No aniversário de dez anos de “O Drible”, de Sérgio Rodrigues, a obra sobre futebol e paternidade é relançado em capa dura numa edição caprichada

Em comemoração aos 10 anos do lançamento original de “O Drible”, o romance de Sérgio Rodrigues terá uma edição especial em capa dura e com novo prefácio, assinado pela atriz Fernanda Torres. Terceiro livro do professor e linguista, essa história sobre futebol, paternidade e o Brasil entre as décadas de 1960 e 1980 se tornou quase um daqueles clássicos instantâneos, ganhou um dos principais prêmios de literatura em língua portuguesa em 2014, o Portugal Telecom, e, ainda, se tornou referência como obra que aborda tema muito caro ao imaginário brasiliero, o futebol.

Nascido em Minas em 1962, Rodrigues pertence à geração contemporânea aos grandes feitos da Seleção Brasileira e uma era de ouro do futebol brasileiro também nos times locais do Sudeste. É desse universo que parte a história dos Murilos. O narrador Murilo Neto, que beira os 60 anos como um revisor de livros de auto-ajuda, solitário e amargo, está afastado há décadas do pai, um cronista esportivoque brilhou nos círculos jornalísticos e intelectuais do Rio de Janeiro nos anos 1950.

Além da relação conturbada, filho e pai partilham o culto a Peralvo, um jogador que poderia ter sido ainda maior que Pelé e sobre o qual o jornalista escreve um livro. A notícia da doença do pai leva Murilo Neto de volta à pequena cidade no interior de Minas, mesmo que a contragosto, numa jornada de reminiscências e acerto de contas.

O que torna o romance de Rodrigues especial é o tom nada conciliatório e nem tampouco sentimental desse reencontro. O filho não apenas odeia o pai, como acalentou, por anos, o plano de matá-lo. O pai, vaidoso e esquivo, talvez responsável por pelo menos uma tragédia familiar, talvez tenha cultivado relações escusas com a ditadura militar.

Livro construído a partir de muitos não-ditos e interditos dessa relação central, “O Drible” segue o passo rápido de uma prosa direta, cheia de referências à cultura pop, mas que não se oferece logo de cara. Com extremo domínio narrativo, Rodrigues semeia perguntas, desconfianças, revelações pela metade, pistas falsas de maneira a deixar o leitor enredado até o último parágrafo.

Nos  confrontos e embates entre os dois Murilos, desfilam os contrastes entre aquele Brasil que poderia ter sido durante o respiro de democracia do nos anos mágicos do futebol campeão  e o país que acabou se tornando depois dos 21 anos de ditadura. Não deixa de ser emblemático e oportuno que o relançamento de “O Drible” se dê, justamente, depois de termos atravessado um período em que a ameaça autoritária, novamente, se fez presente. • Bia Abramo

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