Isaías Dalle

No último dia 7 de dezembro, o projeto Reconexão Periferias, da Fundação Perseu Abramo, fez o pré-lançamento de seu mais recente livro, “Periferias no Plural, em um espaço especialmente reservado durante a Conferência Internacional “Iniciativa Negra por Direitos, Reparação e Justiça”.

O encontro, que aconteceu na área livre da Biblioteca Central do Estado da Bahia, a primeira instituição pública do gênero no Brasil e nas Américas, foi uma amostra viva do próprio conteúdo do livro e daquilo que sua coletânea de artigos quer transmitir.

Autores jovens, com origem em periferias de diferentes partes do Brasil, com trajetória ascendente em universidades de prestígio – portanto, autores e autoras que vivenciaram a ampliação do acesso ao ensino superior a partir dos anos 2000 –, de ascendências diversas, junto com outros jovens que hoje ocupam cargos de liderança no poder público, participaram do encontro e compartilharam a experiência da escrita.

O pré-lançamento pode ser assistido no canal da Fundação Perseu Abramo, em vídeo de uma hora e meia de conversas vibrantes e inspiradoras. O livro, que terá lançamentos presenciais em outros espaços, disponível, gratuitamente, no formato PDF, no site da Fundação. “Periferias no Plural” é fruto de uma parceria com a Fundação Friedrich Ebert (FES).

Paulo César Ramos, coordenador do Reconexão Periferias, avalia que o pré-lançamento na capital baiana, dentro de um encontro que reuniu diversos movimentos sociais, marca um momento importante na trajetória do projeto, iniciada em 2017.

“Reunimos pela primeira vez alguns dos autores e autoras do livro, e a presença de tantos coletivos e lideranças naquele espaço reforça uma relação sólida que temos construído com as periferias. E o livro dá concretude conceitual e teórica para os debates e reflexões que o projeto tem promovido”, avaliou Paulo, doutor em Sociologia pela USP e um dos organizadores da publicação.

Convidado para o pré-lançamento, o secretário de Justiça e Direitos Humanos da Bahia, Felipe Freitas, destacou que a Fundação Perseu Abramo e a FES têm marcado o imaginário de sua geração: “Esse trabalho do Reconexão, tão importante, é mais um resultado da FES e da Perseu, que marcaram minha geração com ideias e intenções mais inusitadas no campo da militância e da política, e são parceiros na luta das juventudes negras do Partido dos Trabalhadores”.

Autora de um dos artigos do livro, Joana Porto, cientista social e doutoranda em Antropologia Social, é indígena nascida no Piauí e pertencente ao povo Tabajara Tapuio. Ela escreveu o capítulo junto com o marido, Rafael, nascido na periferia de São Paulo. Dessa troca nasceu também a luta de ambos pela retomada no território indígena do Pico do Jaraguá, na capital paulista. “Eu sou a resistência. Eu sou plural: mulher, indígena, nordestina, macumbeira, pesquisadora”, disse.

Roberta Teixeira, também autora do livro, em capítulo sobre as batalhas de rimas na periferia de Porto Seguro (BA) – tema de seu mestrado – destacou que a pluralidade das periferias pode também ser entendida pelo rap. “Esta música tem cumprido o papel de resistência e bem-viver que compõe as periferias”, afirmou ela, que é doutoranda em Letras

Filho de dona Dalva, militante do movimento de saúde nas periferias da zona Leste de São Paulo nos anos 1970-80, Tiaraju Pablo D´Andrea, autor de um capítulo sobre periferias urbanas, lembrou que a produção de conhecimento, traduzida em livros como “Periferias no Plural”, é disputa de poder: “A universidade pública tem que deixar de ser um privilégio e continuar se espalhando pelo país”, afirmou ele, que é professor da USP.

Também convidado ao pré-lançamento, Guilherme Pereira, secretário nacional de Periferias, pasta criada pelo atual governo Lula e componente do Ministério das Cidades, disse que o livro “Periferias no Plural” se insere numa perspectiva que enxerga as favelas e os povos periféricos como potência para um projeto de desenvolvimento do país. “Esse olhar é um avanço importante”, destacou.

Jaqueline Lima Santos, que trabalhou no Reconexão Periferias, lembrou que em 2017, quando o projeto teve início, “havia uma ideia em movimento sobre periferias no plural, não como algo único ou georreferenciado, mas que tinha muito mais a ver com relações de poder. E percebemos que a literatura ainda não dava conta dessa reflexão”. Segundo Jacqueline, que participa do texto de introdução ao livro, este foi o momento em que nascia o livro. Atualmente, Jacqueline trabalha na FES e é doutora em Antropologia Social pela Unicamp.

O pré-lançamento em Salvador teve mediação e apresentação de Willian Habermann, diretor da FES, e de Sofia Toledo e Victoria Braga, pesquisadoras do projeto Reconexão Periferias. O trio, além de assinar capítulos do livro, atualmente faz pós-graduação em universidades públicas.

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