dedicou-se à carreira de escritor e pesquisador. Publicou pela Coleção Realidade Brasileira o livro “A repressão militar-policial no Brasil – O livro chamado João”. A obra foi escrita clandestinamente por presos políticos entre 1972 e 1975, na Casa de Detenção de São Paulo, impresso em Paris à época e lançado no Brasil, em 2016. É também autor da obra ‘O braço direito do Grande ABC’, estudo de caso sobre o jornal Diário do Grande ABC.

Sua partida desperta homenagens de sindicatos de todo o país, da CUT, de colegas jornalistas e companheiros de luta política. Celso Horta era casado e deixa duas filhas e uma enteada. Segundo informações da família, ele estava internado há uma semana para tratar uma pneumonia, mas teve complicações cardíacas e não resistiu. •

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