Governo anuncia discordância com países ricos; pesquisadora ambiental fala das expectativas e da necessidade do país fazer a lição de casa 

Do financiamento global à adaptação climática: o que o Brasil vai debater na COP29 
Foto: Patrick Hendry/Unsplash

No mês que vem, entre 11 e 22 de novembro, será realizada mais uma COP, que é a conferência global do clima organizada pela Organização das Nações Unidas, a ONU, com a participação de todos os países signatários. A edição 29 do encontro será realizada em Baku, capital do Azerbaijão. Na semana passada, em coletiva de imprensa, o governo brasileiro falou sobre as expectativas e o posicionamento do Brasil na COP 29. 

A secretária de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente, Ana Toni, e o secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Itamaraty, o embaixador André Corrêa do Lago, pontuaram que o tema central da conferência neste ano será a questão do financiamento para as medidas que visam combater globalmente o avanço das mudanças climáticas, com foco no aquecimento do planeta. 

Os representantes do governo afirmaram que o posicionamento do Brasil será de discordância com os países ricos, que esperam que a conta seja dividida também entre os países em desenvolvimento, o que incluiria o Brasil. “Os países desenvolvidos decidiram levar a discussão em uma direção que os países em desenvolvimento não aceitam: dizer que nesta nova etapa o tema principal é aumentar a base de países doadores”, disse o embaixador.

Ana Toni destacou que “isso não é aceitável de jeito nenhum” ao comentar a tentativa dos países ricos de transformar uma contribuição voluntária em obrigatória. A visão brasileira não é isolada, apontaram o Itamaraty e a pasta do Meio Ambiente. A China e o grupo G77, que reúne países em desenvolvimento, estão fechados no sentido de refutar a proposta de alteração. 

Do financiamento global à adaptação climática: o que o Brasil vai debater na COP29 
A secretária de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente e o secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Itamaraty, o embaixador André Corrêa do Lago Fotos: Reprodução MMA/COP

Do Acordo de Paris até agora

O modelo de financiamento, que ainda está vigente, previa o investimento de 100 bilhões de dólares dos países ricos de 2020 até 2025, e foi instituído a partir do Acordo de Paris. Em substituição ao Protocolo de Kyoto, o Acordo de Paris foi debatido na COP 21 e começou a valer em 2016, com a perspectiva de criar mecanismos para a redução dos gases do efeito estufa. Os países em desenvolvimento, no entanto, indicam que o acordo não foi completamente cumprido.

Dentre as metas do acordo, foram elaboradas as NDCs, que são as Contribuições Determinadas a Nível Nacional, e tratam das metas domésticas que cada país se compromete a cumprir levando em conta suas possibilidades; o que pressupõe, segundo especialistas, colocar políticas efetivas na mesa.

Para a pesquisadora Mariana Belmont, é importante destacar o tema da adaptação climática, que ela aponta como “o patinho feio” das negociações do clima. “Em adaptação, os países precisam fechar as metas globais, e será necessário incluir o que considero central nas discussões, um olhar para o combate às desigualdades raciais, de gênero e territórios nos textos e nas ações efetivas”, defende. 

“Estamos vendo cidades inteiras sendo arrasadas pelos eventos climáticos, adaptação não é só infraestrutura, é combate às desigualdades históricas coloniais”, ressalta Belmont. 

Organizadora do livro “Racismo Ambiental e Emergências Climáticas no Brasil” (Oralituras, 2023), Mariana Belmont é ativista em movimentos e organizações que discutem questões das periferias e atuou em cargos relacionados às questões ambientais e de habitação na Prefeitura de São Paulo. Ela participou da COP 28, em Dubai, enquanto representante da sociedade civil brasileira. 

“Os espaços fora das salas de negociação nos dão a possibilidade de confluência, troca e pressão para os países. As negociações continuam por lá também”, explica a pesquisadora, que acredita no poder de articulação entre as organizações sociais no sentido de pressionar governos. 

Sobre o tema da adaptação, Ana Toni, secretária do MMA, destaca que poucos países têm planos nacionais elaborados. No Brasil, a pasta do Meio Ambiente afirma que o Plano Clima busca identificar alternativas em termos de custos e efetividade para o país cortar emissões, levando em conta ações como o fomento a práticas de agropecuária de baixo carbono, o aumento da eficiência energética, a oferta de hidrogênio verde e uso de outros combustíveis de baixa emissão, até a coleta seletiva de lixo e o aproveitamento energético dos resíduos sólidos. 

Outro assunto que deve estar na pauta dos principais debates da COP 29 é o mercado de carbono. O Brasil possui a maior área de floresta tropical do mundo, o que faz com que o país tenha protagonismo a partir do papel fundamental desempenhado pelo bioma amazônico. Para a secretária de Mudança do Clima, o mercado internacional está andando com mais celeridade, enquanto, por aqui, há no Senado a discussão do PL nº 182/2024 que trata da regulamentação do tema. 

Brasil e a COP 30

Para Belmont, a realização da COP 30 no Brasil, em Belém, capital paraense, coloca uma camada extra na necessidade de uma liderança brasileira no processo internacional. O país que sedia a conferência também preside os trabalhos. “Haverá pressão para dar o exemplo dentro de casa, colocando o pé na porta para cobrar que os países ricos coloquem dinheiro nas negociações e parem de recuar”, opina. 

Do financiamento global à adaptação climática: o que o Brasil vai debater na COP29 
Divulgação ONU

Além disso, a ativista ambiental compartilha suas expectativas para a participação do país no evento: “espero que o governo brasileiro entregue participação social para a sociedade, além de mostrar internacionalmente o que é uma construção política com visão de futuro e uma negociação inclusiva e participativa, que não seja feita a portas fechadas.” 

E para as políticas que considera como lição de casa urgente do Brasil: “temos falhas absurdas como  território quilombola sem titulação, marco temporal batendo na porta e territórios indígenas sem demarcação”, elenca Belmont. 

COP 16, na Colômbia

Além da Conferência das Partes, em novembro, haverá outra conferência que irá tratar de um assunto ambiental bastante caro globalmente, que é a questão da biodiversidade. A Conferência das Nações Unidas para Biodiversidade, também chamada de COP, está na 16ª edição, realizada na Colômbia, com início nesta segunda-feira (21) e encerramento em 1 de novembro.

Após sofrer um acidente doméstico e cancelar a viagem para a Rússia, onde participaria da Cúpula dos Brics, o presidente Lula anunciou que deve participar da edição colombiana da COP da Diversidade. Segundo interlocutores do Planalto, o chefe de Estado brasileiro pretende chegar ao país na terça-feira (29), a presença deverá ser confirmada após novos exames e autorização médica. Antes do acidente, Lula confirmou viagem ao Azerbaijão para participar das negociações da COP 29.