Primeiro condenado à pena de morte pela ditadura militar falece no Recife. O juiz e ex-guerrilheiro tinha 70 anos. Nos anos de chumbo, fugiu da prisão, foi pro exílio e depois virou juiz

Morreu no último domingo, aos 70 anos, o juiz Theodomiro Romeiro dos Santos, conhecido por protagonizar a primeira condenação à morte na história da República. Em 18 de março de 1971, durante a ditadura militar, ele foi condenado à pena capital numa sentença desumana proferida por um conselho especial da Justiça. A causa de sua morte não foi divulgada.

Theodomiro nasceu em Natal, no Rio Grande do Norte, e entrou na luta contra a ditadura aos 14 anos. Quando ouviu do tribunal a sentença de morte, seu semblante permaneceu sereno. Ele contou mais tarde que tinha certeza de que sua pena seria atenuada. Só não imaginava o que o destino lhe reservava.

Oito anos depois, fugiu da Penitenciária Lemos Brito, foi morar na França com a sua família e, após retornar ao Brasil, tornou-se juiz do Tribunal Regional do Trabalho. Em 2016, passados 45 anos da condenação diante de uma mesa cheia de homens fardados, sua história na guerrilha foi contada no documentário “Galeria F”, de Emília Silveira.

Aposentado em 2012, após quase 20 anos atuando como magistrado em Pernambuco, Theodomiro ocupou a titularidade de varas da Justiça do Trabalho em cidades como Catende, Cabo, Salgueiro e Serra Talhada. Entre 2000 e 2004, foi presidente da Associação de Magistrados Trabalhistas.

Quando foi condenado, o então procurador Antônio Brandão de Andrade disse que a sentença servia de exemplo “aos agentes de Moscou e de Cuba que elegeram a violência e o terror como tônica de seu inconformismo e como advertência aos maus brasileiros”.

Apesar de jovem, Romeiro era um preso importante. Em janeiro de 1971, ele estava na lista de 70 presos políticos que os sequestradores do embaixador suíço Giovani Bucher queriam libertar em troca da soltura do diplomata. Mas a ditadura não aceitou, exigindo que o nome fosse substituído para continuar às negociações.

Na época estudante, Theodomiro estava no Dique do Tororó, em Salvador, com dois de seus companheiros de luta armada, quando um jipe os alcançou com três agentes da ditadura militar, que desceram do carro e, sem se identificar, foram logo imobilizando o trio. Eles conseguiram algemar Romeiro a seu amigo Paulo Pontes, mas o terceiro guerrilheiro, Getúlio Cabral, saiu correndo pela Avenida Vasco da Gama.

Nas semanas seguintes, o jovem integrante do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR) foi torturado de várias formas, em sessões que duravam horas, primeiramente na sede da Polícia Federal na capital baiana e, em seguida, no Forte do Barbalho. Em depoimento, Romeiro conta que atirou nos agentes porque viu que seu amigo seria alvejado.

No dia de sua fuga, o ex-combatente saiu andando pela porta da Penitenciária Lemos Brito, em Salvador, antes de se meter pelo interior da Bahia, mudando de carros e esconderijos até conseguir asilo no exterior. O documentário “Galeria F” refaz esse trajeto com o próprio Romeiro, acompanhado do primogênito.

Theodomiro deixa quatro filhos. Bruno, Fernando Augusto e Mário são fruto de seu primeiro casamento. Seus nomes são homenagens a amigos guerrilheiros mortos pela repressão. Já a filha caçula, Camila, é filha de sua última esposa, Virgínia Lúcia. •

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