Três anos e meio depois de assumir o Ministério da Economia e prometer céu de brigadeiro para o Brasil, Paulo Guedes vê o esperado crescimento econômico estacionar em 1%. E, segundo o mercado, deve cair e o país entrar em recessão técnica no segundo semestre. É mais um vôo de galinha do Posto Ipiranga

 

A economia brasileira se recuperou no primeiro trimestre. Não foi aquele voo prometido pelo ministro Paulo Guedes, mas o Produto  Interno Bruto (PIB) cresceu 1%. O resultado ficou abaixo do que o mercado esperava e economistas alertam que a performance da economia nacional não deve continuar ao longo de 2022. Bolsonaro entrará em campanha eleitoral oficialmente em julho com o país caminhando para uma recessão técnica.

A expectativa de reeleição pode ser frustrada por conta da economia. A combinação de inflação crescente e aumento das taxas de juros sufoca o consumo na maior economia da América Latina. A XP Investimentos prevê uma recessão técnica até o final do ano após duas contrações consecutivas no terceiro e quarto trimestres.

“O desempenho da economia no primeiro trimestre foi uma surpresa considerando o ritmo lento observado desde o segundo semestre de 2021. Mas o que observamos foi um crescimento significativo do setor de serviços, após o fim das restrições, aliado à forte demanda reprimida”, disse Rafaela Vitória, economista-chefe do Banco Inter ao Financial Times.

“Mantemos uma visão cautelosa principalmente para o segundo semestre do ano, considerando a inflação ainda elevada e o efeito defasado do significativo aumento da taxa de juros no Brasil e também a expectativa de desaceleração da economia global após condições financeiras mais apertadas no exterior”, estima.

Apesar do choque de realidade, o Ministério da Economia continua vendendo céu de brigadeiro. Paulo Guedes prevê que o crescimento anual chegará este ano a 1,5%, o dobro das estimativas dos economistas, que estimam que o Brasil terá crescimento de 0,7%.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que o resultado do PIB não vai trazer melhora ao bolso dos trabalhadores. “Quando o PIB cresce você não recebe aumento de salário porque o PIB cresceu. Nem sempre que o PIB crescer significa que gerou mais emprego. Às vezes nós temos certeza que gerou acúmulo de riqueza em quem é empresário neste país”, disse em Porto Alegre.

Desde a posse de Bolsonaro, em janeiro de 2019, a economia brasileira cresceu menos de 2%, atingida pelo desemprego persistentemente alto, que agora figura na casa dos 10,5%, com 11 milhões de trabalhadores desempregados. Além disso, houve forte diminuição da renda e o impacto da pandemia de Covid-19 foi grande. Apenas no último ano, a renda do trabalhador caiu 7,9%.

No ano passado, a inflação também subiu para mais de 12%, com o aumento dos preços dos alimentos e dos combustíveis frustrando os eleitores. O Brasil tem o quarto maior nível de inflação entre as nações do G20, depois da Turquia, Argentina e Rússia. Isso forçou o banco central a uma série de rápidos aumentos das taxas de juros.

Espera-se que o segundo semestre do ano seja difícil. Isso acontecerá devido, entre outras coisas, às condições financeiras domésticas muito apertadas, a inflação de dois dígitos, o nível recorde de endividamento das famílias brasileiras. Além disso, o mercado está cauteloso diante do ruído e da incerteza gerados pela eleição polarizada em outubro. A perspectiva é que Bolsonaro seja derrotado por Lula, que é favorito e lidera as pesquisas.

O dado mais sintomático que teve forte impacto no PIB neste primeiro trimestre, contudo, é a queda do investimento, que recuou 3,5% e segue abaixo da média da América Latina. Com isso, passou a representar o equivalente a 18,7% do PIB, abaixo dos 19,2% registrados em dezembro, segundo o Instituto Nacional de Geografia e Estatística (IBGE).

Na comparação com o primeiro trimestre do ano passado, os investimentos na economia brasileira recuaram 7,2%, após cinco trimestres seguidos de crescimento. Com este resultado, o volume de investimentos na economia em relação ao tamanho do PIB piorou na comparação com a média verificada na América Latina e em países emergentes. É um sinal de que o Brasil precisa melhorar esse indicador para voltar a acelerar o desenvolvimento econômico.

“O nível de investimentos no Brasil está muito aquém do necessário para viabilizar a sustentação do crescimento”, opina o professor Antonio Corrêa de Lacerda, coordenador da pós-graduação em Economia Política da PUC-SP. “Nosso nível é bem baixo para padrões internacionais”.

O país amarga números muito abaixo do resto do mundo, cujos investimentos estão em torno de 27,3% do PIB. Nos países industrializados, o patamar é de  22,9% do PIB. Entre os países emergentes, o índice é de 33,2%. E na América Latina e Caribe, 20,5%. Segundo estudos da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), a economia brasileira teria que investir, só em infraestrutura, o equivalente a 4,3% do PIB, mas aplica 1,7% do PIB.

A cartilha econômica de Paulo Guedes é contra investimentos públicos, já que prega o enxugamento da participação do estado na economia. O problema é que os investidores privados desconfiam das mirabolantes promessas do governo brasileiro, que ainda flerta permanentemente com uma crise institucional ao atacar o Judiciário e faz o papel de vilão do meio ambiente perante o mundo. •

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