Pela primeira vez, o ex-presidente Jair Bolsonaro tomou partido dos primeiros sentenciados pelo Supremo Tribunal Federal  pela tentativa de Golpe de Estado em 8 de janeiro: “Se eu estivesse na Presidência, nada disso teria acontecido”

Uma vez golpista, sempre golpista. O ex-presidente Jair Bolsonaro não se conforma com os rumos que o país tomou a partir das eleições de outubro, quando foi derrotado por Luiz Inácio Lula da Silva na disputa pela Presidência da República. Na quinta-feira, 12, enquanto visitava a cidade de Chapecó (SC), um dos bolsões do bolsonarismo no Sul do Brasil, o ex-presidente saiu em defesa dos réus condenados pelos ataques às instituições da República, ocorridos em Brasília em 8 de janeiro.

“Quero dizer a vocês que se eu continuasse na Presidência, isso tudo não teria ocorrido. Nós lamentamos o ocorrido. Esperamos que isso seja desfeito brevemente e que essas pessoas fiquem livres. E que as que foram condenadas a 17 anos de cadeia, que fiquem livres dessa pena também”, declarou, atacando a decisão da Suprema Corte por já ter condenado seis pessoas por crimes contra o Estado Democrático de Direito.

Bolsonaro tratou das condenações ao abordar o caso de uma bolsonarista que o recebeu na cidade de Chapecó usando tornozeleira eletrônica, medida restritiva alternativa à prisão aplicada à maioria dos investigados pelos atos golpistas de 8 de janeiro. “Me cortou o coração quando uma senhora de 40 e poucos anos me mostrou o seu tornozelo. Uma tornozeleira eletrônica”, disse. “Algo que realmente nos choca. Pela violência, pela maldade como trataram essas pessoas”.

Ele declarou que as penas foram muito acima do razoável diante dos delitos cometidos. “Alguns erraram ao invadir prédios públicos”, disse. “As penas estão longe do que foi apresentado  contra eles”. E se contradisse diante do que sempre pregou durante a campanha eleitoral de 2022, quando atacou a Justiça Eleitoral e insinuou que as urnas eram passíveis de fraude. 

“Nós devemos, se queremos viver democracia, respeitar a lei, respeitar o devido processo legal, individualizar a conduta de cada um e não no atacado. Ao querer fazer Justiça cometer uma grande injustiça com nosso país”, afirmou o ex-presidente. Bolsonaro foi condenado em junho pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e está inelegível pelos próximos oito anos. O ex-presidente foi alvo de processo em que o PDT o acusou de ter cometido abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicações durante uma reunião com embaixadores no Palácio da Alvorada, em julho de 2022, em que fez ataques ao sistema eleitoral.

Em setembro, o STF começou em setembro a julgar os primeiros réus dos ataques de 8 de janeiro, quando houve uma tentativa de Golpe de Estado. Os primeiros três condenados foram Matheus Lima de Carvalho Lázaro, Aécio Lúcio Costa Pereira e Thiago de Assis Mathar. Os dois primeiros pegaram 17 anos de prisão, enquanto o último foi sentenciado a 14 anos. 

Entre os crimes imputados aos três estão associação criminosa armada, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça, com o uso de substância inflamável, e deterioração de patrimônio tombado.

Além deles, outros três acusados foram condenados em julgamento no plenário virtual, a penas que variam de 12 a 17 anos de prisão. Outros dois julgamentos, com maioria pela condenação, foram suspensos e enviados ao plenário físico, após destaque apresentado pelo ministro André Mendonça. Atualmente, mais seis casos estão sendo analisados pela Corte.

A maioria dos denunciados por participação no 8 de janeiro podem fechar acordo de não persecução com Procuradoria-Geral da República (PGR). Segundo a PGR, 1.125 denunciados têm direito ao acordo. Para isso, precisam confessar os crimes e se comprometer com o pagamento de multas, além de prestar serviços à comunidade, deixar de usar redes sociais e ainda participar de um curso sobre democracia. Com isso, seus processos ficariam suspensos. •

Bolsonaro deve ser indiciado em relatório da CPI

A relatora da CPI dos Ataques à Democracia, Eliziane Gama (PSD-MA), apresenta seu relatório final sobre os ataques às sedes dos Três Poderes em 8 de Janeiro, que culminaram numa tentativa de Golpe de Estado, nesta próximo terça-feira, 17. Ela considerou gravíssima a denúncia de que o ex-presidente Jair Bolsonaro teria participado da elaboração de uma minuta de um decreto que resultaria num Golpe de Estado. 

A participação de Bolsonaro consta em um trecho da delação do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, e foi revelada pelo Globo na última quarta-feira, 11. “A CPI, ao longo desses meses de investigação, já recebeu outros dados que também sustentam essa operação golpista”, disse. 

Há uma grande expectativa de que a relatora vai pedir o indiciamento de Bolsonaro como mentor intelectual dos ataques de 8 de janeiro. A CPI deve encaminhar à Procuradoria Geral da República o aprofundamento das investigações sobre a participação de Bolsonaro na trama. 

Em depoimento prestado à CPI, o hacker Walter Delgatti já havia relatado que o ex-presidente pediu a ele pessoalmente para assumir um grampo contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. Integrantes do PT não têm dúvidas quanto ao envolvimento direto de Bolsonaro na tentativa de golpe.

“Há possibilidade de indiciá-lo por organização criminosa, abolição ao Estado Democrático de Direito e incitação a inúmeros crimes”, destaca o deputado Duarte Júnior (PSB-MA). O deputado Rogério Correia (PT-MG) diz que a delação de Cid é “peça fundamental” para elucidar o que foi a tentativa de golpe e como trabalhou o entorno de Bolsonaro. “Além de ter conhecimento das tratativas, Bolsonaro atuou fortemente para construir, viabilizar, articular e insuflar a intentona golpista”, diz o parlamentar. •

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