Impacto da MP 936/2020 na renda e na massa salarial
Por: Arthur Welle, Ana Luíza Matos de Oliveira, Ana Paula Guidolin, Felipe Da Roz, Guilherme Mello, Pedro Rossi, Ricardo Gonçalves
Em meio à pandemia do Covid-19, governos do mundo inteiro têm apresentado propostas de mitigação dos efeitos econômicos recessivos decorrentes do processo de isolamento social. O desafio é promover um “resfriamento controlado” da economia que permita o isolamento social do maior número de pessoas, ao mesmo tempo em que se garanta o emprego e a renda dos trabalhadores desmobilizados, assim como a saúde financeira das empresas. Para isso, os diferentes governos procuram “estatizar os fluxos de renda” (Mello et alli, 2020), garantindo através de recursos públicos a renda das empresas e famílias.
Dentre as diversas medidas econômicas adotadas pelos governos, destacam-se a implementação de uma “renda básica emergencial”, a concessão de crédito subsidiado às empresas e famílias, a injeção de liquidez nos mercados financeiros, o adiamento da cobrança de taxas e impostos e medidas de compensação salarial aos trabalhadores formais da iniciativa privada.
No caso brasileiro, após a aprovação por parte do Congresso Nacional do auxílio emergencial (sancionado pelo presidente como Lei 13.982/2020) e da aprovação na Câmara dos deputados da PEC 10/2020, que permite ao Banco Central atuar diretamente nos mercados secundários de títulos privados e retira os limites impostos pelas rígidas regras fiscais brasileiras, o governo Bolsonaro apresentou a MP 936/2020, que regulamenta a redução de jornada de trabalho e salário dos trabalhadores formais do setor privado.
Esta nota tem por objetivo analisar os possíveis efeitos da Medida Provisória (MP) 936/2020 sobre a renda dos trabalhadores e a massa salarial do setor privado formal. Também busca-se analisar qual será a participação do governo e o custo da compensação na queda da renda dos trabalhadores, uma vez que uma parte da redução salarial será compensada pelo oferecimento proporcional de parcelas do seguro desemprego.
Entre as principais conclusões estão a de que a compensação pública pelo pagamento proporcional de parcelas do seguro-desemprego será insuficiente para igualar a renda inicial do trabalhador, a não ser para trabalhadores que recebem o salário mínimo. Com isso, tanto a renda dos trabalhadores quanto a massa de salários do setor privado devem apresentar redução.
Os trabalhadores que ganham três salários mínimos podem apresentar uma queda de renda entre 10,5% e 42,2%, a depender do cenário de redução da jornada e dos salários. No caso de renda equivalente a cinco salários mínimos, a perda salarial pode alcançar até 65,3% da renda inicial do vínculo, ou seja, o trabalhador com salário mensal de R$ 5.225,00 passaria a receber R$ 1.813,03.
A partir de simulações com os dados da RAIS e da CNAE 2.0, mostra-se que a queda na massa de salários do setor privado formal pode variar entre R$ 7,4 bilhões (representando redução de 9,4% da massa salarial original) e R$ 21,7 bilhões (27,7% da massa salarial original), a depender da aderência das empresas ao programa.
Por sua vez, o custo fiscal do programa poderá ficar entre R$ 12,2 bilhões (0,2% do PIB) e 39,7 bilhões (0,6% do PIB) ao mês, dependendo do cenário analisado.
Para evitar perdas à massa salarial, o governo teria que elevar sua participação na renda dos trabalhadores, mantendo-a o mais próximo possível de seu salário original. O custo fiscal extra estimado para manter a massa salarial inalterada no cenário considerado mais realista seria de apenas 0,2% do PIB ao mês, muito inferior ao de outras ações já anunciadas para bancos e o setor financeiro.
É plenamente factível e justificável a expansão da participação pública no programa de garantia de renda para os trabalhadores formais. Os custos de manter a massa salarial mais próxima da original poderão ser compensados mais adiante, com uma retomada mais rápida e vigorosa do crescimento dada a preservação dos empregos e da renda das famílias hoje.
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