Empresário se torna o primeiro ex-presidente a ser processado criminalmente na Justiça. EUA passam pelo primeiro grande teste institucional. O promotor Alvin L. Bragg anuncirá formalmente as acusações nesta terça-feira

Trump indiciado por crimes

Os problemas do ex-presidente Donald Trump com a Justiça dos Estados Unidos se tornaram finalmente um problema de verdade. Um grande júri de Manhattan indiciou-o na quinta-feira, 31, por corrupção. Ele pagou pelo silêncio de uma estrela pornô. É um acontecimento histórico que vai abalar a corrida presidencial de 2024 e marcar o ex-presidente como o primeiro a enfrentar acusações criminais.

Na noite de quinta-feira, depois que as notícias das acusações foram amplamente divulgadas, o escritório do promotor público  Alvin L. Bragg confirmou que Trump havia sido indiciado e que os promotores haviam contatado o advogado do milionário americano para coordenar sua entrega às autoridades em Manhattan.

É provável que Trump se entregue na terça-feira, momento em que o ex-presidente será fotografado e tirará suas impressões digitais nas entranhas de um tribunal do estado de Nova York. Isso tudo acompanhado por com agentes do serviço secreto a reboque. Os Estados Unidos jamais enfrentaram situação semelhante desde 4 de julho de 1776, quando foi declarado independente.

Na terça-feira, 4 de abril, Trump será então indiciado e, neste  momento, que as acusações específicas serão reveladas oficialmente. O ex-presidente enfrenta mais de duas dúzias de acusações, de acordo com duas pessoas familiarizadas com o assunto.

Durante décadas, Trump evitou acusações criminais, apesar do escrutínio de promotores em investigações persistentes repetidas vezes, criando uma aura de invencibilidade legal que a acusação da Promotoria de Manhattan agora ameaça conseguir finalmente furar.

Mas, ao contrário das investigações que surgiram durante seu tempo na Casa Branca — quando enfrentou questionamentos sobre suas táticas ostensivamente agressivas no cenário internacional, suas tentativas de derrubar a eleição de 2020 e sua convocação de uma multidão para invadir o Capitólio dos EUA — o caso que o levará às barras da Justiça criminal é construído em torno de um episódio espalhafatoso que antecede sua gestão na Casa Branca. O apresentador de reality show do início dos anos 2000 que se tornou candidato presidencial e chocou o establishment político ao vencer ninguém menos que Hillary Clinton, enfrenta a Justila pelo pagamento clandestino que enterrou um escândalo sexual no final da campanha de 2016.

Em uma declaração oficial à imprensa, Trump atacou Bragg, um promotor democrata, e retratou o caso como a continuação de uma caça às bruxas. “Isso é perseguição política e interferência eleitoral no nível mais alto da história”, disse o ex-presidente, chamando Bragg de “uma desgraça” e se apresentando como “uma pessoa completamente inocente”.

Trump, que sempre negou todas as irregularidades, já pediu a seus seguidores que protestassem contra sua prisão, em uma linguagem que lembra suas postagens nas redes sociais nas semanas anteriores ao ataque de 6 de janeiro de 2021 ao Capitólio por seus apoiadores. Ele também negou qualquer caso com a estrela pornô Stormy Daniels, que estava tentando vender sua história de um encontro amoroso com Trump durante a campanha de 2016.

“O presidente Trump não cometeu nenhum crime”, disseram  em nota os advogados do ex-presidente, Susan R. Necheles e Joseph Tacopina, em um comunicado. “Vamos lutar vigorosamente contra essa acusação política no tribunal”.

Trump indiciado por crimes
BOMBSHELL A ex-atriz pornô Stormy Daniels é o pivô da crise em Trump está enrascado. Ela recebeu por fora US$ 130 mil para não delatar escândalo sexual

Bragg é o primeiro promotor a indiciar Trump, mas pode não ser o último. As ações contra o ex-presidente em torno da campanha eleitoral são agora o foco de uma investigação federal, e um promotor da Geórgia está nos estágios finais de outra sobre as tentativas de Trump de reverter os resultados eleitorais naquele estado.

O indiciamento em Manhattan, produto de uma investigação de quase cinco anos, dá início a uma nova fase volátil na vida pós-Casa Branca de Trump, quando ele faz sua terceira candidatura à Presidência dos Estados Unidos. Ele vai se lançar à disputa pela indicação republicana – é o lider na maioria das pesquisas – em território desconhecido.

Em circunstâncias normais, uma acusação seria um golpe fatal para uma candidatura presidencial. Mas |Trump não é normal. Ele já disse que não abandonaria a disputa se fosse indiciado, e o caso pode até ajudá-lo no curto prazo, já que se pinta como um mártir político. A acusação também aumenta a perspectiva de uma reação explosiva do ex-presidente.

Trump frequentemente usa seus problemas jurídicos para atiçar a raiva de partidários obstinados — tal qual Jair Bolsonaro, que sempre posa de vítima diante das inúmeras acusações que pesam contra ele na Justiça brasileira. Assim como Bolsonaro, Trumo usa linguagem preconceituosa para atacar Bragg, o primeiro negro a liderar a promotoria distrital, chamando-o de “racista”, “animal” e “promotor de esquerda radical”.

Embora as acusações específicas no caso de Manhattan contra o ex-presidente permaneçam desconhecidas, o caso de Bragg gira em torno de um pagamento clandestino de US$ 130 mil a Stormy Daniels. Michael D. Cohen, assistente pessoal de Trump, fez o pagamento nos últimos dias da campanha de 2016. Mais tarde, então presidente o reembolsou, assinando cheques mensais enquanto servia na Casa Branca.

Em documentos internos, os funcionários da Trump Organization registraram falsamente os reembolsos como despesas legais, e a empresa inventou um falso contrato de retenção com Cohen para justificá-los. Os promotores descobriram a artimanha. Cohen, que rompeu com Trump em 2018 e depois testemunhou perante o Congresso, disse que o ex-presidente sabia sobre as despesas legais falsas e o contrato de retenção. Em Nova York crime falsificar registros comerciais. Trump está enrascado. •