O presidente Jair Bolsonaro faz política pelas redes, como sabemos desde a campanha eleitoral de 2018. Avesso à imprensa, sua agressividade com jornalistas está fartamente documentada e já chama a atenção de organizações sindicais de jornalistas e até de organismos internacionais de direitos humanos.

O “gabinete do ódio” não apenas atua nas redes sociais mais conhecidas, como Facebook, Twitter, Instagram, Youtube e as duas mais importantes de mensagem direta — Whatsapp e Telegram —, como prospecta e ocupa qualquer nova rede social. Ágeis para disseminar “as verdades” sobre o “mito” que não vêem nos meios de comunicação de massa — todos, segundo eles, dominadas pelo “comunismo”, mesmo aqueles francamente conservadores —, os bolsonaristas fazem comunicação de nicho: pregam para convertidos, fidelizam seu núcleo duro e mais radical.

A semana em que o governo federal tentou comemorar seus os 1000 dias de Jair Bolsonaro na Presidência — com o presidente vaiado na tentativa de discursar em Belo Horizonte — foi aberta com uma capa de revista de grande circulação nacional com um presidente amansado, pose de estadista, e as seguintes aspas: “A chance de um golpe é zero”. Ele terminou a semana com mais uma frase lapidar no cercadinho do Alvorada: “Quando invadirem tua casa, tu dá tiro de feijão nele”. A blague é uma referência às críticas ao seu armamentismo e à obsessão familiar de aparecer nas redes sociais empunhando revólveres.

Depois do anticlímax do 7 de Setembro, quando Bolsonaro, mais uma vez incitou seus seguidores e acólitos a ir às ruas para “derrubar o STF” e, logo em seguida recuou, com a divulgação de uma carta, escrita em parceria com o golpista Michel Temer, na qual tenta amenizar o tom contra o Judiciário, o Índice de Popularidade Digital, medido pela consultoria Quaest, mostra uma queda em V. Se as manifestações do Dia da Independência fizeram Bolsonaro chegar ao seu segundo melhor patamar desde o início do ano, com 81,8 pontos, logo em seguida, três dias depois, no em 10 de setembro, caía a 37,1, a pior marca de Bolsonaro em 2021.

Para entender queda de popularidade que marcou o mês de setembro, Focus Brasil conversou com o consultor de redes sociais Pedro Barciela. Ele faz monitoramento quantitativo e qualitativo de redes desde 2014. O especialista avalia que o bolsonarismo nas redes está em queda constante desde um período que define como “o meio da pandemia e o início da CPI da  pandemia”. 

Entre o Feriado da Independência e a semana posterior, eis a análise de Barciela: “O que existiu foi uma inflamação da base bolsonarista no período anterior ao 7 de Setembro. E, como se  esperava-se um clímax que não houve, o que aconteceu foi um arrefecimento normal. Não tem como manter a temperatura naquele grau pré-7 de Setembro. O bolsonarismo não vive do clímax, ele vive do flow, dessa constante incitação de tensão do debate político… Por isso, acredito que não existiu esse crescimento da popularidade ou de qualquer avaliação positiva do Bolsonaro no período anterior ao 7 de setembro”.

Se o bolsonarismo está em baixa, como também já indicam as pesquisas eleitorais, como a extrema-direita vai se manter no jogo político até as eleições do ano que vem?

“O bolsonarismo tem muitos paralelos, muita correlação do que aconteceu com o Trump nos EUA. O trumpismo teve dois problemas: um, Trump perdeu a eleição. Outro, é que Trump não conseguiu fazer o que tentou com os EUA. Caso o bolsonarismo continue se guiando pelo que foi lá, está fadado ao fracasso. Por mais que tentem, estão tendo dificuldade muito grande porque perderam a capacidade de ditar — e olha que é um presidente da República, não é qualquer figura — a todo momento o que será o debate nas redes”, aponta o consultor.

Barciela prossegue: “O bolsonarismo tenta se fechar para dentro de si, no seu núcleo duro. Desde a eleição em 2018, vai rompendo com atores que já fizeram parte do grupo de aliados… O problema disso, pensando no período eleitoral, é que eles estão lascados, perdidos para compor no momento em que vão precisar falar com a maioria da população. Quando o bolsonarismo se fecha dentro de uma base muito sólida, mas que se limita ali no máximo a 25% das redes sociais, que é o tamanho desse núcleo duro do bolsonarismo, ainda que se proteja, terá uma dificuldade enorme de dialogar com outros agrupamentos para tentar impor a narrativa a que se propõem”.

A série de polêmicas criadas pelas revelações da CPI da Covid e que produzem manchetes dos grandes portais de notícia e a escalada dos telejornais — na semana que passou, a sequência de depoimentos da advogada Bruna Morato e do empresário Otávio Fakhoury foi especialmente quente de frases e gestos. Ou seja, na grande imprensa, erodem a imagem de Jair Bolsonaro e de vários de seus ministros e apoiadores no Legislativo.

Pergunto a Barciela, se e como a crise econômica tem aparecido nas análises que faz das redes: “Vou usar o exemplo da questão do combustível e do ICMS. Quando tentam impor que são os governadores são responsáveis pelo aumento porque o ICMS é um imposto estadual, essa tentativa de diálogo já vem de um agrupamento extremamente enviesado. E as pessoas já tem essa repulsa ao bolsonarismo hoje em dia. Ou seja, acabam não comprando.  Se tiver uma fazenda de robôs, com 50 mil bots falando sobre os benefícios do pepino no interior do Amazonas, posso gastar milhões de reais e não vai nunca uma pauta nacional  o benefício do pepino no interior do Amazonas. Eles necessitam que a versão deles seja incorporada por outros agrupamentos, por outros atores. Em outros momentos, tinham talvez o antipetismo como liga para fazer. Hoje, não têm mais”.

Faltam três para o país entrar no ano eleitoral e Bolsonaro será candidato. Para quais redes ou plataformas é preciso dirigir o olhar para entender a estratégia da extrema-direita? Segundo Barciela, a criação ou a migração do bolsonarismo para novas plataformas não é algo preocupante.

“Eles vão se isolar em guetos próprios, a partir dos quais vão ter cada vez mais dificuldade de dialogar com outras pessoas. Eu me interessaria, e acho que a Justiça tem de ir atrás de quem patrocina, de quem paga, de quem coloca dinheiro”, aponta. “A gente teve uma falácia em 2018, que perdurou durante muitos meses, que tudo era orgânico, que tudo teria sido feito sem financiamento de campanha… Esse discurso foi encampado por grande parte da imprensa. E isso era perverso demais. Vejam que o empresário Fakhoury, em seu depoimento à CPI, confessou doações. Foram 12 portais bolsonaristas para os quais ele doava R$ 200 mil aqui, R$ 150 mil ali…. Isso não tem nada de orgânico, não tem esse caráter amador que eles querem fazer acreditar. Tem alguém que financia, então se puxar vem”.

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