Organizados pelo Instituto Cultura e Democracia e pelas fundações Perseu Abramo e Friedrich Ebert-Brasil, os seminários Cultura e Democracia têm a participação de artistas, intelectuais e líderes políticos

 

 

O Brasil vive uma situação política muito grave e de extensão maior do que se imagina. A cultura, compreendida como fazer e expressão do conhecimento, seja popular ou erudito, está sob forte e muito bem articulado ataque. Uma guerra que se amplia por várias partes do mundo. O modelo de democracia que é tido como exemplo para a maioria dos países é uma farsa e sua manutenção não levará os povos a um cenário de liberdade e justiça.

A esquerda brasileira parece não ter se dado conta ainda da profundidade da crise, daí a timidez das respostas que apresenta. Enquanto isso, a ciência e a sociedade não têm conseguido estabelecer um diálogo capaz de fazer frente a questões tão evidentes quanto negadas, como a crise climática. Por fim, as eleições de 2022 não representarão saída suficiente para essas questões.

Entre os dias 8 e 12 de novembro, os debates dos Seminários Cultura e Democracia resultaram em diagnóstico sombrio da realidade brasileira neste início da segunda década do século 21. Muitas inquietações marcaram as participações de artistas, intelectuais, lideranças indígenas, políticos e acadêmicos nesta série de encontros promovida pelo Instituto Cultura e Democracia e pelas fundações Perseu Abramo e Friedrich Ebert. Os debates serão retomados a partir desta terça-feira, 16, e seguem até o dia 19, em plataforma digital.

Os desafios da retomada da participação e fruição democráticas são imensos, de acordo com as intervenções de intelectuais como Gilberto Gil, ex-ministro do governo Lula e mais novo imortal da Academia Brasileira de Letras, a filósofa e professora Marilena Chauí, o ex-ministro Tarso Genro, cientistas como a matemática Tatiana Roque e o físico Yurij Castelfranchi e da poeta mexicana Irma Pineda Santiago e do escritor brasileiro Ailton Krenak, dois líderes indígenas reconhecidos internacionalmente.

Organizados para apontar caminhos para a ação da cultura como parte integrante da democracia e fator de ampliação do horizonte democrático, os seminários sinalizaram a necessidade de reinvenção do Brasil. Para alguns dos participantes, o país precisa de uma refundação. No meio do caminho, terá de lidar com condicionantes externas e internas, como a profunda alteração nas relações humanas produzida pelas novas tecnologias, hoje amplamente manipuladas pelas classes dominantes e por um diminuto conjunto de corporações, fazendo do mundo virtual um espaço de fragmentação, cinismo e apagamento da história, incluindo a própria história do trabalho. Terreno fértil para a mentira como forma de governar e fazer política.

As respostas exigidas para esse cenário não se encontram mais nas fórmulas utilizadas antes. Para Gilberto Gil, será preciso adotar “um novo arranjo de modernização progressista”, em substituição ao modelo conservador adotado, segundo ele, nas últimas décadas. Para Krenak, será necessário rejeitar o modelo democrático tal como proposto pelos cânones ocidentais. “O discurso social dessa democracia é como uma roupa folgada onde caberia todo mundo, mas onde a desigualdade está por todos os lados”, nas palavras do líder indígena.

Para Marilena Chauí, deverá ser retomada a importância da diferenciação entre verdadeiro e falso, entre bom e mau, inerente ao pensamento transformador. Já Laymert Garcia dos Santos, sociólogo e professor da Unicamp, aponta que há uma verdadeira guerra em curso no Brasil. “É dada pouca atenção a uma inversão que ocorreu no Brasil, contida na frase ‘a guerra é a continuação da política por outros meios’. Essa inversão está sendo negligenciada, inclusive no campo da cultura. As reações ainda são muito tímidas”, disse.

Juca Ferreira, ex-ministro da Cultura e presidente do Instituto Cultura e Democracia, principal articulador dos seminários, acredita que o Brasil reclama um novo começo. “Nós precisamos aprofundar a democracia, que nunca chegou a toda a população. Por isso é preciso uma mudança de paradigmas, de valores, de visão de mundo, de comportamento. Por isso que a gente diz que a cultura é central no processo de emancipação do país. O Brasil precisa ser refundado”.  As mesas dos seminários são transmitidas pelos canais no Youtube e nos sites das entidades organizadoras, da Mídia Ninja e da TAL (Televisión Latino-Americana) e reprisadas pela TV Fórum.