Quarenta e seis anos depois do Massacre da Calle Corro, onde cinco militantes dos Montoneros foram assassinados, militares que participaram da ação são levados a julgamento na Argentina. É mais um caso em que argentinos revisam os crimes do passado

<strong>Outro julgamento histórico</strong>

Em 29 de setembro de 1976, as forças repressivas da ditadura argentina (1976-1983) mataram cinco militantes montoneros, entre eles Victoria, uma das filhas do jornalista Rodolfo Walsh, ele próprio dado como desaparecido em 1977. Em dezembro de 2021, após 45 anos de impunidade, a Justiça prendeu 10 militares que participaram da operação, conhecida como chacina da Calle Corro. Agora, o Tribunal Oral Federal 7 de Comodoro Py, integrado por Fernando Canero, Enrique Méndez Signori e Germán Castelli, recebeu o caso, que deve ser julgado em 2023.

Com tanques, caminhões com bazucas, helicópteros, carros e um arsenal, cerca de 150 militares argentinos foram em busca de nove militantes da organização política guerrilheira Montoneros, na casa número 105 da Rua Corro, na Cidade de Buenos Aires. A assessoria de imprensa da organização funcionava lá, secretamente.

Os militares, policiais e bombeiros liderados por Roberto Roualdes, Ernesto el Nabo Barreiro e Héctor Vergez mataram a tiros três dos cinco montoneros naquele dia: José Coronel, Ismael Salame e Ignacio Bertrán. María Victoria “Vicki” Walsh, filha do jornalista Rodolfo Walsh, que compareceu à reunião com sua filha de pouco mais de 1 ano também estava lá. A menina foi sequestrada pelos militares. Depois, a entregaram à família de seu pai. Vicki tinha 26 anos.

O tiroteio durou cerca de uma hora e terminou com os cinco montoneros mortos. Vicki e Alberto Molina Benuzzi decidiram tirar a própria vida gritando: “Vocês não nos matam, nós escolhemos morrer”. Atiraram contra si mesmos. A dona da casa, seus dois filhos e o genro acabaram sequestrados. Eram Lucy Matilde Gómez de Mainer, Juan Cristóbal Mainer, Maricel Marta Mainer e Ramón Alcides Baravalle.

Em maio de 2017, a irmã de Victoria, Patricia Walsh, decidiu entrar com uma ação para exigir justiça. Meses depois, Lucía Coronel, filha de José Coronel e María Cristina Bustos, que desapareceu na Escola Superior da Marinha Argentina, onde Lucía foi sequestrada quando bebê, também entrou com uma ação .

Em 14 de dezembro de 2021, foram presos 10 das centenas de soldados que participaram da operação na rua Corro, 105: Ricardo Grisolía, Gustavo Montell, Hugo Eduardo Pochon, Guillermo César Viola, Domingo Giordano, Héctor Eduardo Godoy, Gustavo Juárez Matorras, Danilo González, Abel Enrique Re e Carlos Orihuela.

“Anos de luta de familiares, organizações de direitos humanos e milhares de nós, que continuamos lutando contra a impunidade, conseguiram levar a essas prisões após dezenas de depoimentos e a produção de outras provas”, disse Myriam Bregman, advogada que representa Walsh.

Os réus foram identificados com base na análise dos elementos constantes dos autos, entre eles o livro histórico do 101º Grupo de Artilharia de Defesa Aérea do Exército (GADA 101), arquivos pessoais do Exército Argentino, depoimentos de vítimas e familiares das vítimas; de ex-militares e arquivos da Comissão Nacional de Desaparecimento de Pessoas.

O juiz federal Daniel Rafecas levou a julgamento seis ex-integrantes do GADA 101 que participaram da caçada na rua Corro: Carlos Alberto Orihuela, Ricardo Grisolía, Gustavo Antonio Montell, Guillermo César Viola, Héctor Eduardo Godoy e Danilo Antonio González Ramos. Desses, Viola é o mais notório porque presidiu o Sindicato dos Promotores, que reúne militares que se opõem ao andamento dos julgamentos por crimes contra a humanidade.

Inicialmente, Rafecas havia processado dez soldados do GADA. No entanto, a Câmara deixou quatro fora do processo: Hugo Eduardo Pochón, Domingo Giordano, Gustavo Gilberto Tadeo Juárez Matorras e Abel Enrique Re. •

Com informações da Página 12 e Sputnik.