A Faculdade de Direito da USP lançava há 45 anos um manifesto em defesa da democracia, lido pelo jurista Gofredo da Silva Telles Junior nas escadarias do largo de São Francisco

 

A ditadura militar já ia para os seus 13 anos de existência, instaurada pelo Golpe de 1964, durou 21 anos, e vinha já carregando mortes, reprimindo opositores e dissidentes, de maneira covarde e assassinada. Em 1977, estava à frente da ditadura o general Ernesto Geisel.

Em 1977, ante a iminência de uma derrota eleitoral, Geisel fechou temporariamente o Congresso e editou um conjunto de regras eleitorais conhecido como Pacote de Abril. Entre as principais mudanças estavam a ampliação das bancadas do Norte e do Nordeste na Câmara dos Deputados – o que garantia maioria parlamentar à Arena – o partido da ditadura.

Além disso, a ditadura aumentou o quórum para mudar a Constituição de 50% dos parlamentares para mais de dois terços — medida que seria decisiva, em 1984, para a derrota da emenda das Diretas Já. O regime ainda inovou ao criar o ‘senador biônico’: dos três senadores de cada estado, um passava a ser escolhido diretamente pelos deputados estaduais.

Naquele ano, o regime assistia ao ressurgimento do movimento estudantil e das greves. No ABC paulista, renascia o movimento metalúrgico, liderado pelo torneiro mecânico Luiz Inácio Lula da Silva.

Foi nesse cenário que em 8 de agosto de 1977, o jurista Goffredo da Silva Telles Jr. fez a leitura histórica da Carta aos Brasileiros, tendo como cenário de fundo as Arcadas da Faculdade de Direito da USP. O texto, contrário à opressão da ditadura militar, pedia o reestabelecimento do estado de direito e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.

“Queremos dizer, sobretudo aos moços, que nós aqui estamos e aqui permanecemos, decididos, como sempre, a lutar pelos direi­tos humanos, contra a opressão de todas as ditaduras”, dizia o terceiro parágrafo do texto. Em outro trecho, o manifesto defendia que o Estado de Direito é o Estado que se submete ao princípio de que governos e governantes devem obediência à Constituição.

“Fiquemos apenas com o essencial. O que queremos é ordem. Somos contrários a qualquer tipo de subversão. Mas a ordem que queremos é a ordem do Estado de Direito. A consciência jurídica do Brasil quer uma cousa só: o Estado de Direito, já”, bradou o advogado.

“Bem simples é este princípio, mas luminoso, porque se ergue, como barreira providencial, contra o arbítrio de vetustos e renitentes absolutismos. A ele as instituições políticas das Nações somente chegaram após um longo e acidentado percurso na História da Civilização. Sem exagero, pode-se dizer que a consagração desse princípio representa uma das mais altas conquistas da cultura, na área da Política e da Ciência do Estado”, apontava a carta.

Em 1978, Geisel enviaria ao Congresso Nacional a emenda constitucional que acabava com o AI-5 e restaurava o habeas corpus. Com isso, abriu caminho para a volta da democracia. Mas o fim do regime militar só ocorreria, de fato, em 1985. •

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