Estrago no Alvorada
Janja mostra o descaso de Bolsonaro com a residência oficial: mobiliário em mau estado de conservação, obras de arte sumiram ou estão danificadas, sujeira e descuido. O prédio desenhado por Niemeyer foi maltratado pelo antigo inquilino
No primeiro dia depois da posse do novo governo, a socióloga Rosângela Lula da Silva, Janja, foi ao Palácio da Alvorada com Lula para visitar a residência oficial da Presidência da República. O cenário encontrado foi de estragos, sujeira, abandono e falta de manutenção, tanto nas áreas públicas, quanto nas áreas privadas do edifício desenhado por Oscar Niemeyer.
Nas duas áreas do Alvorada, há mobiliário histórico e obras de arte que sofreram nas mãos de Jair Bolsonaro. O estrago revela bastante sobre a família do mandatário anterior que ali residiu e descuidou de um prédio que é patrimônio público.
A situação encontrada tornou impossível a mudança imediata de Lula e Janja para o Alvorada. A instalação de ambos está adiada até que uma vistoria detalhada relate o alcance dos danos e retome a localização das obras de arte e móveis que sumiram. Não há registro do que foi alterado ou deslocado para outros prédios. Janja anunciou que pretende reabrir as portas do Alvorada para visitação pública assim que tudo estiver pronto.
Na biblioteca onde o Bolsonaro fazia as transmissões ao vivo pelas redes sociais, uma poltrona de couro está rasgada e o tapete tem buracos. De acervo rico e histórico, a biblioteca foi descaracterizada com a instalação de uma enorme TV e todo os equipamentos.
Imagens revelam que a tapeçaria ‘Músicos’, de Di Cavalcanti, foi retirada do local e colocada na sala de estar, em uma parede onde bate sol, o que acabou danificando a tela, que ficou desbotada e precisará ser restaurada. A peça é avaliada em R$ 5 milhões.
Até mesmo uma imagem sacra do século 19 foi encontrada no chão, o que acendeu um alerta sobre o estado de outras obras abrigadas na residência oficial. Vale lembrar que Michelle Bolsonaro ordenou que obras fossem retiradas do local. Evangélica, ela mandou servidores retirarem obras que retratassem santos.
Lula demonstrou tristeza ao ver a situação. “Ele ficou um pouco desolado”, relatou Janja à jornalista Natuza Nery, da GloboNews, a quem conduziu por uma visita ao palácio para denunciar a situação. “Ele morou um ano e meio com a dona Marisa na Granja do Torto para poder fazer uma grande reforma [no Alvorada]. As obras foram restauradas, foi tudo deixado perfeito para em menos de dez anos ficar nesse estado”, lamentou. A vistoria apontou que até mesmo árvores plantadas por Lula, como jacarandás e mandacarus, foram arrancados do jardim do Alvorada.
Ao mostrar o estado de conservação do edifício, a imagem de descuido ficou evidente: móveis manchados, poltronas deterioradas, cortinas rasgadas e um ambiente soturno, descaracterizado. Fatos curiosos chamaram a atenção. Janja encontrou nos armários da suíte principal peças de roupa deixadas pela família e um cilindro de oxigênio largado num canto.
O Palácio da Alvorada não recebeu cuidado nem manutenção, aparentemente, pelos últimos quatro anos. Ao percorrer o palácio, o mau estado de conservação salta aos olhos. Um desleixo simbólico: por se tratar da residência oficial da Presidência, um bem público e um lar, o modo como foi tratado é quase um paralelo do desgoverno de Bolsonaro.
Também foi revelado que o “síndico” do Alvorada nomeado por Bolsonaro, o pastor Francisco de Assis Lima Castelo Branco, da igreja de Michelle, além de não ter experiência na área, chegou a atuar como agente de viagens no horário do expediente. Ligado à Igreja Batista Atitude, a mesma da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, ele é marido de Elizângela Castelo Branco, tradutora de Libras de Bolsonaro, conforme reportagem do Brasil de Fato.
Às margens do Lago Paranoá, o Palácio da Alvorada faz parte do Patrimômio Urbanístico e Arquitetônico de Brasília, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). De todos os palácios e edifícios-sede dos Três Poderes em Brasília (atacados e depredados durante atos golpistas por bolsonaristas), o Alvorada foi o primeiro edifício inaugurado em 30 de junho de 1958. •