CPI recebe denúncia sobre pacto da morte. Segundo advogada, Bolsonaro e a Prevent tinham acordo para promover cloroquina, mesmo sem eficácia comprovada. Plano de saúde escondeu as mortes por Covid

 

A campanha negacionista do governo Bolsonaro em favor do vírus da Covid-19 – na suposição de que quanto mais brasileiros fossem contaminados, mais rápido o país chegaria a uma imunidade de rebanho e, com isso, retomar a atividade econômica – é muito mais engenhosa do que se imaginava. As revelações feitas à CPI da Covid na terça-feira, 28, são estarrecedoras e mostram uma perigosa estratégia digna dos filmes de terror.

Em depoimento à CPI, a advogada Bruna Morato revelou que o gabinete paralelo de Bolsonaro tinha um acordo com a operadora de saúde Prevent Senior para difundir a ideia de que a população poderia se proteger de uma infecção pelo vírus ou evitar um agravamento da doença com a adoção do chamado tratamento precoce. O Brasil tem quase 600 mil mortos pela Covid.

Aos senadores, Bruna Morato confirmou as denúncias de um grupo de médicos, reunidos em um dossiê enviado à CPI, de que a operadora obrigava os profissionais a receitarem o ‘kit covid’, que continha oito drogas ineficazes contra a doença, a pacientes. A utilização de idosos como cobaia para testes com os medicamentos, um experimento que remete aos horrores da Segunda Guerra Mundial, também foi confirmada pela advogada.

A operadora, de acordo com o relato, enviava os kits covid como parte de uma estratégia de redução de custos, evitando gastos com internações. Além disso, os pacientes ficavam no escuro quanto à informação de que participavam de um estudo sobre os efeitos das drogas. O dossiê também indica que houve adulteração das causas da morte nos atestados de óbito de diversos pacientes. À CPI, Morato afirmou que os profissionais estão sob constante ameaça e que até seu escritório foi invadido, como ato de represália por causa das denúncias. 

“Existia um plano para que as pessoas pudessem sair às ruas sem medo, por meio do aconselhamento de médicos ”, explicou. “A Prevent Senior iria entrar para colaborar com essas pessoas. É como se fosse uma troca, um pacto, uma aliança”, descreveu. Segundo a advogada, o Ministério da Economia não apenas tinha ciência do acordo, mas compartilhava do desejo de volta à normalidade.

“O fato novo é a relação do gabinete paralelo com o Ministério da Economia”, pontuou o relator da CPI, sendor Renan Calheiros (MDB-AL). “Era um alinhamento ideológico, a economia não podia parar”, concordou Morato. “Era preciso conceder esperança para que as pessoas saíssem às ruas. Essa esperança tinha nome: hidroxicloroquina”.

O senador Humberto Costa (PT-PE) apontou para a gravidade dos experimentos com a população, feitos pela Prevent Senior, com o conivente silêncio do Conselho Federal de Medicina (CFM) e o incansável incentivo de Bolsonaro.

Em abril de 2020, Bolsonaro chegou a divulgar os resultados de um suposto estudo da Prevent Senior com resultados positivos do tratamento precoce. Áudios ouvidos durante a sessão revelam que o diretor do instituto de pesquisa da operadora, Rodrigo Esper, pediu uma revisão do estudo feito com pacientes. “Os dados precisam ser assertivos e perfeitos porque o mundo está olhando pra gente”, disse. A advogada sustenta que a operadora alterou dados dos pacientes em seus relatórios.

Em maio, Bolsonaro compareceu ao Supremo Tribunal Federal com empresários para defender uma agenda de retomada da economia, ao lado do general Walter Braga Netto, peça-chave na engrenagem da catástrofe. Sob a coordenação de Braga Netto na Casa Civil, no entanto, não foi a economia que disparou mas o implacável contador de mortos por Covid-19. Em 30 de março, um dia após sua saída do cargo, o Brasil batia mais um recorde de mortes diárias (3.801), acumulando 317,6 mil óbitos no total. Missão cumprida, como atestou o general Eduardo Pazuello, meses depois, na CPI. Pelo papel de Braga Netto na tragédia, a CPI estuda sua convocação à comissão.

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