Por uma ética petista

O presente texto não tem a pretensão de esgotar o debate sobre a ética petista, mas de localizar (e combater) a possibilidade de que a discussão sobre a ética partidária e política entre nós seja dominada por valores assimilados de nossa convivência institucional e, conseqüentemente, despreze as acumulações da esquerda sobre o assunto.

Há uma tendência expressa em algumas teses apresentadas para o III Congresso do PT, de dialogar com os reclamos de setores da sociedade civil e da mídia que pregam uma ética na política totalmente dissociada da disputa pelo poder e da construção de um novo Estado e de uma nova sociedade.

A ética na política do senso comum, apregoada por parte da sociedade civil e pela mídia, parece inodora e neutra, mas não o é. O lado que esses setores escolheram, desde sempre, é o lado dos ocupantes do poder, o lado das classes dominantes.

Para esse raciocínio, qualquer desvio ético de figuras como Jorge Bornhausen ou Antonio Carlos Magalhães são simples acidentes de percurso em carreiras políticas e empresariais coroadas pelo sucesso. Ao mesmo tempo, qualquer denúncia (ainda que não devidamente comprovada) contra militante ou dirigente do PT merece (sempre) a mais exemplar punição.

Propostas como a de criação de uma corregedoria interna com poderes de investigação sobre os atos dos petistas ou de eleição em separado dos membros do conselho de ética nas instâncias do PT dialogam com a ética do senso comum e flertam com o clamor da mídia e de setores da sociedade civil que defendem a punição exemplar de petistas envolvidos por denúncias sem comprovação e, em outros casos, ainda sem o devido processo legal. Há ainda, nessas idéias, a tentação imperdoável de um acerto de contas com nosso passado recente, especificamente contra adversários internos.

O III Congresso do Partido dos Trabalhadores precisa rejeitar essas propostas. Seria o mesmo que aceitar que nossos inimigos de classe nos dessem as armas para que nós liquidássemos nossos próprios companheiros. Seria equivalente a colocarmos para funcionar, entre nós, aparelhos de repressão e de tortura psicológica a serviço das instituições da sociedade liberal.

Seria trágico assistir (ao vivo) a um programa jornalístico da televisão em que os personagens, réus e juízes, fossem todos filiados ao PT. Se a instância do Partido decidisse por realizar uma sessão secreta a situação poderia ser pior. Seríamos acusados de esconder da opinião pública as acusações contra o companheiro que ocupasse o lugar de investigado.

As denúncias envolvendo petistas em cargos institucionais e eletivos são resultantes de um modelo político e eleitoral ultrapassado que precisa ser reformado. É isso que está em debate na reforma política.

A defesa do voto em lista, do financiamento público das campanhas eleitorais, da fidelidade partidária, da participação popular e do controle dos cidadãos sobre o Estado podem ser boas vacinas contra esses casos. Não há porque tratarmos de casos isolados, sujeitos ao sensacionalismo da mídia e à hipocrisia dos corruptos de sempre.

No PT a ampliação da democracia interna e o exercício da transparência no exercício dos mandatos públicos e no cumprimento de tarefas dos dirigentes partidários serão suficientes para prevenir a contaminação de nossos militantes e dirigentes com valores e práticas da política tradicional.

José Claudio de Paula (São Paulo-SP) é jornalista