O Haiti mergulha em uma nova espiral de violência com a morte do presidente Jovenel Moise. A conspiração que levou à eliminação física do chefe de Estado envolve mercenários treinados pelos EUA, haitianos-americanos e, suspeita-se, até o primeiro-ministro

 

O mundo se pergunta o que está acontecendo no Haiti. Na quarta-feira, 7, o presidente Jovenel Moïse foi morto a tiros por agressores não identificados na residência oficial do governo, na calada da noite. O primeiro-ministro interino, Claude Joseph, anunciou ainda que a esposa de Moïse, Martine, ficou ferida no ataque ocorrido no bairro de Pelerin, em Porto Príncipe. Ela foi internada. Em um comunicado oficial, Joseph afirmou que está no comando do país e pediu calma à população, acrescentando que a polícia e o Exército já têm o controle da situação.

As investigações mostram que o crime foi tramado aparentemente por gente graúda. Na sexta-feira, 16, autoridades colombianas identificaram um ex-oficial da inteligência haitiana como o homem que ordenou que dois ex-soldados colombianos matassem o presidente. Ex-oficial da inteligência, Joseph Felix Badio disse a dois soldados colombianos que eles “prenderiam” o presidente. A informação é do general Jorge Luis Vargas, chefe da polícia nacional da Colômbia.

Segundo o militar, alguns dias antes da operação de sequestro de Moïse, o plano mudou. Badio teria ordenado aos ex-soldados Duberney Capador e Germán Alejandro Rivera Garcia, que eles “tinham que assassinar o presidente do Haiti”. As palavras são do general Vargas.

Numa reviravolta surpreendente, o próprio primeiro-ministro interino passou a ser investigado como suspeito de mandar matar Moïse para tomar o poder. Joseph deixaria o cargo no dia em que o presidente foi morto. Dois dias antes, o presidente havia nomeado Ariel Henry como próximo primeiro-ministro do país —o sétimo em quatro anos—, substituindo assim o atual. Com a morte do líder haitiano, a troca não aconteceu, ainda que Henry reivindique o posto.

A investigação foi revelada na quarta pelo canal de notícias Caracol, da Colômbia. Mais de 20 ex-militares do país estão envolvidos no assassinato, 18 dos quais permanecem presos, e três foram mortos. Após a publicação da reportagem, a polícia haitiana, subordinada ao atual premiê, negou a informação

As autoridades colombianas não descreveram a fonte das informações. No início da semana, funcionários da inteligência e do Ministério das Relações Exteriores da Colômbia disseram ao The New York Times que não puderam entrevistar os suspeitos colombianos. A polícia haitiana emitiu um aviso de “procurado” pela prisão de Badio, acusando-o de assassinato. E acusa ainda o oficial de organizar a logística, adquirir veículos e coordenar a operação do esquadrão assassino.

O complô para o assassinato de Moïse começou há meses. Várias das figuras centrais sob investigação pelas autoridades haitianas em conexão com o assassinato do presidente se reuniram nos meses anteriores ao assassinato para discutir a reconstrução da nação conturbada depois que o presidente estivesse fora do poder. As informações são da polícia haitiana, oficiais de inteligência colombianos e participantes das discussões.

Realizadas na Flórida, nos EUA, e na República Dominicana, no ano passado, os encontros parecem conectar um conjunto aparentemente distinto de suspeitos na investigação, ligando um médico e pastor de 63 anos, um vendedor de equipamentos de segurança e um corretor de hipotecas e seguros na Flórida.

Todos foram identificados pelas autoridades haitianas como atores importantes em uma trama para assassinar Moïse com a ajuda de mais de 20 ex-comandos colombianos para tomar o poder político depois disso. Não está claro como as pessoas sob investigação poderiam ter feito isso, ou que apoiadores poderosos eles podem ter tido para tornar isso possível.

Mas entrevistas com mais de uma dúzia de pessoas envolvidas com os homens mostram que os suspeitos trabalharam juntos por meses. Apresentavam-se em termos grandiosos e muitas vezes exagerados como corretores de poder bem financiados e bem conectados, prontos para liderar um novo Haiti com influentes americanos dando suporte.

Na quinta-feira, a polícia colombiana revelou que um dos detidos, o ex-agente do exército colombiano Germán Alejandro Rivera Garcia, recebeu dinheiro dos Estados Unidos para organizar a viagem das pessoas que entraram na residência e mataram o presidente. “Dentro da análise e das informações recebidas, há uma quantia aproximada de 50 mil dólares que Germán Rivera recebeu dos Estados Unidos”, disse o General Vargas.

Na sexta-feira, o jornal Washington Post revelou que um haitiano que vive nos EUA, detido na investigação de assassinato, financiou a equipe de ‘segurança pessoal’. Documentos obtidos pelo diário estadunidense mostram propostas para que duas firmas da Flórida fornecessem “oficiais militares privados” a Christian Emmanuel Sanon. O Pentágono admitiu que militares dos EUA já treinaram colombianos implicados no plano de assassinato.

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