Maria Augusta Ramos conta o desafio de transformar a grade da  TV Brasil, depois do governo anterior, de ultradireita. “A grade atual da TV Brasil conta hoje com 78% de conteúdo brasileiro em sua programação, contra 40% até 2022”

Mais conteúdo nacional: Maria Augusta Ramos fala sobre os novos rumos da TV Brasil
DE OLHO NO PAÍS Agora na EBC, a diretora Maria Augusta Ramos já dirigiu filmes emblemáticos
como “O processo” e “Amigo secreto”, que contam parte da história política recente no país

Atendendo ao convite de Antônia Pellegrino, Diretora de Conteúdo e programação da Empresa Brasil de Comunicação, a EBC, a documentarista Maria Augusta Ramos aceitou o desafio e assumiu a Gerência-Executiva de Conteúdo da estatal, atuando ao lado de Pellegrino. “A televisão pública precisa ser uma janela aberta a narrativas diversas”, defende a cineasta. 

Câmeras e gravações não são o desafio para a diretora. Maria Augusta tem no currículo documentários como “O processo” (2018), sobre o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, que pode ser visto no serviço de streaming Netflix. Também dirigiu “Amigo secreto” (2022), sobre o vazamento de mensagens trocadas pelo ex-juiz Sergio Moro — o escândalo conhecido como Vaza Jato — narrando como procuradores e autoridades atuaram fora da lei durante a Operação Lava Jato. Este documentário pode ser visto pelos assinantes da Globoplay.

Aos poucos, a grade da TV Brasil tem mudado, apresentando cada vez mais conteúdo produzido no país. Hoje, a emissora exibe em sua programação 78% de conteúdo brasileiro, contra 40% da gestão anterior. “Isso dá a medida da mudança que estamos implementando aqui”, aponta Maria Augusta. A meta é ousada: fazer da TV Brasil um polo de produção e um espaço de difusão de conteúdo produzido no Brasil. 

No bate-bola abaixo, Maria Augusta conta um pouco de como tem sido seu trabalho, os lançamentos mais recentes do canal e dos projetos para a TV Brasil, como lançamento de editais e nova grade. E o retorno do ‘Sem Censura’, um dos programas de maior sucesso da casa. Leia a seguir os trechos da conversa com a Focus Brasil:

Focus Brasil — Como tem sido a experiência de trabalhar com a ideia de uma TV Pública? 

Maria Augusta Ramos — Tem sido um enorme desafio. Uma TV pública comprometida, com programação de qualidade, inclusiva, capaz de representar a diversidade de um país de enormes complexidades como é o Brasil é uma demanda antiga da sociedade brasileira. Mas, sobretudo para nós, que trabalhamos na produção audiovisual, na cultura. Eu cheguei aqui, a convite da Antonia Pellegrino, diretora de Conteúdo e Programação da TV Brasil, para participar de um projeto que considero importante e sobretudo necessário. Tem sido um grande aprendizado.

— Como você definiria os objetivos e linhas de conteúdo desse novo momento da TV Brasil? 

— A grade atual da TV Brasil conta hoje com 78% de conteúdo brasileiro em sua programação, contra 40% do período anterior.  Isso dá bem a medida do tamanho da mudança que estamos implementando aqui e da principal das nossas prioridades: fazer da TV Brasil não apenas um polo de produção, mas um espaço de difusão do conteúdo produzido no Brasil. Vivemos, em um período recente, um verdadeiro boom da produção audiovisual no Brasil, sobretudo com as políticas de incentivo da Agência Nacional do Cinema (Ancine), e do fundo setorial com a Lei da TV Paga. É importante que a televisão pública seja uma referência na difusão dessa produção e é importante que a TV Brasil ocupe um lugar de referência, para onde a população possa olhar e saber que encontrará conteúdo de qualidade e com o qual possa se identificar.

— Qual o maior desafio hoje na construção da nova grade? 

— Acho que o grande desafio é redesenhar uma programação depois de um período de asfixia, não apenas da emissora, mas de todo o setor audiovisual brasileiro. E dentro de um momento de transição tecnológica, de uma mudança na relação das pessoas com os conteúdos. O desafio, no meio disso tudo, é reconstruir a credibilidade da TV Brasil, fazer com que a população olhe para cá e se reconheça.

— Está na perspectiva da TV Brasil a produção de programação de ficção de produção própria?

— Não nesse primeiro momento. Estamos investindo agora em programas de entrevista, musicais e documentários. Temos trabalhado bastante na aquisição de conteúdo nacional independente, de ficção e documentário. Alguns dos filmes brasileiros mais premiados dos últimos anos foram adquiridos e já estão em cartaz nessa nova grade, como “Aquarius” (2016), de Kleber Mendonça Filho, “A febre” (2019), de Maya Darin, “Los silencios” (2019), de Beatriz Seigner, entre outros. Acreditamos que essa pode ser uma janela importante para o cinema brasileiro, atuando também na formação de público.

— Há nos planos da TV Brasil publicação de edital para a grade de programação? 

— Sim.  Tivemos há algum tempo essa iniciativa inovadora que foram os editais do Programa de Apoio ao Desenvolvimento do Audiovisual Brasileiro (Prodav) voltados para a televisão pública. Estamos nesse momento em contato com os produtores, recebendo programas contemplados na última edição do programa, abandonado pelo governo anterior. Alguns desses programas já estão na nova grade e outros serão lançados ao longo dos próximos meses.  E para o próximo ano, queremos retomar esses editais, para aprofundar a relação da emissora com a produção independente e permitir que a emissora seja vista como uma janela importante de difusão desse conteúdo.

— Como documentarista, como vê a possibilidade da TV Brasil também poder se firmar como uma grande narradora do país? 

— A televisão pública precisa ser aqui, como é em muitos países, uma janela aberta a olhares diversos, a narrativas diversas. 

— O que você destacaria para nós hoje da nova grade de programação? 

— Nós lançamos dois programas próprios nesse primeiro mês da nova grade: o “DR com Demori”, ou “Dando a Real com Demori”, um programa de entrevistas feito pelo jornalista Leandro Demori, e o “Cine Resenha”, conversa semanal com realizadores e profissionais do audiovisual que antecede o lançamento de um filme inédito na grade. Tivemos também o lançamento de uma nova versão do programa “Partituras”, referência na exibição de música clássica na televisão aberta. Iniciamos também as gravações da nova temporada do Trilha de letras, repaginado e apresentado pela escritora Eliane Alves Cruz. Em breve teremos a volta do “Sem Censura”, programa clássico da emissora, além de outras novidades que anunciaremos nos próximos meses. •