A semana na história – 22 a 28 de Maio
23 de maio de 1932 – Explodem conflitos em São Paulo
“Paulistas! Mais uma vez o ministro Osvaldo Aranha, como enviado especial do ditador, vem a São Paulo com o intuito de arrebatar ao povo paulista o sagrado direito de escolher seus governantes. Mas o povo paulista, cuja paciência não é ilimitada, não mais suportará tamanha afronta e humilhação”. Assim começa o panfleto da Frente Única Paulista, lido insistentemente nas emissoras de rádio e distribuído pelas ruas, convocando para mais um comício na Praça do Patriarca.
Depois do encontro, a multidão saiu em passeata pelas ruas do centro. Invadiu os jornais “Correio da Tarde” e “A Razão” (favoráveis ao governo provisório), depredando e queimando as instalações. De lá, seguiu para a sede da Legião Revolucionária, organização tenentista, saqueando duas lojas de armas no caminho.
Os legionários, percebendo a chegada da multidão enfurecida, responderam com tiros de metralhadoras, ferindo várias pessoas e matando quatro atacantes: Mário Martins de Almeida (fazendeiro em Sertãozinho, 31 anos), Euclides Bueno Miragaia (auxiliar de cartório em São Paulo, 21 anos), Dráuzio Marcondes de Souza (ajudante de farmácia em São Paulo, 14 anos) e Antônio Américo de Camargo Andrade (comerciário em São Paulo, 30 anos).
A temperatura política subiu imediatamente. O Grêmio Politécnico, o Centro Acadêmico Osvaldo Cruz, o Centro Acadêmico XI de Agosto e o Centro Horácio Lane se juntaram à Liga Paulista Pró-Constituinte e lançaram um comunicado exortando a população a exigir “justiça aos responsáveis por esse crime vergonhoso”.
A sigla MMDC, formada pelas iniciais dos nomes dos mortos (Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo), seria transformada em símbolo do movimento paulista contra Getúlio Vargas.
25 de maio de 1959 – Ibad custeia eleição da direita no Brasil
É fundado, no Rio de Janeiro, o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (Ibad), organização conservadora e anticomunista vinculada à Agência Central de Informações (CIA) norte-americana. À frente do instituto está Ivan Hasslocher, agente da CIA com atuação também na Bolívia e Equador.
A entidade atuaria nas áreas rural e parlamentar, no movimento estudantil, nos sindicatos e na ala conservadora da Igreja, como instituições católicas de extrema-direita. Também manteria estreitas relações com organizações paramilitares — a exemplo do Movimento Anticomunista (MAC) e da Cruzada Libertadora Militar Democrática (CLMD).
A partir da posse de João Goulart na Presidência da República, em 1961, o Ibad intensificaria suas ações com o objetivo de estimular, na sociedade brasileira, um amplo processo de mobilização anticomunista e de oposição ao governo e suas reformas. Em 1962, o instituto criaria dois braços de atuação: a Promotion SA e a Ação Democrática Popular (Adep).
A Promotion foi uma agência de publicidade encarregada de disseminar, com recursos norte-americanos, propaganda anticomunista e anti-Jango na imprensa falada e escrita e também dentro dos quartéis — só em 1964 teriam sido gastos US$ 2 milhões em propaganda nas rádios, jornais e unidades móveis de exibição de filmes. Em 1963 teria havido mais de 1.700 exibições de filmes, somente no Rio de Janeiro, para cerca de 179 mil militares, em quartéis, escolas e navios.
Já a Adep atuaria pesadamente nas eleições de 1962, despejando dinheiro nas campanhas de 250 candidatos a deputado federal e 600 a estadual, além de oito candidatos a governador. Os recursos provinham da CIA, de multinacionais (ou empresas associadas ao capital estrangeiro) e de fontes governamentais dos Estados Unidos.
Em troca, o Ibad exigia, dos parlamentares federais eleitos, a adesão à Adep, criada no Congresso para inviabilizar as reformas de base, imobilizar o governo de João Goulart e fazer da paralisia institucional um pretexto para o golpe militar.
Uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Congresso confirmaria o financiamento ilegal de campanhas pelo Ibad. Tanto o instituto quanto a Adep seriam fechados por crime de corrupção, por decreto de João Goulart, em 31 de agosto de 1963.
28 de maio de 1945 – Lei Agamenon define regras eleitorais
O presidente Getúlio Vargas assina o Decreto Lei 7.586, para regular o alistamento eleitoral e as futuras eleições. É o novo Código Eleitoral do país, que leva o nome do ministro da Justiça, Agamenon Magalhães. Ele trabalhara intensamente nos meses anteriores para definir as regras das eleições marcadas para 2 de dezembro e da participação dos partidos que iriam concorrer.
O decreto definiu que, para obter o registro e disputar as eleições, os partidos deveriam ter base nacional, com o apoio de, no mínimo, 10 mil eleitores em cada um de pelo menos cinco estados. Essa medida visava inviabilizar a recriação do quadro partidário anterior ao Estado Novo, sustentado por partidos regionais.
Os candidatos que ocupassem funções públicas deveriam se afastar delas pelo menos 90 dias antes das eleições — a chamada desincompatibilização —, ou seja, se o próprio Getúlio Vargas resolvesse disputar a Presidência, deveria deixar o Palácio do Catete até 3 de setembro de 1945.
Mais de 35 partidos políticos conseguiram registro provisório, mas, até o final de 1948, apenas 12 permaneceriam oficialmente registrados. Com apoio do governo, foram criadas duas legendas: o Partido Social Democrático (PSD) e o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Em oposição a Vargas, surgiu a União Democrática Nacional (UDN).
23 de maio de 1962 – ‘O pagador de promessas’ ganha melhor filme no festival de cannes
O filme “O Pagador de Promessas”, baseado na peça teatral homônima de Dias Gomes e dirigido por Anselmo Duarte, conquista um dos mais importantes prêmios do cinema: a Palma de Ouro. O filme consagrou-se no Festival de Cannes, na França, derrotando obras de diretores consagrados, como “O Anjo Exterminador”, de Luis Buñuel, “O Eclipse”, de Michelangelo Antonioni, “Tempestade sobre Washington”, de Otto Preminger, e “Longa Jornada Noite Adentro”, de Sidney Lumet.
Entre os jurados do Festival de Cannes, estava François Truffaut, cineasta ligado à Nouvelle Vague francesa — já havia dirigido “Os Incompreendidos”, em 1959, e “Jules e Jim: uma Mulher para Dois”, em 1962. Truffaut era então um grande entusiasta do filme brasileiro no festival.
O enredo do filme conta a história de Zé do Burro (Leonardo Villar), camponês que, no desespero para salvar seu burro doente, promete a Iansã, em troca da cura, carregar uma cruz tão pesada como a de Cristo até a Igreja de Santa Bárbara, em Salvador.
Impedido pelo padre de entrar no templo — pois sua promessa fora feita a uma entidade do candomblé —, Zé do Burro recebe a solidariedade de uma multidão que, como ele, também havia incorporado às suas crenças as religiões africanas.
Ao final, Zé do Burro, morto a bala por um policial que reprimia uma manifestação, é levado pela multidão pregado na cruz que havia carregado.
Tanto na peça quanto no filme, a disputa religiosa é o pano de fundo para uma discussão sobre a dificuldade de integração das camadas populares à vida do país.
Além da Palma de Ouro, “O Pagador de Promessas” levaria ainda o Prêmio Especial do Júri no Festival de Cartagena (Espanha) e o Golden Gate do Festival de San Francisco (Estados Unidos), como melhor filme e melhor trilha sonora (de Gabriel Migliori). No ano seguinte, seria indicado ao Oscar de melhor filme em língua estrangeira.
17 de maio de 1970 – Bispos condenam a tortura no Brasil
Durante a 11ª Assembleia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Igreja Católica toma posição contra o autoritarismo e divulga documento em que denuncia os abusos do regime militar sobre os direitos humanos e sociais. A hierarquia religiosa, que havia apoiado o golpe de 1964, voltava-se agora contra a violência da ditadura.
O documento da CNBB é contundente: “Não podemos admitir as lamentáveis manifestações da violência, traduzidas na forma de assaltos, sequestros, mortes ou quaisquer outras modalidades de terror. […] Pensamos no exercício da JUSTIÇA, […] que, sinceramente, cremos estar sendo violentado, com frequência, por processos levados morosa e precariamente, por detenções efetuadas em base a suspeitas ou acusações precipitadas, por inquéritos instaurados e levados adiante por vários meses, em regime de incomunicabilidade das pessoas e em carência, não raro, do fundamental direito de defesa”.
No dia seguinte à divulgação do documento, o arcebispo de Olinda e Recife, dom Helder Câmara (foto), mundialmente conhecido e candidato ao Prêmio Nobel da Paz, denunciaria as torturas em Paris para uma plateia de 10 mil pessoas. Ao regressar ao Brasil, tornou-se alvo de feroz campanha de desmoralização junto à opinião pública. Os jornais foram proibidos de entrevistá-lo e até de mencionar seu nome. A firme posição de destacados bispos, arcebispos e cardeais – como dom Paulo Evaristo Arns e dom Aloísio Lorscheider, além de dom Helder – abriu um contencioso entre a ditadura e a hierarquia católica no Brasil.
A tensão aumentaria nos anos seguintes, com a implantação das Comunidades Eclesiais de Base, conforme orientação da 2ª Conferência Episcopal Latino-Americana (Celam), realizada em Medellín (Colômbia), em 1968. A Teologia da Libertação, a Igreja dos Pobres e as CEBs seriam importantes instrumentos de organização e conscientização política das camadas mais desprotegidas da população.
25 de maio de 1980 – PDT completa novo quadro partidário desenhado por Golbery
A criação do PDT completa o projeto de reforma partidária concebido pelo general Golbery do Couto e Silva, chefe do Gabinete Civil do último general presidente do regime militar, João Baptista Figueiredo. É um dos movimentos finais do projeto de “distensão gradual e segura”, rebatizado de “abertura política”.
Com a reforma, a ditadura esperava dividir a oposição para manter o controle do Congresso e da sucessão presidencial indireta em 1985. O último passo seria restabelecer eleições diretas para governador em 1982 com uma legislação eleitoral favorável ao partido oficial, o PDS.
Golbery imaginava que seriam formados quatro novos partidos: os sucessores da Arena (PDS) e do MDB (PMDB), um partido “de centro” (o PP) e uma legenda mais à esquerda, reunindo Leonel Brizola e parte dos novos sindicalistas.
A primeira surpresa na reforma foi a criação do PT. A segunda, o PDT, em consequência da manobra que tomou de Brizola a sigla PTB, que ficou nas mãos do grupo da deputada Ivete Vargas.