Antes da Lava Jato, o setor de construção pesada respondia por 50% da formação bruta de capital fixo do país. O país perdeu, desde o início da operação, R$ 170 bilhões em investimentos

 

O capitalismo brasileiro sempre foi um capitalismo de Estado. Fundos e políticas estatais sempre tiveram presença no desenvolvimento da economia brasileira e não foi diferente com o setor da construção pesada. Na ditadura civil-militar formou-se o oligopólio das grandes empreiteiras que, mais tarde, se expandiram para outros ramos da infraestrutura, sempre fomentadas por governos via contratos públicos, empréstimos, financiamentos e parcerias de investimento.

Ocorre que as relações entre público e privado no setor — como em alguns outros — eram permeadas por má governança. Cristalizou-se com o tempo uma relação simbiótica em que empresas faziam doações eleitorais e, por vezes, pagavam propinas para obter contratos públicos, investimentos e financiamento, contando ainda que as doações — lícitas e ilícitas — garantiria boas relações com os governantes, de modo a evitar problemas com a administração pública e obter regulação favorável.

Esse cenário se desenvolve enquanto se cria, na sociedade brasileira, uma permanente frustração com a corrupção, percebida por vezes como o problema mais grave do país e razão principal de nosso subdesenvolvimento. Diversas campanhas eleitorais — de Jânio Quadros a Sérgio Moro, passando por Fernando Collor — tinham como principal mote o combate à corrupção. Na mídia, escândalos de corrupção sempre rendem matérias suculentas.

Nesta dinâmica, o Brasil foi adotando diversas leis voltadas a combater a corrupção e a criminalidade de colarinho branco, sem se preocupar em coordená-las muito bem, calcada na ideia de que mais controle seria sempre melhor. Foi assim que aprovamos em 2013 as Leis 12.850 e Lei 12.846. Tais normas seguiam recomendações de órgãos internacionais de adoção de acordos de delação e leniência, por serem instrumentos que trariam efetividade ao sistema de justiça.

Com a promulgação da Lei Anticorrupção, adotamos o padrão americano de combate ao suborno transacional para enfrentar a corrupção doméstica, mas nos esquecendo que os Estados Unidos têm uma legislação eleitoral e de lobby detalhada, evitando que toda e qualquer doação eleitoral possa ser tida e condenada como corrupção. Além disso, os EUA também têm um sistema legal voltado a preservar a empresa que faz acordo de leniência, impedido sua bancarrota.

A partir da apuração de esquemas de corrupção na Petrobrás, a Força Tarefa da Lava Jato obteve a prisão de executivos da empresa estatal, que começaram a fazer suas primeiras colaborações. Algumas condutas delatadas realmente eram esquemas de corrupção. Outras não. Não tratavam da compra de um ato do agente público, mas do esquema maior de captura por agentes privados, como mencionado acima.

A narrativa hiperbólica de que a Lava Jato estava a investigar um grande esquema de corrupção ganhou a mídia e, com isso, forte apoio da opinião pública. Além do Ministério Público Federal, outros órgãos de controle instauraram processos de responsabilização das grandes construtoras, sem que houvesse uma coordenação capaz de fazer com que, feita a leniência com uma autoridade, a empresa estaria livre de novos processos e reabilitada a disputar contratos públicos.

Esses órgãos de controle, em franca disputa pela enorme projeção que a Lava Jato angariava, alegavam que não poderiam abrir mão da competência para responsabilizar as empresas, pois estariam defendendo o interesse público, que era irrenunciável. Esqueceram-se que o interesse público não corresponde apenas a ressarcir o erário, mas também a manter empresas funcionando, gerando empregos e investimentos.

Com isso, as construtoras perderam crédito e contratos, entrando em grave crise financeira. Antes da operação da República de Curitiba, o setor de construção pesada respondia por 50% da formação bruta de capital fixo do país. Não surpreende que, ao reduzi-lo drasticamente, o Brasil tenha perdido mais de R$ 170 bilhões em investimentos.

De forma equilibrada e republicana, era possível ter enfrentado a corrupção de forma menos desastrosa. Com mais reformas, menos punitivismo e menos espetáculo. Ao final, o que se produziu foi a campanha eleitoral mais cara do período republicano.

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