Em grandes centros urbanos, o fim do auxílio emergencial e do Bolsa Família criou um imenso contingente de famílias sem qualquer  tipo de assistência do Estado. Para piorar, o desemprego no país já é o mais alto entre as nações do G20

 

 

Boa parte do povo brasileiro está entregue ao Deus-dará, sem que o governo mantenha um compromisso mínimo em manter o Estado de bem-estar social. Ou garanta que, em meio à mais grave crise social da nossa história, no momento mais duro para milhões de famílias, a dor do abandono não seja um programa oficial. Mas é exatamente isso que o presidente Jair Bolsonaro está adotando: o aumento da miséria como política de Estado.

Isso ocorre justamente quando o desemprego atinge diretamente 13,7 milhões de brasileiros, que se vêem em situação desesperadora sem expectativa de qualquer tipo de renda. A situação é grave. O abismo para o qual Jair Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, empurram o Brasil parece não ter fundo.

 

Um estudo da agência de classificação Austin Rating coloca o país como o quarto do mundo em desemprego em um ranking de 44 nações. Segundo a agência, o Brasil também tem a mais alta taxa de desemprego entre países que integram o G20 e o dobro da média mundial. Os dados foram compilados entre países que divulgaram informações relativas ao terceiro trimestre.

A taxa de desemprego permanece elevada, no patamar de 13,2% no trimestre até o fim de agosto. O índice, que estava perto de 12% antes do início da pandemia, saltou para 14,7% no primeiro trimestre deste ano. Segundo a Austin Rating, somente Grécia, Espanha e Costa Rica registraram taxas de desemprego mais altas do que o Brasil.

“O desemprego no Brasil é o dobro da média mundial. Temos a 4ª maior taxa do mundo. A economia não cresce; não há investimentos em infraestrutura; não há emprego e renda; miséria e pobreza avançam; inflação galopante. Somos uma grande nau desgovernada”, define o senador Paulo Paim (PT-RS).

“Essa é uma fotografia clara de quanto o Brasil está perdendo na geração de emprego”, avalia o chefe da Austin Rating, Alex Agostini. “Entre os 44 países estão concorrentes diretos e outros emergentes como Cingapura, Coreia e México. Nestes países, a taxa de desemprego chega a 4%, 5%, no máximo”, disse.

O país vive o drama de ver parte de seu povo sem ter renda e nem perspectivas. O PT divulgou na última semana o Mapa da Exclusão de Bolsonaro, que fará a fome explodir em grandes cidades e centros urbanos do país. Isso porque o fim do auxílio emergencial, suspenso desde outubro e o fim do programa Bolsa Família criaram um imenso contingente de pessoas desassistidas, segundo levantamento da assessoria técnica do partido.

No fim de outubro, o governo acabou em uma só tacada o auxílio emergencial e o Bolsa Família, colocando em seu lugar o eleitoreiro Auxílio Brasil. A medida abandonou à própria sorte mais de 29,5 milhões de famílias. Até o mês passado, 43,9 milhões de benefícios eram pagos por meio dos dois programas extintos. Agora, o Auxílio Brasil só contempla 14,5 milhões de beneficiários.

A maior parte das famílias excluídas foi identificada pela assessoria técnica do PT no painel de monitoramento VIS Data, do Ministério do Desenvolvimento Social. O levantamento traz ainda outro recorte que revela a dimensão do problema para os grandes centros urbanos. A análise do total de excluídos nas 20 cidades com maior número de beneficiários do extinto auxílio emergencial mostra que São Paulo e Rio de Janeiro ganharam um contingente de desassistidos de 1,5 milhão e 1 milhão de famílias, respectivamente.

Em outras capitais, como Salvador e Manaus, esse número ultrapassa os 400 mil. E, em Brasília, onde pessoas imploram aos gritos por comida no meio da rua, o corte foi tão brutal que o número de benefícios caiu 81%, indo de 482,5 mil para 91,1 mil, gerando a exclusão de mais de 391 mil famílias. Não é preciso ser especialista para concluir que, inevitavelmente, o problema da fome se agravará ainda mais, uma vez que o desemprego segue alto e o preço dos alimentos não para de subir.

Vale destacar que o número de excluídos pode ser ainda maior, uma vez que o PT não teve acesso ao total de famílias por município que continuaram recebendo o Bolsa Família durante a vigência do auxílio emergencial. A presidenta nacional do partido, deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR), pediu os dados ao governo.

Bolsonaro criou o Auxílio Brasil com objetivos claramente eleitorais, para ter o que mostrar na campanha do ano que vem. Tanto que os recursos para pagar os R$ 400 por mês que prometeu só vão durar até dezembro de 2022, fechadas as urnas. Isso se esse dinheiro sair, pois o governo depende da aprovação da PEC dos Calote. O governo pagou em novembro apenas R$ 200 como benefício aos 14,5 milhões que não foram excluídos do Auxílio Brasil.

Como Bolsonaro e Guedes não têm um plano para alavancar o crescimento e gerar empregos, a perspectiva é de um cenário aterrorizante em 2022. Segundo agentes do próprio mercado financeiro, o país será o último em crescimento do PIB entre os emergentes. Projeções de Bradesco, Goldman Sachs, Capital Economics, Fitch Ratings e Nomura variam entre 0,8% e 1,9%, em cenário otimista.

Para o economista William Jackson, da consultoria britânica Capital Economics, a inflação e a pandemia afetaram as economias, mas “no Brasil, tudo isso parece um pouco mais extremo”.

A economia nacional acumula os sintomas da derrocada. Na ponta mais fraca da corda – a dos trabalhadores – cada vez mais pessoas contraem dívidas. É o que aponta a Radiografia do Endividamento das Famílias da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo.

“Com a queda na renda, o povo está precisando se virar e lançou mão de crédito pra pagar contas e colocar comida na mesa. O cenário é de endividamento que atinge maior nível em 11 anos, 71% das famílias. Agora com essa carestia toda, desemprego a situação tende a ficar ainda pior”, alerta Gleisi.

No primeiro semestre deste ano, 71,4% das famílias entrevistadas pelos técnicos da Fecomércio-SP apresentaram algum grau de endividamento. Desde o início da série histórica, em 2010, nunca antes tantos estiveram tão “pendurados” em dívidas. E a um nível 15,6%, ou 9,7 pontos porcentuais (p.p.), superior à média registrada no mesmo período entre 2010 e 2020.

Em um universo de 16,8 milhões de lares, quase 12 milhões tinham dívidas no fim de junho. São mais 733,9 mil famílias em relação ao mesmo mês de 2020 e 1,36 milhão, se comparado a 2019. Em dois anos, o total de lares com dívidas aumentou 11,5%.

Em junho de 2019, o porcentual de famílias brasileiras endividadas nas capitais era de 64,1%. Em 2020, passou para 67,4%. Oito das 27 capitais, aponta a pesquisa, alcançaram a maior taxa histórica – Rio Branco é a pior, com 92% das famílias endividadas.

Embora o percentual de famílias com atraso no pagamento tenha caído de 26,3% para 25,6% (4,3 milhões em termos absolutos), entre junho de 2020 e junho de 2021, o cenário de menos renda e mais inflação, com a decorrente elevação dos juros, aponta para retração econômica e mais endividamento e inadimplência nos próximos meses.

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