As emissões da Amazônia ‘dobraram’ com Bolsonaro, apenas nos dois primeiros anos do seu governo. Novo estudo publicado na revista ‘Nature’ diz que esse período foi tão destrutivo quanto o recorde de seca e onda de calor  provocados pelo El Niño em 2016. “Ele é o cara, você é o responsável por essas grandes emissões da Amazônia“, acusa a cientista Luciana Gatti

Patrick Greenfield | The Guardian

A primeira metade do governo de Jair Bolsonaro à frente da Presidência do Brasil foi tão destrutiva para a Amazônia que é comparável ao recorde de seca e onda de calor do El Niño de 2016 em termos de emissões de carbono, de acordo com cientistas.

As emissões anuais da maior floresta tropical do mundo aproximadamente dobraram em 2019 e 2020, em comparação com a média de 2010 a 2018, de acordo com um novo estudo publicado na revista ‘Nature’. É que faixas de floresta foram deliberadamente limpas e queimadas para pecuária e agricultura durante os dois primeiros anos do tempo de mandato do líder de extrema-direita no Brasil.

Enquanto a quantidade de carbono que a Amazônia absorve e emite muda com os ciclos climáticos, geralmente sugando mais em anos úmidos e menos em períodos secos, o estudo descobriu que o aumento das emissões sob Bolsonaro teve pouco a ver com processos naturais, mas foi causado pela remoção sistemática e rebaixamento da aplicação da lei ambiental no Brasil.

Sob Bolsonaro, o número e a gravidade das multas por desmatamento ilegal pelas autoridades brasileiras caíram drasticamente enquanto os incêndios e a limpeza de terras dispararam, aponta o estudo. As emissões de carbono aumentaram de uma média anual de 0,24 gigatoneladas de 2010-18 para 0,44GtC em 2019 e 0,55GtC, respectivamente.

A análise, produzida por muitos dos cientistas que primeiro estabeleceram que a Amazônia agora está emitindo mais CO2 do que é capaz de absorver, mostra que novas áreas da floresta se tornaram uma fonte crescente de emissões, particularmente a Amazônia ocidental, uma das partes mais intocadas da bacia, que tem sido alvo de invasores de terra e mineiros ilegais.

Isso aumenta os temores de que a Amazônia, que desempenha um papel importante na regulação do clima mundial, esteja se aproximando de um ponto de inflexão após o qual não será mais capaz de se sustentar, o que teria profundas consequências para a biodiversidade e o clima.

A cientista Luciana Gatti, do Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (INPE), que liderou a pesquisa, faz uma análise dura sobre o perigo que foi o governo do ex-capitão. “Bolsonaro era um El Niño brasileiro. A análise sugere que não há razão para as grandes emissões da Amazônia além do desmantelamento da aplicação da lei”, aponta.

“Neste artigo, reunimos a ciência que mede as emissões de carbono, o desmatamento e o monitoramento de incêndios, a aplicação da lei e os fatores econômicos: tudo o que está envolvido no processo de destruição da Amazônia”, relata. “Depois de observarmos todos esses fatores, foi apenas um passo simples dizer: ‘Ele é o cara, ele é o responsável por essas grandes emissões da Amazônia’. É uma história incrível e muito triste”.

A pesquisa é baseada em medições de perfil vertical de emissões de pequenos aviões em quatro locais na Amazônia brasileira, tomando leituras de CO2 de 500m a 4.500m.

“O agronegócio no Brasil está olhando para a Amazônia para transformar o país na fazenda para o mundo. Este é um plano terrível, não só para o Brasil, mas para o mundo inteiro. A Amazônia é um amortecedor para as mudanças climáticas”, diz Luciana Gatti. Ela é membro do Painel de Ciência para a Amazônia, que se dedica à conservação da região. A análise não inclui a segunda metade da presidência de Bolsonaro, que viu taxas de desmatamento e incêndios ainda muito maiores.

Embora haja uma preocupação generalizada com o futuro da Amazônia, o co-autor do artigo, professor Carlos Nobre, um dos principais cientistas climáticos do Brasil, disse ao jornal The Guardian no início deste mês que houve um momento de oportunidade para proteger as florestas do mundo em meio à queda das taxas de perda de florestas em alguns países ao redor do mundo.

Isso veio depois da queda das taxas de desmatamento sob o novo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que se comprometeu a acabar com o desmatamento no país até 2030. Ele realizou uma cúpula pan-Amazônica com líderes de outros países, no início deste mês. Mas não conseguiram chegar a um acordo sobre uma meta regional para interromper a perda de florestas em meio a desacordos sobre a exploração de petróleo e gás.

“Posso ver um movimento político maior em todo o mundo para reduzir o desmatamento — Indonésia, alguns países da África, muitos países da Amazônia. No Brasil, houve uma redução significativa no desmatamento em junho”, aponta Nobre. : Idealmente falando, espero que quando você calcular 2023 em comparação com 2022, possa haver uma redução de 50%, o que seria muito bom. Se o Brasil quiser atingir o desmatamento zero até 2030, obter uma queda de 50% seria uma notícia muito boa”. •

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