Marcelo Zero

A “percepção” de que houve aumento da corrupção, em 2023, no atual governo do PT, em tese revelada pela enquete subjetiva da Transparência Internacional, é totalmente equivocada. Assim como era e é equivocada a “percepção” neoudenista de que os governos anteriores do PT foram “os mais corruptos da história”.

Bem ao contrário, os governos do PT fortaleceram extraordinariamente as instituições de controle da administração estatal e promoveram intensamente a transparência da gestão pública. 

As operações especiais da Polícia Federal passaram de ao redor de 6 ao ano, nos governos anteriores, para cerca de 250 ao ano, nos governos do PT. Nas duas gestões de FHC, tais operações somaram somente 48. Nas gestões Lula e Dilma, tais operações especiais ascenderam a 2.226, até 2013, e 3.512, até 2016. 

Saliente-se que, apenas nos dois primeiros governos de Lula, 2.969 servidores públicos foram afastados por corrupção., o que dá uma média de 371/ano. E somente nos primeiros 3 anos do governo Dilma, foram demitidos 1.576 servidores por corrupção, o que dá uma média de 522/ano.

A Controladoria Geral da República, motivo de chacota pública em governos anteriores aos de Lula, tornou-se uma eficiente instituição que passou a fiscalizar com rigor as verbas federais destinadas aos municípios. 

As procuradorias e o Ministério Público foram igualmente fortalecidos, nos primeiros governos do PT, e passaram a desempenhar suas funções com independência e desenvoltura. Extinguiu-se a triste figura do “engavetador-geral”, com a escolha de procuradores independentes. 

De essencial importância foi a aprovação, no período dos governos do PT, de leis fundamentais para o combate à corrupção, como a Lei das Organizações Criminosas. Esta última permitiu que os corruptores, que antes eram ignorados nas investigações, fossem também processados e punidos. 

Ao mesmo tempo, com a criação do Portal da Transparência, a Lei de Acesso à Informação e várias outras medidas semelhantes, a administração pública federal tornou-se muito mais receptiva ao “detergente da luz do sol”, para usar a expressão famosa do juiz Louis Brandeis. A sociedade civil atenta e informada exercerá sempre o melhor controle sobre o Estado.  

Evidentemente, esse amplo leque de programas e ações contra a corrupção e os desvios aumentou substancialmente as denúncias, fundamentadas ou não, de casos de corrupção, o que ocasionou a falsa impressão (percepção) de que a corrupção havia crescido. 

A mídia conservadora de oposição ao PT, que confessadamente atuava como um partido político de direita, tendia a reforçar essa falsa impressão, muitas vezes exagerando o escopo das denúncias e, por vezes, apresentando simples suspeitas, algumas sem nenhum fundamento, como provas irrefutáveis de culpabilidade. 

Assim, o Brasil, nos governos do PT, não viveu uma crise de corrupção, como alegam os neoudenistas. Viveu, isto sim, a crise do fim de sua histórica impunidade. O que antes era varrido para debaixo do tapete, aparecia e era investigado a sério, mesmo com todas as distorções criadas por juízes e procuradores partidarizados.

A Operação Lava-Jato, entretanto, causou dano imenso ao combate à corrupção, ao subsumir esse combate numa agenda política e profundamente partidarizada, bem como numa estratégia geopolítica, que afetou gravemente a soberania do Brasil, a economia do país e a democracia brasileira. 

Os governos recentes, especialmente o de Bolsonaro, eleito na esteira da Lava-Jato, também causaram danos consideráveis.

Bolsonaro, como bem se sabe agora, aparelhou as instituições do Estado, inclusive as instituições de controle c combate à corrupção. Até mesmo a Abin entrou na dança. 

O terceiro governo Lula, comprometido com os princípios republicanos e com a democracia, ao contrário do governo Bolsonaro, está voltando a investir no combate à corrupção.

Por fim, é preciso levar em consideração os claros limites metodológicos da enquete subjetiva da Transparência Internacional. Trata-se apenas de percepção de um grupo conservador, composto basicamente de empresários e de organizações liberais. 

Ou seja, além de mera percepção, é uma percepção com claro viés político.

Com efeito, a Transparência Internacional desenvolve seu Índice de Percepção da Corrupção (IPC) baseada em enquetes realizadas por estruturas privadas e ONGs e organizações bastante conservadoras, como a Economist Intelligence Unit, do semanário neoliberal britânico The Economist, a organização neoconservadora americana Freedom House, o Fórum Econômico Mundial e grandes corporações multinacionais.

Isso explica por que a Transparência Internacional praticamente ignora os verdadeiros grandes casos de corrupção, associados à evasão fiscal, aos paraísos fiscais, ao chamado “planejamento fiscal” e à especulação financeira desregrada. 

A grande crise financeira de 2008, por exemplo, foi ocasionada por um enorme esquema fraudulento de títulos derivativos. Os bancos e os fundos de investimento sabiam muito bem que aquilo não tinha lastro nenhum, mas continuaram a expandir a farsa até que a bolha insustentável explodiu.  A população inocente pagou o preço desse gigantesco esquema corrupto. Mas isso não afetou as classificações dos Estados Unidos ou do Reino Unido, nas enquetes da Transparência Internacional.

Pelo mesmo motivo, Luxemburgo, país acusado de gerir grandes fundos “caixa-preta”, aparece, na última enquete da Transparência Internacional, como um dos 10 países menos corruptos do mundo. 

Para esses conservadores, assim como para os conservadores brasileiros, a corrupção é só a originada pelo Estado e pelos agentes públicos. O resto é apenas “planejamento fiscal” limpinho e cheiroso e a livre especulação do capital financeiro.

Percepção.