Finalmente, após seis meses de completo imobilismo, o Banco Central cede e reduz em 0,5% a taxa básica de juros da economia. Haddad comemora: “Mostra a direção certa do governo”. Mas ainda é tímido: “O corte de meio ponto na taxa Selic não muda o fato de que o BC segue impondo ao Brasil a maior taxa de juros do planeta”, lembra a deputada Gleisi Hoffmann (PT-PR)

Demorou, mas finalmente o Banco Central saiu do imobilismo que representou um garrote sobre a economia brasileira e decidiu reduzir a taxa básica de juros da economia, a Selic. Na quarta-feira, 3, o Comitê de Política Monetária (Copom) anunciou um corte de 0,5 ponto percentual na taxa. Isso representa um alívio para a economia brasileira e mostra que o governo está na direção certa. “Um avanço no sentido do crescimento econômico sustentável para todos”, comentou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Mas o fato é que o Brasil continua detendo o inacreditável título de país com a maior taxa de juros real do planeta. Isso precisa mudar.

O choque de realidade que o governo Lula vem aplicando nos últimos seis meses no país – com sucessivos indicadores positivos na economia e arrancando elogios na imprensa internacional e em agentes do mercado financeiro – parece ter tirado o Copom do sono profundo. “Considerando os cenários avaliados, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu reduzir a taxa básica de juros em 0,5 ponto percentual, para 13,25% ao ano”, disse o comunicado. “E entende que essa decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante, que inclui o ano de 2024 e, em grau menor, o de 2025”.

“Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego”, cita o Copom, cuja votação revelou um racha quanto à intensidade do corte na Selic: cinco integrantes do Copom (surpreendentemente, incluindo Campos Neto), votaram pela redução de 0,5%, enquanto outros quatro escolheram um recuo mais tímido, de 0,25%.

“O comitê reforça a necessidade de perseverar com uma política monetária contracionista até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas”, sinaliza a nota distribuída pelo Banco Central. No documento, o Copom chama a atenção para uma incerteza em relação ao ambiente externo e para a desaceleração da economia interna nos próximos trimestres. E também destaca as expectativas para a inflação futura para justificar a postura de cautela com a política monetária. “O comitê ressalta que, em seus cenários para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções”, diz o comunicado, referindo-se às trajetórias de alta e de queda da inflação.

A equipe econômica comemorou. “Isso dá um alento, porque estávamos vendo uma queda importante na arrecadação”, declarou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Para ele, a redução de 13,75% para 13,25% ao ano ajudará nas contas públicas pelo lado da arrecadação. Ele ressaltou que a diminuição dos juros básicos é fruto do diálogo entre o governo e o Banco Central, que passou a operar em regime de autonomia desde 2021. Cada ponto percentual da Selic pesa R$ 38 bilhões na dívida bruta do Brasil. Com a decisão do Copom, o governo deixa de pagar R$ 19 bilhões em juros.

Haddad afirmou que as conversas com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto — indicado ao cargo pelo governo de Jair Bolsonaro e criticado duramente no Congresso por manter uma política monetária inflexível —, sempre ocorreram de forma “mais elevada possível”. O ministro apontou que o voto de desempate dado por Campos Neto a favor da redução de 0,5 ponto foi “importante” e baseado em dados econômicos.

“É um voto técnico, qualificado, à luz do que ele conhece de economia. O fato de estarmos alinhados hoje não significa uma situação de concessão ao governo”, comentou Haddad. “Tenho certeza de que o voto dele foi balizado em análises técnicas”, disse. O ministro relatou ter enviado uma mensagem chefe da autoridade monetária após a reunião do Copom prometendo trabalhar cada vez mais em “harmonia” com a autoridade monetária.

Após o primeiro corte nos juros básicos em três anos — o Brasil ainda detém o recorde da taxa de juros real mais alta do mundo —, Haddad ressaltou o comprometimento do governo com o controle das contas públicas. “[A redução da Selic] vai ajudar muito nas expectativas. Não estamos facilitando em nada o combate à inflação. Temos compromisso com a responsabilidade fiscal e o ajuste que está sendo feito”, destacou. Ele disse ter saído “otimista” com a decisão do Copom. “Temos muitos desafios e o comunicado do Copom deixa claro isso. Vamos aguardar os desdobramentos do trabalho junto ao Congresso e ao Judiciário. Saio otimista”, disse.

Segundo o ministro da Fazenda, o governo está empenhado em aprovar no Congresso o novo arcabouço fiscal e os demais temas da agenda econômica. O ministro reiterou o pedido de trabalhar em coordenação com os Poderes Legislativo e Judiciário. “Devemos continuar no mesmo caminho. Ano que vem é muito desafiador. Temos um desafio fiscal importante [zerar o déficit primário]. Temos de sair de dez anos de conflito para dez anos de congraçamento”, avalia Fernando Haddad.

No Congresso, a decisão repercutiu, mas houve quem cobrasse mais celeridade. Daí a crítica pontual. “O corte de meio ponto na taxa Selic não muda o fato de que o BC segue impondo ao Brasil a maior taxa de juros do planeta”, lamentou a presidenta nacional do PT, Gleisi Hoffmann. “Já era pra ter reduzido a Selic, substancialmente, há muito tempo”.

O líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), subiu à tribuna, bem-humorado: “Finalmente o Banco Central fez o L, entrou no ritmo do país de melhora dos índices econômicos. Como a mesma mão que ataca, tem que ser a mão que afaga, tenho que agradecer ao presidente Campos Neto. Ele virá ao Senado em um ambiente muito melhor do que se tivesse reduzido em apenas 0,25%”.

Outros parlamentares também comentaram. “Momento histórico de virada para a economia brasileira, finalmente o Comitê de Política Monetária baixou em 0,5% a taxa Selic”, disse o líder do PT na Câmara, Zeca Dirceu (PT-PR). “Este foi o primeiro corte em três anos. Finalmente o país ganha espaço para crescer, com maior possibilidades de crédito e geração de emprego”. No Senado, o líder Fabiano Contarato (ES), disse que o gesto é importante, mas ainda insuficiente. “É pouco, mas já é um aceno aos brasileiros. Juros altos só castigam os mais pobres. E essa não pode ser a finalidade de um órgão responsável pela política econômica”, destacou.

Gleisi Hoffmann vai na mesma linha: “Estamos pagando um preço muito alto pela atuação política do bolsonarista Campos Neto no BC. Manteve os juros na estratosfera apesar de todas as evidências de que envenenam a economia. O BC de Bolsonaro, Guedes e Campos Neto, derrotado por Lula nas urnas, está sabotando o desenvolvimento do país. Têm de ser responsabilizados”.  •

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