Existe uma irrefutável relação entre as aceleradas mudanças e transformações do nosso tempo, catalisadas pelos avanços científicos, tecnológicos e inovativos e as possibilidades de chegarmos ou não a um mundo inclusivo, colaborativo e sustentável. Que deixam também evidente a agigantada dependência relacional entre as questões chamadas econômicas, sociais, culturais e ecológicas que, quando dispersas e desconectadas, são capazes de desencadear efeitos e conflitos incontroláveis.

Vive-se a originalidade radical de uma época onde a atividade humana é uma das principais forças geofísicas de alterações dos grandes ciclos do planeta, expressas na biodiversidade, no aquecimento global, na questão da água, nas necessidades de energias renováveis, na crise sanitária, dentre outras. Daí decorre a importância da compatibilização entre inovação e sustentabilidade. Quando isso não ocorre, precipita-se a decomposição do já frágil tecido social e econômico das relações em sociedade, produzindo impactos à humanidade que poderão custar muito mais para resolvê-los do que os pretensos benefícios que estaria buscando trazer.

Avanços científicos e desenvolvimento sustentável necessitam muita aderência e atenção, para que se possa interditar as escaladas de ameaças à biosfera em todas as suas formas.  Por isso necessitamos de lideranças e governanças informadas por evidências científicas e com aptidão de preparar gestores públicos com habilidades de prevenir e manejar eventuais desastres (des) naturais. Criando uma cultura talentosa na sociedade para compreender e reconhecer mais a contribuição que a ciência já deu e dará à humanidade. Isto fica evidenciado hoje na celeridade com que foram desenvolvidas as vacinas para enfrentar a infeliz pandemia que nos assola.

Sem pretender ser uma verdade absoluta, o aforismo que segue parece ser quase irrefutável: “Países que investem prioritariamente em pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I), sabem o quanto isto pode contribuir para construir sua soberania e independência como Nação”. Sobretudo, ancorando-se nos ativos intangíveis da era que vivemos: o conhecimento e o fazer ciência para desenvolver suas próprias tecnologias e transformar em inovação.

Ainda que exemplos possam ser reducionistas, vivemos um período da história em que tais evidências saltam aos olhos. E, para ancorar esta assertiva, vejam o trabalho da revista científica britânica Nature, que atualiza periodicamente um gráfico simbólico, que traz no seu eixo horizontal “o percentual de dispêndios em PD&I dos países em relação ao seu PIB” (Produto Interno Bruto) e, no eixo vertical, “número de pesquisadores por milhão de habitantes”, revelando uma forte relação causal entre investimentos em pesquisas e padrão de desenvolvimento de uma Nação.

Ponteando o ranking estão aqueles países que tradicionalmente nominamos de desenvolvidos: Alemanha, Estados Unidos, Dinamarca, Finlândia, Israel, Suécia, França, Coréia, dentre outros. E aproximando-se para ingressar no grupo, China e Rússia. Exatamente aqueles que têm uma posição de apoio à ciência e, com base nela, enfrentam com rigor e firmeza a tragédia sanitária da Covid-19 que assola a humanidade.

E, enquanto tais países veem a ciência como um enorme valor para a vida das pessoas, aqui no Brasil, contrario sensu, o Orçamento da União sofre o maior ataque de sua história, que está nos levando a um célere desmonte de instituições e centros de pesquisas, fundamentos de base para PD&I.

Os dados são do próprio Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Os investimentos caíram para a terça parte, de 2015 a 2020. E, se isso não bastasse, renuncia-se também fortes acúmulos e investimentos já feitos na área da microeletrônica, como a CEITEC S/A em solo riograndense, estratégica no programa de microeletrônica do Estado brasileiro e na superação da dependência tecnológica do país.  Incompreensivelmente, logo quando vive-se mundialmente a maior crise na produção e demandas por chips.

De duas, uma. Ou alteramos o nível de compreensão dos indivíduos, governos, empresas, organizações e sociedade, para que os avanços do nosso tempo possam ser usados para o bem de todos, ou seguiremos à deriva, num mundo com ciência forte, mas com consciência local débil. Naufragando na visão ideológica anti-indústria endógena, que acredita que país não deve inovar, uma vez que pode buscar tudo fora. Equilibrando-se instavelmente na colonial lógica das commodities, que só amplifica a já em curso ”modernização” dependente e submissa.

Na onda do intenso, desumano e desapiedado jogo do poder regressivo e obscurantista que, sempre de plantão, está pronto para se sobrepujar à soberania e à independência das nações, amplificando a desesperança e a ausência de perspectiva de futuro para os nossos já desprotegidos povos.

Só com muita compreensão e fortes investimentos em ciência como um valor para as nossas sociedades, estruturados como um dos pilares de uma Nação soberana, é que superaremos nossos enormes desafios. Sobretudo para podermos viver num planeta colaborativo, desenvolvido sustentavelmente, inclusivo, solidário e mais humano.

`