Continuam os ataques de Israel contra a população civil de Gaza. A possibilidade de um cessar-fogo, proposta por Brasil, é ignorada. Ajuda humanitária chega, mas longe de suprir as necessidades

BOMBARDEIO De acordo com as Nações Unidas, quase 5 mil pessoas, sendo 1,5 mil crianças, morreram em
Gaza, na contra-ofensiva de Israel, desde a eclosão do conflito, em 7 de outubro, quando Hamas atacou o país
Foto Ahmad Hasaballah

Quinze dias de uma carnificina na Palestina. Os números de corpos de crianças, mulheres e civis divulgados pela Organização das Nações Unidas, mostram um massacre sangrento, capaz de envergonhar a humanidade. A tragédia é evidente, porque os palestinos não têm sequer condições de enterrar seus mortos. Famílias estão sendo obrigadas a se despedirem de seus parentes jogando seus corpos em valas comuns. 

Na quarta-feira, 18, o Brasil propôs um cessar-fogo por razões humanitárias no conflito entre Israel e o Hamas, que já matou quase 5 mil pessoas — cerca de 4 mil palestinos e 1,3 mil israelenses. Mas os Estados Unidos vetaram a proposta apresentada no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). Doze países votaram a favor da proposta brasileira, entre eles China, França e Emirados Árabes Unidos. E dois países, Rússia e Reino Unido, se abstiveram na votação.

Para qualquer proposta ser aprovada no Conselho de Segurança, são necessários pelo menos nove votos dos 15 países membros do órgão, mas não pode haver qualquer veto. Apenas cinco países têm o direito de vetar um texto: Estados Unidos, China, Rússia, Reino Unido e França. Por causa desse dispositivo, o veto americano fez com que a proposta do Brasil fosse rejeitada.

O embaixador do Brasil na ONU, Sérgio Danese, criticou o veto. Há dias, o Itamaraty vinha tentando convencer Washington a apoiar o texto. “Nós trabalhamos intensamente para construir uma posição conjunta, fazendo esforço para acomodar posições diferentes, às vezes opostas”, disse. “Nossa resposta era robusta, e estamos gratos a todos os membros do Conselho que se juntaram a nós e que demonstraram um sincero desejo de multilateralismo. Mas, mais uma vez, tristemente o Conselho não conseguiu adotar uma resolução em relação à situação Palestina. De novo, o silêncio prevaleceu. Nós estamos profundamente tristes e decepcionados”.

Segundo a ONU, 4 mil palestinos morreram em ataques realizados sobre a região desde o último dia 7, quando soldados do Hamas romperam o cerco à Faixa de Gaza e invadiram o território de Israel, matando civis e sequestrando mulheres e crianças — ainda são mantidos 222 reféns israelenses e estrangeiros em Gaza. O número de mortos pelos ataques de Israel sobre o território palestino mostra a fúria do governo de Benjamin Netanyahu: 1.500 crianças e 1.400 mulheres. Existem ainda 12,5 mil palestinos feridos.

A informação foi apresentada na quinta-feira, 19, quando sete relatores da ONU denunciaram Israel por “crimes contra a humanidade”. Eles alertam que, se a ofensiva e o cerco não forem revistos, há um “risco de genocídio” da população palestina. O número de mortes relatado em Gaza durante os 15 dias de guerra de 60% maior do que o número total de mortes durante a escalada de 2014, que durou mais de 50 dias e deixou 2.251 mortes.

Estima-se que centenas de pessoas, incluindo mulheres e crianças, ainda estejam presas sob os escombros, aguardando resgate ou recuperação. “As equipes de resgate, principalmente da Defesa Civil Palestina, estão lutando para cumprir sua missão, em meio a ataques aéreos contínuos, grave escassez de combustível para operar veículos e equipamentos e com conexão limitada ou inexistente a redes móveis”, aponta relatório das Nações Unidas.

De acordo com a ONU, 100 corpos não identificados foram enterrados em uma vala comum em Rafah devido à falta de espaço refrigerado para armazená-los até que os procedimentos de reconhecimento sejam realizados. “Essa medida foi tomada após preocupações ambientais e de indignidade humana relacionadas à decomposição dos corpos”, destaca o relatório. Segundo o Ministério da Saúde de Gaza, até 18 de outubro, 79 famílias haviam perdido dez ou mais de seus membros; 85 famílias haviam perdido de 6 a 9 membros, e 320 famílias haviam perdido de 2 a 5 de seus membros.

Houve a destruição de 12.845 unidades habitacionais e a inabitabilidade de 9.055 unidades habitacionais, segundo informe da ONU a partir de dados do Ministério de Obras Públicas de Gaza. Outras 121 mil unidades habitacionais sofreram danos leves a moderados. O número total de unidades habitacionais destruídas ou danificadas corresponde a pelo menos 30% de todas as residências da Faixa de Gaza.

Biden: “não é momento de cessar fogo”

A Casa Branca anunciou que não acredita que este seja o momento certo para um cessar-fogo em Gaza, cujo número de vítimas supera 5 mil mortos. A afirmação é de John Kirby, coordenador de comunicações estratégicas do Conselho de Segurança Nacional. Ele justificou a posição do governo Biden apontando que todos os reféns mantidos pelo Hamas em Gaza devem ser libertados primeiro.

Suas palavras ecoaram os comentários de Joe Biden no início da segunda-feira de que “devemos ter esses reféns libertados e então podemos conversar”. Kirby disse: “Eu pensei que a mensagem era bem clara para o Hamas: ‘liberte todos os reféns’. Esse precisa ser o primeiro passo aqui. Não estamos falando de um cessar-fogo agora. Na verdade, não acreditamos que este seja o momento para um cessar-fogo”.

Segundo Kirby, Israel tem o direito de se defender. “Eles ainda têm trabalho a fazer para ir atrás da liderança do Hamas. Vamos continuar apoiando. Nosso foco é garantir que eles tenham o que precisam para continuar essa luta”.

Na segunda-feira, 23, o Hamas libertou duas reféns mantidas em Gaza. Elas se chamam Nurit Yitzhak (também conhecida como Nurit Cooper), 79, e Yocheved Lifschitz, 85. O grupo disse que  ambas foram libertadas por “motivos humanitários”. •

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