A semana na história – 10 a 16 de Abril
13 de abril de 1945 – Getúlio chama Dutra de ‘desleal’
Num documento escrito à mão, datado de 13 de abril de 1945, o presidente Getúlio Vargas constata o fracasso da estratégia de lançar a candidatura do general Eurico Gaspar Dutra com o objetivo de esvaziar as articulações golpistas. Segundo Getúlio, Dutra, seu então ministro da Guerra, também havia se convertido num golpista.
De acordo Lira Neto, autor da trilogia “Getúlio”, a carta parece uma antecipação do testamento que ele deixaria na mesa de cabeceira antes de se suicidar, em 24 de agosto de 1954.
O diagnóstico de Getúlio sobre o general é duríssimo: “Esse candidato é um homem primário, instintivo, desconfiado, desleal, com ambições superiores ao seu merecimento e cercado por uma camarilha doméstica, civil e militar, que o domina sem contraste, falando ora em nome do povo, ora em nome do Exército, sem representar nem a um, nem a outro.”
E desabafa: “Senti que estava traído (…). Não poderia reagir porque bradariam, conforme o ambiente por eles criado, que eu preparava o golpe para continuar no poder”.
14 de abril de 1961 – Janio cria o parque nacional do Xingu
O presidente Jânio Quadros decreta a criação do Parque Nacional do Xingu, no nordeste de Mato Grosso, na parte sul da Amazônia e totalmente inserido na bacia do rio Xingu. A decisão é uma vitória de indigenistas e antropólogos pela demarcação de uma área de proteção indígena e ambiental capaz de deter a redução da população local, vitimada pela violência e pelas doenças trazidas por colonizadores.
Em termos históricos, a região fora primeiramente documentada em 1884, pelo antropólogo alemão Karl von den Steinen, que registrou aspectos geográficos e a presença de várias tribos indígenas. Em 1943, incluídos na expedição Roncador-Xingu — que se embrenhava na região para abrir caminhos por terra e campos de pouso —, os irmãos Cláudio, Leonardo e Orlando Vilas-Boas estabelecem contato com os camaiurás, cuicuros, matipus, trumais, uaurás e outros povos.
17 de abril de 1961 – Fracassa invasão da baía dos porcos pelos EUA
Cerca de 1.500 exilados cubanos que viviam nos Estados Unidos invadem a baía dos Porcos, em Cuba, com o objetivo de ocupar o sul da ilha e obter o apoio povo para a derrubada do regime de Fidel Castro.
Os anticastristas tiveram apoio logístico norte-americano e foram treinados pela CIA na Guatemala. Fidel, no entanto, tinha agentes infiltrados na operação e deslocou tropas para o sul. A operação foi mal executada e não obteve nenhuma simpatia da população, que apoiou o governo revolucionário. A invasão foi derrotada com facilidade. Os contrarrevolucionários foram capturados, e os EUA tiveram de pagar indenizações a Cuba para libertá-los. O fracasso jogou John Kennedy para a direita.
11 de abril de 1964 – Castelo se impõe a congresso mutilado
Dois dias depois do Ato Institucional e da cassação de 40 parlamentares, o general Castelo Branco é eleito presidente da República em votação indireta no Congresso Nacional. Candidato único, obteve 361 votos contra 72 abstenções, tornando-se o primeiro dos cinco generais presidentes em 21 anos de ditadura.
O presidente da Câmara, Ranieri Mazzilli, que exercia formalmente a Presidência da República desde a deposição de Goulart e era tutelado pelos ministros militares, transmitiu-lhe o cargo no dia 15 de abril.
Nos anos que precederam o golpe, o general Castelo Branco foi o principal interlocutor militar do embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Lincoln Gordon. Conspirador discreto, foi chefe do Estado Maior do Exército no governo Goulart. Os três membros do Comando Supremo mantiveram-se à frente dos ministérios militares.
11 de abril de 1964 – Regime faz expurgo nas forças armadas
O Ato Complementar nº 3 da ditadura mulutar expulsa das Forças Armadas 122 oficiais (77 do Exército, 14 da Marinha e 31 da Aeronáutica). Da primeira lista de cem cassações, divulgada dois dias antes, já faziam parte seis oficiais superiores que apoiavam o governo constitucional de João Goulart. Centenas de marinheiros, praças, cabos e sargentos que participavam de associações profissionais e defendiam as Reformas de Base foram presos nas primeiras horas do golpe. A repressão aos democratas e legalistas, da base ao topo da hierarquia, fez dos militares o grupo mais numeroso de cidadãos perseguidos pelos golpistas de 1º de abril.
Abril de 1965 – Ditaduras se unem às ordens de tio Sam
Em mais um gesto de alinhamento incondicional aos EUA, Castelo Branco envia 1.300 militares brasileiros para apoiar a invasão da República Dominicana. O ataque norte-americano ao pequeno país do Caribe tinha o objetivo de garantir a ditadura instalada em 1963 em Santo Domingo, que havia derrubado o governo constitucional de Juan Bosch. O golpe contra Bosch, acusado pelos EUA de comunista, fora organizado pela CIA.
Além do Brasil, as ditaduras do Paraguai e da Nicarágua aceitaram participar das Forças Interamericanas de Paz. A subserviência de Castelo desencadeou as primeiras passeatas estudantis depois do golpe de 1964.
16 de abril de 1968 – Ditadura ganha a primeira greve
Cerca de 1.200 trabalhadores da siderúrgica Belgo-Mineira, em Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte, cruzam os braços reivindicando reajuste salarial de 25%. A primeira greve depois do golpe militar surpreendeu a ditadura, que desde 1964 impunha uma política de arrocho responsável por corroer mais de 20% do valor médio dos salários. A greve foi articulada pela diretoria do Sindicato dos Metalúrgicos eleita no ano anterior e impedida de tomar posse.
Abril de 1970 – ‘Apesar de você’ vira um hino
Chico Buarque volta do exílio e compõe “Apesar de Você”, samba que podia ser entendido tanto como uma briga de casal ou uma crítica à ditadura: “Hoje você é quem manda/ Falou, tá falado, não tem discussão/ A minha gente hoje anda/ Falando de lado e olhando pro chão/Você que inventou esse estado / Inventou de inventar toda escuridão /Você que inventou o pecado /Esqueceu-se de inventar o perdão/ Apesar de você, amanhã há de ser outro dia…”
Os censores não perceberam o duplo sentido da letra, mas o público entendeu o recado. Cem mil cópias foram vendidas em uma semana, tempo que as autoridades levaram para proibir a distribuição e a execução em rádio e TV.
15 de abril de 1971 – Olho por olho, dente por dente
O industrial dinamarquês Henning Albert Boilesen, presidente do Grupo Ultra e membro da diretoria da Fiesp, é morto por um comando do Movimento Revolucionário Tiradentes (MRT) e da Ação Libertadora Nacional (ALN). Boilesen foi um dos mais ativos financiadores da Operação Bandeirante (Oban), centro de repressão e tortura. Além de organizar uma “caixinha” entre os empresários, cedeu caminhões da Ultragaz ao regime e, mais de uma vez, participou como espectador de sessões de tortura. O industrial foi executado na mesma alameda Casa Branca onde foi morto Carlos Marighella.
14 de abril de 1970 – Ditadura mata a estilista Zuzu Angel
A estilista Zuzu Angel, que deu repercussão internacional ao “desaparecimento” de seu filho Stuart Edgar Angel Jones, morre num acidente automobilístico na saída do túnel Dois Irmãos, na autoestrada Lagoa-Barra, no Rio. De acordo com a versão oficial, ela teria dormido ao volante de seu Karmann Ghia. A estilista havia deixado uma declaração, escrita um ano antes, na qual alertava: “Se eu aparecer morta, por acidente ou outro meio, terá sido obra dos assassinos do meu amado filho”.
A Embaixada dos EUA no Brasil considerou o acidente suspeito, conforme documento revelado pelo Wikileaks, em 2013. Investigações posteriores à redemocratização deixaram claro que se tratou de um atentado. O carro que ela dirigia foi abalroado por dois outros veículos.
Zuzu era uma estilista famosa desde os anos 1960 por suas criações com motivos brasileiros, que também faziam sucesso nos EUA. Foi casada com o norte-americano Norman Angel Jones. Tiveram dois filhos: Hildegard, que viria a se tornar uma influente jornalista no Rio, e Stuart, estudante de economia que militou no MR-8.
Preso em 14 de abril de 1971, Stuart foi torturado até a morte por agentes do Centro de Informações da Aeronáutica na Base Aérea do Galeão. Os agentes queriam que ele informasse o paradeiro de Carlos Lamarca. O jovem nada revelou. De acordo com relato Alex Polari, que também estava preso no Galeão, o estudante foi amarrado a um jipe militar e arrastado pela pista de pouso até a morte.
Inconformada com o silêncio da ditadura sobre a morte do filho, Zuzu Angel iniciou uma corajosa campanha de denúncia dentro e fora do país. Ela entregou um dossiê ao secretário de Estado Henry Kissinger, que visitou o Brasil em 1976. Também escreveu ao senador democrata Edward Kennedy, que denunciou o caso no Congresso. Em Nova York, a estilista promoveu um desfile de roupas estampadas com anjos feridos e pássaros engaiolados.
Um ano após sua morte, Chico Buarque de Hollanda homenageou Zuzu Angel na letra de “Angélica”, com música de Miltinho do MPB4: “Quem é essa mulher/Que canta sempre esse estribilho?/Só queria embalar meu filho/Que mora na escuridão do mar”.
14 de abril de 1977 – General Geisel fecha o congresso nacional
Duas semanas depois de usar o Ato Institucional n° 5 (AI-5) para fechar o Congresso Nacional, o general Ernesto Geisel baixa um conjunto composto por uma emenda constitucional e seis decretos autoritários com o objetivo de conter o avanço eleitoral da oposição e garantir sobrevida à ditadura.
O Pacote de Abril, como ficou conhecido, devolveu à Arena o controle do Legislativo, cancelou as eleições diretas para governador previstas para o ano seguinte e determinou a escolha indireta de um terço dos senadores, entre outras medidas. Foi o maior retrocesso político desde a edição do AI-5, em dezembro de 1968.
O pretexto para o fechamento do Congresso e a edição do pacote foi a derrota da proposta de emenda constitucional da reforma do Judiciário. Para aprová-la, eram necessários dois terços dos votos dos parlamentares, o que exigia apoio de parte do MDB. O Diretório Nacional do partido “fechou questão” contra, exigindo a volta do habeas corpus para presos políticos e das garantias dos juízes. A emenda foi rejeitada em 30 de março. Geisel decretou o recesso do Congresso 48 horas depois.
O Pacote de Abril pôs em evidente contradição o discurso de “abertura política” e a prática autoritária do governo. Vencido nas urnas em 1974 e com nova derrota eleitoral no horizonte, Geisel decidiu conter o avanço do MDB e garantir o controle do Colégio Eleitoral de 1978.
O objetivo era fazer o general João Baptista Figueiredo, chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI), seu sucessor. Geisel coroou o pacote, estendendo de cinco para seis anos o mandato do próximo presidente, o que daria fôlego à ditadura até 1985. Para acrescentar uma medida popular, o governo acabou com a “denúncia vazia”, um mecanismo que permitia o despejo de inquilinos de imóveis sem qualquer motivação.
Entre as medidas, as eleições para governador, previstas para 1978, foram adiadas para 1982. Eles seriam eleitos pelas Assembleias, garantindo maioria da Arena. Os mesmos colégios eleitorais iriam eleger um senador por Estado, garantindo um terço do Senado. O critério de representação na Câmara dos Deputados foi alterado, aumentando as bancadas dos estados menores, onde a Arena era mais forte.
16 de abril de 1982 – Condenação de Lula é anulada
O Supremo Tribunal Militar (STM) anula todo o processo contra Luiz Inácio da Silva e outros dez dirigentes sindicais. Os acusados haviam sido processados pela Lei de Segurança Nacional (LSN) por “incitação à desobediência coletiva das leis” na greve dos metalúrgicos do ABC em 1980. Por 9 votos a 3, o STM decidiu remeter o caso à Justiça Federal para ser julgado sob a Lei de Greve. A ação, entretanto, já estaria prescrita em menos de um mês.
Lula e os dirigentes haviam sido condenados à revelia em 25 de fevereiro de 1981 pela 2ª Auditoria Militar de São Paulo a penas entre 2 anos e 3 anos e 6 meses de prisão. Réus e advogados não compareceram ao tribunal em protesto contra a arbitrariedade do processo. Em vista da ausência da defesa, esse julgamento acabou sendo anulado pelo STM em 2 de setembro de 1981. Em novo julgamento, entretanto, em novembro, as condenações seriam confirmadas. Os advogados dos sindicalistas decidiram, então, recorrer ao Supremo Tribunal Militar.
Desde o início do processo, a defesa afirmava que a denúncia da Procuradoria Geral da Justiça Militar contra os sindicalistas era inepta por não ser específica nem individualizada. Os advogados questionavam também o uso da LSN em uma ação decorrente de greve no setor privado, sem componente político e sem ameaça à segurança nacional.